São Paulo, quarta-feira, 21 de setembro de 2011

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ANÁLISE

Texto da lei faz barbeiragens e abre brechas para infratores

HÉLIO SCHWARTSMAN
ARTICULISTA DA FOLHA

Parte da explicação para os tíbios resultados da lei seca está em sua redação, que ignora os princípios elementares da boa técnica legislativa e da farmacologia.
O objetivo da MP nº 408/08, depois convertida na lei nº 11.705, era endurecer a punição para quem bebesse e dirigisse. Na prática abriu uma avenida para que os infratores escapem da sanção.
O busílis é a nova redação que a lei deu ao artigo 306 do código de trânsito, que prevê a detenção. Aqui, o legislador inadvertidamente mudou o tipo penal, que passou de conduzir veículo "sob a influência de álcool" para "com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 decigramas [6 dg/l]".
Ocorre que a jurisprudência estabelece que ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo. Assim, se o motorista se recusar a soprar o bafômetro ou a ceder sangue para análise, não há como provar que ele excedeu a quantidade máxima. Testemunhas com fé pública podem jurar que o sujeito estava bêbado como um gambá, mas não que ultrapassou os 6 dg/l. E, sem prova competente, não há crime.
Em relação à multa e suspensão da carteira, sanção administrativa prevista no artigo 165, o problema não se coloca, pois ali o tipo infracional continua sendo "dirigir sob influência". As barbeiragens não acabam aqui. Tanto o 165 como o 306 trazem a expressão "ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência".
Acontece que café e tabaco são substâncias psicoativas que geram dependência. Estão tecnicamente proibidos. Já LSD, embora cause alucinações, não provoca dependência e, assim, não cai na malha das autoridades de trânsito. A situação só não é absurda porque a polícia sabiamente ignora a lei.


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