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DANUZA LEÃO
Será?
Na vida dos outros, tudo
sempre dá certo.
Quando você pergunta como
vai a família, a resposta é "ótima", seguida de um "graças a
Deus". A casa está sempre perfeita, o trabalho maravilhoso, a viagem foi fantástica, a saúde divina
e de dinheiro ninguém fala, nunca. Ou porque é demais ou porque
é de menos, esse é um assunto em
que não se toca.
Mas às vezes dá para pensar: será que problemas só acontecem
na nossa vida? Ficou combinado
que não se deve falar deles nunca;
para ser uma pessoa bem aceita
socialmente é fundamental estar
sempre de altíssimo astral, eternamente de bom humor e agir como se a vida fosse uma eterna
canção.
Problemas? Mas que problemas? Nós brigamos com nossos filhos, nos aborrecemos com nossos
amigos, esquentamos nossas cabeças no trabalho, fazemos viagens em que tudo dá errado, passamos fome e paramos de fumar
em benefício de uma vida (futura) mais sadia. Em benefício de
uma convivência agradável -sejamos francos: para sermos mais
queridos e aceitos-, dizemos que
tudo está indo maravilhosamente
bem e quando chegamos em casa
à noite, depois de um dia de boca
trancada em relação ao que realmente está no nosso coração e no
nosso fígado, corremos o risco de
enfartar antes de entrar no elevador. E isso é vida? Pois parece que
é.
Mas lá um dia você conhece
uma pessoa legal que tem o cuidado básico de desligar o celular
quando entra no restaurante, que
ouve você com atenção, até mesmo com interesse, e você acaba falando mais do que o que se convencionou chamar de socialmente aceitável. Falando mais claro:
você se abre, o que não acontece
com frequência.
As grandes qualidades que sempre procurou num homem eram,
não exatamente nessa ordem, a
inteligência, um físico atraente,
uma certa estabilidade na vida,
charme, educação, alguma cultura, caráter, essas coisas. De preferência que não tivesse sido casado
antes, que tivesse um futuro, que
fizesse algum esporte, que soubesse falar sobre assuntos diversos,
que já tivesse viajado, que conhecesse as comidas e os vinhos, que
não se vestisse na moda, que resistisse a olhar para as maravilhosas
mulheres que passassem pela sua
frente e, claro, que fosse louco por
ela (e ela por ele).
Desse homem, para quem abriu
o coração, não sabia nada. Não
tinha a menor idéia se ele tinha
alguma das características que
para ela eram essenciais num namorado ou mesmo num amigo.
Mas foi tão bom, tão bom, que ela
não conseguiu esquecer. Afinal, o
que tinha ele de tão especial, que
o fazia diferente e melhor do que
todos?
Demorou, mas descobriu: ele
era um homem sensível. Ficou
pensando que há muito, muito
tempo, não conversava com uma
pessoa assim e que há muito,
muito tempo, nem lembrava que
existiam pessoas sensíveis.
E achou a vida curiosa: como
podem certas coisas, que já foram
tão fundamentais, como a sensibilidade, passar de moda e a gente até esquecer que elas um dia
existiram?
Será que um filme de Chaplin
ainda comove alguém?
E-mail - danuza.leao@uol.com.br
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