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INFÂNCIA
Estudo feito no Rio mostra que apenas 3,7% das crianças que atuam nas zonas sul e norte não estão matriculadas
Acesso à escola não impede trabalho na rua
ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO
Um levantamento feito pela Secretaria Municipal de Assistência
Social do Rio de Janeiro com meninos que trabalham nas ruas da
cidade desmonta a tese de que a
falta de acesso à escola é um dos
fatores que levam as crianças para
a rua. A pesquisa mostrou que
apenas 3,7% das crianças que trabalham nas ruas das zonas sul e
norte da capital fluminense estão
fora da escola.
Os dados foram tirados do cadastro de projetos que têm como
objetivo tirar crianças do trabalho
em sinais de trânsito da cidade e
desenvolver programas de geração de renda para as famílias.
Para fazer o levantamento, os
técnicos confirmaram com as escolas a matrícula de cada criança.
Foi possível, com isso, saber, escola por escola, quantas crianças
estavam realmente matriculadas.
De 380 crianças das zonas sul e
norte que trabalham nas ruas, a
secretaria confirmou que 82,6%
estão matriculadas em alguma escola. Em 13,7% dos casos, ainda
não foi possível checar se elas estudam ou não.
O levantamento mostra também que a atividade de malabarista é a mais comum (32% das
crianças), seguida da de pedinte
(8%) e da de vendedor (8%).
A secretaria fez o cadastro também de 121 crianças que trabalham no centro do Rio. Não há
dados de freqüência escolar, mas
o levantamento mostra que apenas nove (7,4% do total) delas são
analfabetas ou sem escolaridade.
Número reduzido
Por se tratar de uma população
extremamente diversificada (há
crianças que dormem nas ruas e
outras que raramente aparecem
nos sinais), a secretaria não possui um levantamento do total de
meninos que trabalham nas ruas
da cidade. O secretário Marcelo
Garcia diz, no entanto, que o número é bem menor do que o que
se especulava na década de 80,
quando algumas entidades chegaram a falar em milhões de
crianças nas ruas no Brasil.
"Se isso fosse verdade, era melhor ter fechado o país. No Rio de
Janeiro, nunca passamos de 1.000
crianças na rua. Hoje, conseguimos universalizar a educação a tal
ponto que quase todas têm alguma referência na escola. Elas vão
para as ruas em busca de renda. O
desafio agora é universalizar a assistência social para que não tenham que ir para a rua em busca
de dinheiro", afirma o secretário
de Assistência Social da Prefeitura
do Rio.
Para o psicólogo Cláudio de Oliveira, conselheiro do Conselho
Tutelar de Vila Isabel (órgão que
atua na defesa dos direitos de
crianças e adolescentes em nove
bairros da zona norte do Rio), a
busca das crianças por renda nas
ruas tem motivos variados: "Há
desde casos de exploração infantil
até garotos que estão nas ruas
porque querem ter dinheiro para
comprar um tênis de marca que
eles viram na TV".
O fato de a maioria dessas crianças estar na escola mostra que a
estratégia de intervenção do poder público tem que ser muito
mais eficiente e complexa para
atacar o problema. Não basta só
dar abrigo (a maioria mora com
os pais), comida (há merenda nas
escolas) ou uma atenção qualquer
de um adulto (que elas já recebem
no colégio).
Para Antônio de Souza, coordenador da organização não-governamental (ONG) ExCola -que
desde 1989 trabalha com meninos
de rua-, o principal desafio para
o poder público é integrar as
ações de diferentes secretarias:
"Há pouca integração das secretarias de saúde, de assistência social
e de educação".
As secretarias de Educação e de
Assistência Social da prefeitura
têm tentado trocar informações
sobre esses meninos. Na zona sul,
por exemplo, as coordenadorias
das duas pastas responsáveis pela
região estão cruzando os dados de
reprovação por freqüência nas escolas, num trabalho conjunto que
deve ser estendido também para a
zona norte.
As coordenadorias, em um trabalho com o Ministério Público,
já chamaram cerca 100 pais de
alunos para cobrar explicações e
propor soluções. Eles assinaram
um termo de responsabilidade
que informa que, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente,
é dever dos pais mantê-los na escola. O estatuto prevê punições
como multa, advertência, perda
da guarda e, em casos extremos,
suspensão do pátrio poder.
Falta de diálogo
A intenção de integrar as ações,
no entanto, esbarra às vezes na
falta de diálogo entre a direção da
escola e os assistentes sociais.
Na Escola Municipal Lúcia Miguel Pereira, em São Conrado (zona sul do Rio), a diretora, Regina
Izidro, afirma que, lá, não há integração entre o trabalho das secretarias. A escola atende, em sua
maioria, crianças da Rocinha e,
segundo a direção, há três casos
de meninos que trabalham nas
ruas que estão sendo atendidos
pela Secretaria Municipal de Assistência Social.
"Essa interação, infelizmente,
não existe. Nós sabemos que os
meninos estão sendo atendidos
pela assistente social, mas não sabemos o resultado desse atendimento. Temos uma equipe pequena aqui e não adianta procurar atendimento em outras secretarias porque o encaminhamento
é muito difícil", diz Izidro.
A assessora-adjunta da 2ª Coordenadoria Regional de Ensino do
Rio, responsável por bairros das
zonas sul e norte, Valéria Boselli,
admite que há dificuldades para
integrar diferentes redes de atendimento à criança, mas diz que as
secretarias têm buscado soluções
para esse problema.
"A gente sabe que essa integração não é feita de um dia para o
outro, mas, na zona sul, já fizemos
um trabalho bem-sucedido com
alunos faltosos que será expandido para a zona norte", diz Boselli.
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