São Paulo, domingo, 25 de setembro de 2011

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'Multas não representam nem um quinto dos motoristas alcoolizados'

Para responsáveis por blitze da Lei Seca há muita chance de quem dirige bêbado não ser pego

Iniciativas como Twitter que informa usuários o local da fiscalização são desserviço, afirmam; blitze devem aumentar

MORRIS KACHANI

DE SÃO PAULO

As blitze da Lei Seca em São Paulo estão cada vez mais intensas. Nas noites de pico, de quinta a sábado, um efetivo de 300 policiais militares distribuídos em 17 equipes ocupa as principais vias de acesso aos bairros da balada na cidade, em operações que só neste ano deverão levar ao bafômetro 200 mil motoristas (até agora, foram cerca de 3,7 mil autuações).
Mas, no contexto de uma frota de 7 milhões, e uma população de 10, qual é o raio de alcance destas operações?
Em outras palavras, em que medida a fiscalização que existe hoje consegue dar conta do número de pessoas que dirigem alcoolizadas?
Para o capitão Paulo Oliveira, 42, chefe do setor operacional do Comando de Policiamento de Trânsito da capital, "com certeza o número de autuações não representa nem um quinto do que tem de motoristas alcoolizados dirigindo por aí".
Em um momento crítico em que a cada semana há praticamente um novo acidente com morte nas madrugadas em circunstâncias parecidas, Oliveira e o sargento Luiz Carlos Queiroz, que lidera uma das 17 equipes de fiscalização, receberam a Folha para expor sua visão sob a perspectiva da polícia.
As dificuldades não são poucas: há um Twitter com 28 mil seguidores utilizado por muitos para driblar a fiscalização; o número de mulheres que dirigem alcoolizadas tem crescido a cada ano. A conclusão é de que só a fiscalização é insuficiente.
Veja os principais trechos da entrevista.

 

Folha - Em que medida a polícia está conseguindo dar conta da fiscalização?
Paulo Oliveira -
Temos um contingente razoável fiscalizando. Mas todo dia infelizmente você encontra pessoas dirigindo alcoolizadas. Muitas a 100, 120 km por hora. Não tem como você colocar um policial dentro de cada veículo que transita na cidade. Com uma população de praticamente 10 milhões, você teria que colocar 5 milhões de policiais.

Qual a chance do motorista bêbado não ser pego?
Oliveira - Tem muita chance de a pessoa não ser pega. Depende muito da localidade onde se encontra. Mas a tendência é aumentarmos a fiscalização ainda mais. Só no ano passado foram 4.000 autuações.

Não é pouco?
Oliveira -
Em 2008, quando a lei foi implementada, 17% das pessoas que eram submetidas ao bafômetro estavam sob influência do álcool. Hoje, essa média caiu para 2,5 a 2,7%. Isso significa que pelas estatísticas, há menos motoristas alcoolizados.
Luiz Carlos Queiroz - O que a gente observa é a maior utilização do táxi.

E o Twitter da lei seca?
Oliveira - Atrapalha muito. É um desserviço, infelizmente. Eles lançam no Twitter onde estamos. Agora, não é todo mundo que tem internet no celular. É um pessoal de um nível social um pouquinho mais elevado. De qualquer forma nós também somos seguidores, e quando somos descobertos muitas vezes ainda ficamos porque não é todo mundo que acompanha o Twitter. Esse é um tipo de problema mais comum na região de Moema, Vila Olímpia e Vila Madalena.

Qual o perfil do infrator?
Queiroz - São mais os jovens que caem na balada. Eles bebem hoje muito mais que antigamente. A faixa etária vai de 20 a 35 anos. E de cada 10 autuados, 6 são homens e 4 mulheres. O número de mulheres tem aumentado bastante. Mas são os homens os que menos aceitam fazer o teste do bafômetro.

Quais são os infratores mais difíceis de lidar?
Queiroz - Classe média alta. São os que costumam, por orientação do advogado, não fazer o teste do bafômetro. As operações mais difíceis são onde há maior concentração de pessoas de classe média.
Oliveira - Há uma cultura dos que pensam que o dinheiro resolve tudo. De que com um carro caro e uma condição social excelente, nunca a lei vai alcançá-los.

Os carros mais autuados são os mais caros?
Queiroz - Sim. Pela proporção, condutores de modelos como Captiva (da Chevrolet), IX 35 (da Hyundai).

E drogas?
Queiroz - Nunca é só entorpecente. O cara mistura entorpecente e bebida. Mas são poucos casos. O que mais aparece principalmente é cerveja, ela é a campeã.

Acham as leis brandas?
Oliveira - A lei é razoavelmente severa. Mas será que a gente precisa penalizar ainda mais para as pessoas entenderem? É que o brasileiro é meio fanfarrão. O cara bate, mata e ainda sai ileso.
Queiroz - Todos mentem. Apenas a minoria da minoria assume o erro. Mas tenho certeza de que aqueles que foram autuados jamais farão novamente. É um problema de educação sério. O brasileiro só obedece quando as coisas acontecem com ele.
Oliveira - Aqui é o país do jeitinho... A educação no trânsito deveria ser lecionada desde o colégio. Pelo menos para alunos do colegial, mas nem isso ocorre. A pessoa só entra em contato com a legislação do trânsito quando tirar carta.
Queiroz - Acidentes fatais deveriam ser de responsabilidade dolosa, porque o cara tirou uma vida.

Colaborou GIBA BERGAMIN JR.


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