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DANUZA LEÃO
Será o mundo gay conservador?
O mundo tem passado por
grandes transformações. As
mulheres adquiriram uma liberdade hoje aceita e respeitada por
todos -quase todos- e a queima dos sutiãs foi apenas o primeiro passo. Mas foi na cabeça delas
-de muitas, pelo menos- que
aconteceu a transformação
maior. Já existem as que têm a coragem de não querer casar nem
morar junto, nem ter filhos -ou
tê-los sem jamais revelar quem é
o pai; e, quando o amor é grande,
podem optar por morar na mesma casa, em casas separadas,
mas, em número cada vez maior,
sem morar junto nem casar.
O mundo gay obteve muitas
conquistas: se organizou, já existe
o dia oficial do Orgulho Gay, com
passeatas nas grandes cidades do
mundo, e muitos tiveram a coragem pessoal e maior: sair do armário. Para os que não conhecem
a expressão, sair do armário significa assumir sua opção sexual
diante dos amigos, da família e
do mundo -palmas para eles.
Até o presidente Fernando Henrique Cardoso outro dia empunhou
a bandeira do arco-íris, simbolizando sua simpatia pela causa de
legalizar a união civil entre gays
-e até hoje ninguém duvidou da
masculinidade de FHC.
Tudo bem, tudo maravilhoso,
mas só para a gente poder entender: no momento em que os sexos
mais tradicionais dispensam o tal
papel, por que razão os homossexuais dão tanto valor a ele?
Problemas de herança? Não.
Qualquer pessoa pode fazer um
testamento deixando seus bens
-se tiver filhos, 50% deles- para quem quiser: seu animal de estimação, uma instituição de caridade, seu companheiro/companheira.
Para que um dos parceiros se
vista de noiva? Não. Nos países
onde são permitidos os casamentos entre homossexuais, nunca
um dos cônjuges foi fotografado
vestido de noiva -eu, pelo menos, nunca vi. Continua a dúvida:
por quê?
Para que os filhos levem o sobrenome do pai? Bem, presume-se que dessa união não nasçam filhos -mas nunca se sabe-, e a
lei admite que uma criança, mesmo nascida de um pai casado
com outra possa dar seu sobrenome -e dividir a herança- entre
os filhos, desde que provada a paternidade, o que hoje não é difícil.
Para que, no caso de morte de um
dos parceiros, o outro possa receber a pensão? Bem, presume-se
que os dois trabalhem e que tenham direito à sua própria aposentadoria, quando chegar a hora. O mundo gay foi altamente
responsável -no melhor sentido- pela quebra de preconceitos
e tabus, dando uma lição ao
mundo, que hoje em dia aceita
que cada um faça sua opção sexual livremente e seja respeitado
até pelas mais altas autoridades
(com algumas exceções, como o
presidente Bush, o candidato Garotinho e provavelmente Luiz Felipe Scolari, o Felipão).
Nada contra a união civil entre
pessoas do mesmo sexo; apenas
curiosidade sobre a importância
do casamento para eles.
Não existe nada menos careta
do que o mundo gay; afinal, foi
esse mundo que mais se arriscou e
quebrou resistências para ser
aceito, alguns com grande sofrimento, mas com enorme coragem
e muito sucesso. Lutar para ter
um direito que está sendo deixado de lado pelos outros sexos, em
todos os países do mundo, para
quê? Dá para suspeitar que,
quando o amor chega, todos temos um coração suburbano que,
lá no fundo, deseja um casamento de papel passado, igualzinho às
famílias conservadoras, burguesas e preconceituosas. E o mundo
gay, que tanto lutou contra o conservadorismo, a burguesia e o
preconceito, também, também
quer uma cerimônia com a presença da família e dos amigos,
com direito a festa com champanhe, bolo e várias bandejas de
bem-casados.
A vida é complicada.
E-mail -
danuza.leao@uol.com.br
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