|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
WALTER CENEVIVA
Liberdades confrontadas
Proibir ou limitar entrevistas de candidatos sob alegação de propaganda eleitoral distorce o espírito e a finalidade da lei
|
A FOLHA E OUTROS órgãos de
comunicação foram punidos
pela Justiça Eleitoral sob a
alegação de propaganda política de
entrevistados fora do tempo que a
lei permite. Tais restrições partiram
de uma inversão da boa interpretação do direito, o que pretendo demonstrar a partir de dois princípios.
O primeiro se liga à constitucionalidade da norma discutida, como suporte das conclusões quanto à sua
eficácia. O intérprete da lei busca,
em segundo lugar, o objetivo visado
e a função social a que se destina.
Importa mais que o sentido literal
da lei. Foi o que fez o TSE (Tribunal
Superior Eleitoral), corrigindo a restrição de instâncias inferiores.
A finalidade social para aplicação
dos princípios legais se liga ao bem
geral visado por eles. Os bons autores dizem que, havendo conflito entre dois princípios, predomina aquele cujo peso seja relativamente
maior. O de menor peso não se perde, mas não supera o primeiro. Na
discussão da multa aplicada pela
Justiça Eleitoral, os princípios discutidos são dois, ambos previstos no
artigo 5º da Constituição: o da igualdade de oportunidades para todos
(inclusive partidos políticos e candidatos) e o da liberdade de manifestação do pensamento e de informação,
livre de qualquer forma de censura,
reforçado pelo artigo 220. Esse é o
princípio maior quando se cuida da
liberdade de informação.
Não há maior ofensa ao direito escrito que a violação constitucional.
A sentença criticada questionou o
fato de ser entrevistada a ex-prefeita
Marta Suplicy, afastada igual oportunidade a outros políticos.
Se a entrevista publicada fosse infração da lei, quem poderia reclamar? A resposta parece óbvia: apenas outro partido interessado no
mesmo pleito teria motivo para reclamar. Não o Ministério Público. O
leitor pode objetar que o Ministério
Público se dirigiu ao Judiciário na
função de fiscal da lei. A primeira legitimidade, porém, é a de algum partido que se tenha considerado prejudicado. Se não fosse assim, o Ministério Público teria de adotar a mesma linha nos mais de 5.000 municípios brasileiros, com cada entrevista
divulgada, mesmo em jornais de fora do município.
Vista a questão sob outro ângulo,
os fins sociais da lei não podem impor a exclusão de qualquer manifestação dos candidatos ou pré-candidatos, uma vez assegurada a igualdade de tratamento a todos. Pela própria natureza das coisas, é inviável
divulgar as entrevistas de todos os
candidatos ao mesmo tempo nos
meios impressos. A sanção aplicada
a este jornal incidiu em erro porque
não aguardou uma pluralidade de
casos que lhe permitisse reconhecer
tratamento discriminatório de partido ou partidos não ouvidos.
A pena imposta também interpretou mal o artigo 220 da Carta Magna, ligado à plena garantia da manifestação do pensamento. Ora, o processo eleitoral, em qualquer tempo,
é composto pelas opiniões de seus
integrantes, a respeito dos problemas existentes e propostas de suas
soluções. Proibi-las ou limitá-las sob
a improcedente alegação de que entrevistas constituem propaganda
eleitoral distorce o espírito e a finalidade da lei. A sentença, nesse passo,
se fosse levada ao pé da letra terminaria impedindo o enunciado de
qualquer idéia de qualquer político,
o que só se viu durante a ditadura.
Andou bem o TSE.
Texto Anterior: Aulas: Reposição pode ocorrer nas férias ou aos sábados Próximo Texto: Livros jurídicos Índice
|