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Reformas mudam arquitetura das fachadas de Brasília
Materiais usados na construção das quadras residenciais estão sendo substituídos, sob protestos de especialistas
Azulejos, pastilhas e concreto vêm sendo trocados por mármore, granito, vidros coloridos e ornamentos em gesso
JOHANNA NUBLAT
SIMONE IGLESIAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Mármore, granito, vidros coloridos espelhados e ornamentos em gesso vêm gradualmente tomando conta da paisagem
das quadras residenciais do
Plano Piloto de Brasília, ocupando o lugar de azulejos de
Athos Bulcão, pastilhas de cores e formatos discretos, cobogós e do concreto, material símbolo do modernismo de Oscar
Niemeyer e Lúcio Costa.
Basta caminhar pelas quadras, especialmente na Asa Sul
-área no perímetro tombado,
onde moram as classes média e
média alta-, para perceber que
Brasília vive uma onda de reação à estética modernista e funcional que a tornou patrimônio
cultural da humanidade.
O revisionismo da arquitetura desagrada especialistas e o
Iphan (Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional),
mas como o tombamento não
proíbe a troca de materiais nas
fachadas, o avanço do gesso e
das janelas espelhadas dificilmente será contido.
"A descaracterização dos edifícios é terrível, mas só podemos lamentar. Essas mudanças
são mistura de duas coisas: desconhecimento e mau gosto",
disse o superintendente do
Iphan do DF, Alfredo Gastal.
Segundo ele, o instituto não
pode fazer censura estética,
pois o tombamento dos prédios
residenciais é volumétrico,
mantendo altura e largura -os
prédios residenciais brasilienses são todos caixotes retangulares com até seis andares.
"A revitalização das fachadas
virou uma zorra. Esperava-se
que as pessoas respeitassem a
boa arquitetura, mas a realidade mostra que vem preponderando o gosto duvidoso, que
mistura mármore com granito
e gesso ornamental, materiais
que dão falsa demonstração de
riqueza numa alusão aos prédios da Barra da Tijuca, no Rio
de Janeiro", afirmou Gastal.
Mesma opinião tem o arquiteto Carlos Magalhães, ex-genro e amigo de Niemeyer. Ele
disse que desistiu de participar
de reuniões de condomínio.
"Não vou mais porque me aborreço. Se querem colocar sanca
de gesso, o que se pode fazer?
Eu era sempre voto vencido e
quase enfartei discutindo conceitos com vizinhos."
O professor da Universidade
de Brasília Antônio Carlos Carpintero, que dá aula sobre a arquitetura da capital, disse que o
Iphan poderia ser mais rigoroso e impedir excessos.
"A estética modernista está
virando kitsch e isso, a longo
prazo, é fator de desvalorização. Está se trocando uma grife
Oscar Niemeyer por uma grife
Zé Pedro qualquer."
Algumas mudanças vão além
da estética. Por falta de fiscalização, pilotis (colunas que sustentam os prédios e mantêm os
onipresentes vãos livres no térreo) foram gradeados e transformados em estacionamento.
De acordo com o Iphan, que
intensificou a fiscalização nos
últimos meses, os pilotis são
públicos, o que impede a colocação de grades.
Defensor da manutenção de
prédios marcantes da cidade,
como os da quadra 308 Sul, o
arquiteto Hélio Albuquerque
diz concordar com reformas radicais em prédios sem "importância arquitetônica", como ele
classifica o que mora, na 211 Sul
-as "asas" do Plano Piloto são
divididas em quadras.
Antes da mudança, os blocos
B e C da quadra tinham esquadrias e pilotis simples. Hoje,
são revestidos de granito e as
colunas ganharam capitéis (ornamentos superiores) de gesso.
"Se não tivessem protelado
tanto as obras na cidade, não
teríamos reformas tão evidentes." A modificação no prédio
foi, de acordo com Albuquerque, emergencial.
Ele justificou que a escolha
pelos capitéis foi opção barata
de esconder rachaduras. O granito, diz, dura mais que a pintura e evita mudanças periódicas
na cor da tinta.
Ainda em fase de projeto, um
edifício da 112 Sul pretende retirar os cobogós da área de serviço. Estrutura comum na cidade, são blocos vazados feito em
cimento que permitem passagem de luz e ar -e poeira, causa
de reclamações de moradores.
A última obra de Niemeyer
construída em Brasília, a biblioteca do Conjunto Cultural
da República, tem uma das fachadas inteira em cobogós.
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