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COMPORTAMENTO
Clientes pagam R$ 7 milhões por 500 m2; maquetes têm controle remoto e podem custar até R$ 20 mil
Imóveis de luxo têm mais procura que oferta em SP
PAULO SAMPAIO
DA REVISTA
Seja bem-vindo ao Brasil sem
crise. Aqui não cabe muita gente,
mas sobra espaço. Nos lançamentos imobiliários de alto padrão de
São Paulo, um apartamento de
500 m2 pode custar R$ 7 milhões e,
ainda assim, seu comprador não
se aperta: prefere pagar à vista.
Nesses empreendimentos, até o
elevador tem pé-direito alto
-para facilitar o transporte de
estátuas e pianos. Melhor chamar
o padrão de "mega".
No lançamento mais comentado do mercado nas últimas semanas, o edifício Parque Alfredo
Volpi -com oito apartamentos
de R$ 10 milhões cada, no bosque
do Morumbi-, o quarto de vestir
da senhora mede 30 m2, o equivalente a uma quitinete grande.
Segundo Carla Fernandes, executiva de marketing da Cyrela,
construtora que assina o empreendimento, seus principais
atrativos são a localização e a
planta de 800 m2. "O prazo máximo de financiamento é 36 meses,
mas isso não faz diferença para o
nosso público", afirma.
Apesar das cifras, quem trabalha no setor diz que há escassez de
imóveis de luxo em relação à demanda. Nos últimos cinco anos,
foram lançados 132.263 apartamentos na cidade de São Paulo,
a um preço médio de R$ 173.301
cada. Apenas 201 deles -ou
0,15% do total- custaram mais
de R$ 3 milhões.
Esses megacompradores residem na melhor vizinhança da cidade, mas morrem de medo de
dar uma volta a pé no quarteirão:
são industriais, banqueiros, pecuaristas, incorporadores, profissionais liberais e emergentes do
mercado financeiro, da internet e
apresentadores de TV.
É comum um grupo de amigos
comprar o prédio todo e depois
revender o que sobra para vizinhos convenientes. Pagodeiros,
jogadores de futebol e artistas
muito exibidos, que ponham em
risco a segurança, são evitados.
Luiz Henrique Taboada, superintendente da construtora Cipesa, especializada em alto padrão,
lançou há um ano e já vendeu um
prédio de 21 apartamentos, cobrando R$ 4.000 o m2. De março
pra cá, vendeu outro, de 11 apartamentos, a R$ 10 mil o m2.
No mega-padrão as escalas são
proporcionais ao negócio. A maquete tem dimensões amazônicas, o corretor transporta clientes
em um jipe blindado e o folder do
lançamento, de tiragem limitadíssima, pode custar R$ 200 mil. O
comprador chega a pagar 4% do
valor geral do empreendimento
só com o marketing que o atrai.
Batom, rímel e escova
De saída, quando só há o terreno, os esforços dos corretores se
concentram na embalagem de algo que não existe. "O comprador
tem de imaginar o prédio, com ele
morando, a partir de um pedaço
de terra. Nossa função é "vestir",
colocar o batom, o rímel, pentear,
administrar o sonho", diz Arnaldo Frattini, 40, diretor de atendimento da agência Eugênio DDB,
especializada em imóveis.
No folder, há elementos como
um casal gargalhando em traje
black tie e ambientes com nomes
tipo "chapelaria" e "gazebo".
O folder é enviado à casa do
cliente em uma embalagem de luxo. "O orçamento desse catálogo
é igual ao de um livro de arte. A
gente tem que encontrar uma brecha no coração desse comprador
e tocar a emoção dele, já que dinheiro não é problema", diz o diretor de planejamento da agência
Town Blue, Felipe Pedrosa, responsável pelo lançamento do edifício Quartzo, no Itaim, de apartamentos de R$ 4 milhões.
Na pior das hipóteses, o folder é
entregue no local do empreendimento. "O estande deve ser maravilhoso, tipo butique mesmo,
com garçons servindo champanhe e uma maquete impactante."
Especialista em "maquetes impactantes", Adhemir Fogassa, 49,
monta uma média de 30 por mês
e chega a ficar 500 horas em apenas uma. No galpão de 2.000 m2
onde trabalha com 96 funcionários, no Jardim Bonfiglioli, Fogassa explica que algumas maquetes
têm até controle remoto. O cliente
só não entra e se senta no sofá por
uma questão de escala. A maquete pode custar até R$ 20 mil.
Consultor imobiliário
O corretor não pode ser um
simples vendedor de apartamentos. Ele precisa conhecer os hábitos do comprador rico, os lugares
que ele freqüenta, o que ama.
"O profissional que atende esse
cliente é um consultor imobiliário", explica Tomás Salles, diretor
de novos negócios da Lopes.
O "consultor imobiliário" faz o
possível para acompanhar o comprador. Hélio Steinberg, 40, e Roberto Lopes, 44, sócios-autônomos, pilotam um Mitsubishi Pajero blindado. "O atendimento tem
que ser de igual para igual", diz
Lopes, que mora em um apartamento de R$ 800 mil.
Ele e Steinberg são encarregados das vendas no edifício George
Sand, na rua Frederic Chopin, no
Jardim Europa (zona oeste), cujas
unidades custam até R$ 17 milhões: o corretor no alto padrão
leva de 1% a 2,4% de comissão.
"O cliente gosta de negociar da
maneira mais discreta possível",
explica Marcos Manhães, 44, que
freqüenta o Fasano, circula em
um Volvo e atua na imobiliária
Coelho da Fonseca, onde faz parte
de um seleto grupo de 30 profissionais batizados de "private brokers" ("corretores exclusivos").
Esse é também o nome da revista que a imobiliária lançou em
parceria com a Daslu. Distribuída
para o mailing de 38 mil nomes da
butique, a revista tem editorial assinado pela empresária Eliana
Tranchesi e classificados de imóveis que custam até R$ 12 milhões.
A Coelho da Fonseca montou
ainda um quiosque na butique.
Não há corretores no local, que é
monitorado por uma câmera -o
"private broker" só surge quando
a dasluzete mostra interesse.
Bunker estilo "neo-pós"
O arquiteto Itamar Berezin, 42,
autor do projeto do Parque Alfredo Volpi -que custou R$ 250
mil-, é conhecido por desenhar
prédios em estilo "neo-pós", o
mais associado com o megapadrão atualmente na cidade.
O prédio desse estilo tem pinta
de castelo vertical estilizado, com
telhadinho francês, janelões que
se abrem como portas, varandas
amplas e gradeadas e pé-direito
alto. A idéia é que a pessoa se sinta
na Europa -só que, por causa da
violência, há um quê de bunker.
Em visita com corretores a um
prédio na praça Pereira Coutinho,
em Vila Nova Conceição, a reportagem experimentou na portaria
um sistema parecido com o de
eclusas fluviais: da calçada até o
acesso ao hall social, passou por
duas pesadas portas de ferro -a
segunda só foi aberta quando a
primeira se fechou.
O acabamento é "mega" também. Em um dos empreendimentos, os canos do prédio são revestidos com uma manta anti-ruído,
que garante que o morador jamais ouça a descarga do vizinho.
"Perseguida"
Cliente dos sonhos do "private
broker", a socialite-pecuarista
Helena Mottin vive em um apartamento de 600 m2 que, segundo
ela, vale US$ 2 milhões. Apresentada ao empreendimento há cinco anos, pelo amigo-incorporador Paulo Kauffmann, conta que
foi "perseguida" até capitular.
"Como mostrei interesse, passei
a ver o corretor em todos os lugares a que eu ia. Um dia, estava andando na praia da Baleia e o cara
apareceu. Eu disse: "Até aqui?"
Tempos depois, assinei a compra
para ele parar de me encher a paciência", diverte-se.
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