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GILBERTO DIMENSTEIN
Você votaria em FHC?
Pesquisa de opinião pública
ainda inédita, concluída na
semana passada, lançou a seguinte questão aos entrevistados: você
estaria disposto a dar um terceiro
mandato ao presidente Fernando
Henrique Cardoso?
Resposta encontrada pelo Instituto Vox Populi: 25% disseram
que sim. Pode-se ler que 75%, a
imensa maioria, já estão cansados do presidente, o que revelaria
inequívoco desgaste. O recado das
ruas seria, assim, claro: "Vá para
casa, FHC".
Há, entretanto, mais uma leitura. Segundo 25% dos eleitores, ele
se apresenta melhor do que seu
candidato, José Serra, que, segundo a pesquisa do Vox Populi, conseguiu até agora 21 pontos. Fernando Henrique Cardoso estaria
quase no segundo turno, com
chances razoáveis de vencer, especialmente porque, neste clima de
instabilidade, uma parcela expressiva dos eleitores tende a ver
no continuísmo um mal menor.
Se, por acaso, quando você estiver lendo esta coluna, já estivermos com a taça da Copa do Mundo nas mãos, a alegria nacional
tenderá a virar, mesmo que minimamente, satisfação com o país.
Mais um fator favorável, goste-se
ou não, ao presidente.
Mesmo que não faça o sucessor,
ele sairá do Palácio do Planalto,
pelo menos até agora, com a taça
do campeonato político na mão.
Impossível deixar de reconhecer
como situação invejável a obtenção de 25% de aprovação após oito anos na Presidência, num momento em que os indicadores de
emprego e de renda estão particularmente sofríveis, como se viu na
semana passada, e em que o país
vive ambiente de instabilidade
econômica, com recordes da taxa
do dólar e do risco-país. E, ainda
por cima, com indício de ocorrência de abuso de poder praticado
pela Polícia Federal, que estaria
bisbilhotando a vida de adversários políticos, algo péssimo sobretudo para alguém que, no passado, foi vítima de arbitrariedades.
A taça do presidente é a bomba
social deixada para seu sucessor,
seja lá quem for, Lula, Serra, Garotinho ou Ciro Gomes.
Nas pesquisas qualitativas,
aquelas em que se investiga mais
profundamente a opinião do eleitor, aparece com nitidez o salvo-conduto. Não se associa desenvolvimento ao governo, até porque os
índices de crescimento são, na melhor das hipóteses, pálidos. Nem é
sua marca a ação social, apesar
dos inegáveis avanços nos campos
da educação e da saúde, que,
comparados com os indicadores
do passado, até que são acima do
razoável, mas tímidos ante o tamanho da miséria brasileira.
As pessoas reconhecem erros,
fragilidades, bobagens, mas, no final, rendem-se à marca registrada de FHC: o controle da inflação.
É uma identificação rápida e palpável de algo positivo; aí está o
salvo-conduto, que o faz sair do
Palácio do Planalto com a taça.
Espertamente, ele tenta montar
a agenda do seu sucessor, ao dizer
que, assim como no passado acabar com a inflação era a mais urgente questão nacional, a violência passa a ser, agora, o grande
desafio a ser enfrentado.
Há uma boa chance de Fernando Henrique Cardoso estar certo:
a violência, afinal, é a resultante
das carências sociais, quase um
termômetro, revelador de uma
teia com as linhas do desemprego,
da baixa escolaridade, da precariedade das moradias, da falta de
lazer, da ineficiência da polícia. A
elite não vê a mortalidade infantil
nem as escolas ou hospitais públicos, nunca entra nas favelas nem
nos cortiços, mas sente o peso da
violência urbana. A percepção de
melhoria de vida é, em parte, a
percepção da segurança.
Para avaliar a complexidade do
assunto, técnicos sugerem que a
região metropolitana de São Paulo se transforme em um Estado; só
assim haveria articulação e força
política para enfrentar os desafios. A violência é um sinal inequívoco de ingovernabilidade.
O eleito pode até comemorar nos
primeiros dias, mas a verdade é
que terá de substituir um presidente com uma imagem acima do
razoável e que terá deixado uma
dívida nada razoável. Quem suceder a ele terá, portanto, de apresentar uma bandeira bem-sucedida, que só poderá ser a melhoria
dos indicadores sociais. O sucessor
herdará uma margem precária
para investimentos; a diferença é
que não terá, nos primeiros anos,
nenhum salvo-conduto.
Engana-se quem imagina ser esse o melhor dos mundos para
FHC. Há nele um risco embutido:
o de o sucessor usá-lo como bode
expiatório, responsabilizando-o
pela crise. Ele poderá até segurar
a taça, mas ela vai tremer em suas
mãos.
PS - Da primeira vez que ouvi a
idéia de transformar a região metropolitana de São Paulo em Estado, com governo e bancada federal, considerei-a estranha, quase
tresloucada. Mas a idéia faz sentido. A Grande São Paulo tem problemas tão complexos e tão graves, que alteram tanto a vida de
tanta gente e vendem a imagem
de um país caótico, que até mereceria ter seu próprio governador,
identificado até o fundo da alma
com a temática metropolitana.
Definitivamente, é um absurdo
deixar o centro financeiro, econômico e intelectual do país na condição de vítima de tamanha vulnerabilidade.
E-mail -
gdimen@uol.com.br
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