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DÍVIDA PÚBLICA
BB, Bradesco, Itaú, Unibanco, ABN Amro e Banespa detêm 47% dos títulos do governo em poder dos bancos
Seis bancos dominam negócio da dívida
SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL
Os seis maiores bancos brasileiros têm em tesouraria R$ 132,7 bilhões em títulos públicos. Banco
do Brasil, Bradesco, Itaú, Unibanco, ABN Amro e Banespa mantêm em seus cofres 47% do total
de títulos do governo que os bancos mantêm em suas carteiras.
Esse papelório, que financia o
caixa do governo pela taxa de juro
real mais alta do planeta, rendeu
àqueles bancos R$ 27,3 bilhões de
janeiro a setembro, segundo dados colhidos pela ABM Consulting nos balanços do terceiro trimestre do ano.
Os ganhos com os juros pagos
pelo governo no período, mostra
o estudo preparado para a Folha,
corresponderam a quatro vezes o
lucro líquido dos seis bancos. Esses valores dão uma idéia da dependência dessas instituições em
relação ao papel que vêm desempenhando na economia nos últimos anos: o de financiadoras número 1 do déficit público.
Se deslocada para o conjunto do
sistema bancário, a lupa dos analistas da ABM mostra a intimidade da relação entre setor público e
setor financeiro: 39% dos R$ 720
bilhões em títulos federais no
mercado em setembro estavam
nas tesourarias dos bancos.
Outros 33% lastreiam os fundos
de investimentos onde a classe
média aplica suas economias. Como quem administra esses produtos são os bancos, cobrando taxas médias de 2% ao ano sobre o
patrimônio aplicado, essa parcela
da dívida pública também rende
ganhos ao sistema bancário.
Romper com essa delicada relação entre credor (bancos) e devedor (o Tesouro Nacional), é um
dos grandes desafios do novo governo. Economistas, executivos
financeiros e analistas de bancos
ouvidos pela Folha afirmam que
essa anomalia tem de cessar.
De agentes financiadores do governo, os bancos deverão tornar-se financiadores do desenvolvimento para que o país possa crescer, dizem. "Não tenho dúvida de
que os bancos estão preparados
para financiar a produção e a retomada do crescimento", diz o
presidente da Febraban (Federação Brasileira dos Bancos), Gabriel Jorge Ferreira.
Poda no juro
Alberto Borges Matias, sócio-diretor da ABM Consulting, diz que
o novo governo terá de começar a
reduzir a taxa básica de juros, a
Selic, já no próximo ano, trazendo-a de volta para o patamar em
que estava antes das últimas altas.
"Do contrário, a dívida entra em
colapso e o país não cresce", diz.
Em setembro a Selic estava em
18% ao ano e, após os últimos aumentos determinados pelo Copom (Comitê de Política Monetária), do Banco Central, chegou a
22%. No mercado já se especula a
possibilidade de nova alta, de um
a dois pontos percentuais na próxima reunião do Copom, em dezembro.
Segundo Borges Matias, "dá para recuar a taxa básica no primeiro ano de governo de Luiz Inácio
Lula da Silva, mesmo no quadro
atual de inflação elevada". "O juro real deveria
ir para 6% a 7% ao ano, está o dobro disso", diz. Com o IPCA acumulado em 7%, no ano, e o juro
em 22% a taxa real é hoje de 15%.
Nos países emergentes, a taxa média de juro real é 1,20% ao ano.
O sócio da KPMG, Marcelo Bessan, responsável pela área de bancos da auditoria, diz que a queda
da taxa básica de juros reduziria a
rentabilidade dos bancos, mas
não arranharia a estabilidade do
sistema. "Desde que isso ocorra
em um cenário de crescimento
econômico e superação do atual
"soluço" inflacionário", diz Bessan.
Os bancos, diz ele, tiveram uma
rentabilidade alta nos últimos
anos e podem reduzir seus ganhos em 20% ao ano, sem maiores problemas. "Os banqueiros
percebem que o atual modelo -
de ficar ganhando em cima do financiamento da dívida pública-
não se sustenta mais", diz Bessan.
Segundo o consultor, os grandes bancos se prepararam para a
virada do modelo -buscar ganhos na concessão de crédito,
mais do que no financiamento da
dívida pública. "Nos últimos
anos, eles aumentaram as linhas
de financiamento ao setor privado e desenvolveram uma infra-estrutura que melhorou a qualidade
do risco de crédito", diz.
Dados da ABM Consulting
mostram que o volume total de
crédito concedido à pessoa física,
por exemplo, saltou de cerca de
R$ 32 bilhões em janeiro de 1997,
para R$ 75 bilhões em janeiro deste ano. Mas, na opinião de Matias,
ainda é um volume baixo. "Os
bancos têm ganho dinheiro na
área de crédito mais com as taxas
elevadas que cobram do que com
volume de financiamentos."
Enquanto a rentabilidade média da carteira de crédito dos
maiores bancos nacionais é de
32% ao ano, a média dos internacionais é de 11% ao ano, segundo
ele. Por isso Matias diz acreditar
que para que ocorra uma virada
no sistema bancário, com redução de juros, os bancos terão de
buscar novas fontes de receitas.
A outra fonte de receitas dos
bancos são as tarifas de serviços. E
o sistema recebeu um reforço: a
TED (Transferência Eletrônica
Disponível). Lançada em julho
deste ano, a nova tarifa já atinge
transferências (DOC ou cheques)
de valor igual ou superior a R$
5.000, que custam entre 0,038% a
0,2% do valor do documento.
Mas a nova tarifa deverá atingir
todas as transações bancárias no
futuro, gerando novas receitas.
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