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BOLHA HOTELEIRA
Com superoferta de quartos, cidade tem taxa média de ocupação de 47%, uma das mais baixas do mundo
Só Jerusalém tem hotéis vazios como os de SP
FÁTIMA FERNANDES
CLAUDIA ROLLI
DA REPORTAGEM LOCAL
A cidade de São Paulo "hospeda" uma das mais graves crises do
setor hoteleiro mundial.
Levantamento da consultoria
Deloitte & Touche mostra que,
nos 12 meses terminados em
abril, a taxa média de ocupação
dos hotéis paulistanos era de 47%
-o segundo pior desempenho
numa lista de quase 30 importantes cidades no mundo. São Paulo
só ganha de Jerusalém (31,5%). E
perde até de cidades que mais sofreram com a Sars (síndrome respiratória aguda grave) -como
Hong Kong, com ocupação de
73,5%, e Pequim, 70,3%.
Na Argentina, que só agora começa a se recuperar de uma grave
crise econômica, o desempenho
dos hotéis foi melhor no período
-Buenos Aires teve taxa de ocupação de 49,5%. Também tiveram
melhor desempenho os hotéis de
outras cidades latinas, como Cidade do México (66,4%) e Santiago (51,9%). Esse levantamento
considerou somente hotéis das
categorias quatro e cinco estrelas.
A crise dos hotéis paulistanos
foi causada principalmente pela
superoferta de hotéis e de flats.
A receita por apartamento disponível (ocupado ou não), outro
termômetro de desempenho,
também revelou a falta de fôlego
do mercado hoteleiro em São
Paulo. Nos hotéis paulistanos, era
de US$ 36. De novo, só ganhou de
Jerusalém (US$ 23). O valor mais
alto, US$ 151, foi o de Tóquio
-também o líder mundial em taxa de ocupação (76,6%).
Em São Paulo, onde os hotéis
historicamente operavam com taxa de ocupação superior a 60%, os
percentuais deste ano colocaram
hotéis e flats em pé de guerra. A
falta de hóspedes e o excesso de
quartos derrubaram os preços
das diárias pela metade.
No levantamento da Deloitte, a
diária média cobrada dos hotéis
em São Paulo foi de US$ 77, só
mais alta do que a de Quito (US$
75) e a de Jerusalém (US$ 73).
"O que ocorre no setor hoteleiro
hoje é um descalabro. A maioria
dos hotéis de São Paulo opera
com prejuízo", diz Nelson Baeta
Neves, presidente da Abih (Associação Brasileira da Indústria de
Hotéis). "São Paulo tem uma das
mais baixas taxas de ocupação do
mundo porque faltou planejamento dos operadores", completa
Luiz Paulo Pompéia, diretor da
Embraesp (Empresa Brasileira de
Estudos de Patrimônio).
A crise do setor começou a se
delinear a partir do final dos anos
90, quando grupos estrangeiros,
animados com o déficit de quartos que havia na cidade e com a
estabilidade provocada pelo Plano Real, intensificaram seus investimentos no país. "O problema
é que todo mundo investiu de
uma vez só, o que resultou numa
superoferta de hotéis, sobretudo
nas categorias quatro e cinco estrelas", diz Pompéia.
Ao mesmo tempo, os flats passaram a ganhar espaço e a concorrer com os antigos e os novos hotéis. De 2000 a 2003, por exemplo,
foram inaugurados 57 flats em
São Paulo, o que significou a oferta de 12.055 quartos, segundo levantamento da Asmussen & Associados. No mesmo período, foram inaugurados 35 hotéis (6.642
apartamentos).
Alguns hotéis em São Paulo
operam com taxa de ocupação
menor ainda do que a média registrada pela Deloitte. Levantamento da BSH International, realizado de janeiro a julho deste
ano, mostra que a ocupação média dos hotéis de quatro e cinco
estrelas era de 34%. "A indústria
hoteleira paulistana enfrenta a
sua maior crise, mas não chega a
perder dinheiro. Também não ganha", diz José Ernesto Marino Neto, presidente da BSH.
A rede Hilton, que investiu US$
97 milhões na instalação de um
hotel no Morumbi, inaugurado
há 11 meses, informa que a sua taxa de ocupação no país (que inclui outro hotel em SP e um em
Belém), na média, é de 30%.
"Há mais oferta do que procura
por apartamentos em todas as categorias de hotéis", afirma Tom
Potter, diretor da rede para a região do Mercosul. "Nosso desejo
era estar operando hoje com 55%
de ocupação", afirma.
A superoferta de quartos levou
o grupo mexicano Caesar Park a
reduzir a diária pela metade. Com
três hotéis só em São Paulo, a rede
cobra R$ 220 a diária, quando deveria cobrar R$ 480, diz Luis
Eduardo Calle, diretor para a
América do Sul do grupo Posadas, dono da marca Caesar Park.
"É difícil manter um hotel nessa
situação, mas estamos enxugando custos para tornar a operação
cada vez mais eficiente", afirma.
Segundo ele, a taxa de ocupação
dos três hotéis em São Paulo é de
50%, em média. Na Argentina,
diz, é da ordem de 55%.
"A indústria hoteleira em São
Paulo também foi duramente afetada com a retração de negócios
na América Latina, sobretudo na
Argentina e nos Estados Unidos.
As companhias economizaram
nas viagens", afirma Rui Manuel
Oliveira, vice-presidente do grupo Meliá para a América do Sul.
A cadeia norte-americana
Hyatt, presente em 40 países, opera seu primeiro hotel em São Paulo com taxa de ocupação de 30% a
35%, a mesma registrada na Índia
e em Israel. Na rede, as taxas de
ocupação estão, em média, acima
de 70%. "Em São Paulo, a nossa
taxa de ocupação é uma das mais
baixas do mundo", afirma Myles
McGourty, diretor-geral do
Grand Hyatt São Paulo.
Para o diretor-geral do Accor
Hotels no Brasil, Roland de Bonadona, o que ocorreu no mercado
hoteleiro não é diferente do que
aconteceu em outros setores da
economia -como o da indústria
automotiva. "Eles têm capacidade
para 3,2 milhões de veículos ao
ano, mas não vendem isso", diz.
Há 26 anos no país, o grupo francês administra seis marcas, que
reúnem 116 hotéis e flats.
Apesar da superoferta, o paulistano não vai deixar de ver novos
hotéis. Amanhã, será inaugurado
o hotel Fasano, para concorrer na
categoria dos hotéis especiais
-mais do que cinco estrelas.
Em outubro, é a vez de a cadeia
norte-americana Howard Johnson abrir o seu primeiro hotel no
país, em São Paulo. Até o final do
ano entra em operação o hotel
Kempinski. Em 2004, já estão previstas inaugurações de dez novos
projetos, com investimentos somados de R$ 650 milhões.
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