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ARTIGO
Fed pode se orgulhar do BCE
JOHN LIPSKY
ESPECIAL PARA O "FINANCIAL TIMES"
Em lugar de ser elogiado
por ter cortado as taxas de juros em meio ponto percentual na
quinta-feira, o Banco Central Europeu provavelmente será criticado por ter ficado para trás da curva da política monetária. A maior
parte dos analistas acredita que o
BCE vem teimosamente ignorando os pontos fracos da zona do
euro ao estabelecer sua política de
juros. Em contraste, o relaxamento da política monetária do Federal Reserve (banco central dos
EUA) de 2000 em diante é interpretado, geralmente, como o mais
agressivo da história moderna.
A divergência parece evidente.
De 2001 para cá, o Fed reduziu sua
meta para a taxa de juros 12 vezes,
em um total de 5,25 pontos percentuais. No mesmo período, o
BCE fez sete corte, em apenas 2,75
pontos. Enquanto isso, o PIB dos
EUA cresceu 2,9% no ano passado, ante 0,9% de crescimento médio na zona do euro. O diferencial
de crescimento persistiu neste
ano, e a expectativa é que aumente nos próximos meses.
De fato, o impacto atual da política monetária não é significativamente diferente nas duas regiões,
pelo menos se julgado com base
no ágio relativo entre as taxas de
juros de curto prazo e os rendimentos dos títulos de longo prazo, determinados pelo mercado
em ambas as regiões. Essa é uma
regra comumente usada para determinar o grau de agressividade
de uma política monetária.
Segundo a Lei de Taylor, sob a
qual um banco central deveria alterar sistematicamente os juros
em resposta a desvios com relação
às metas de inflação e à meta de
pleno emprego, o quadro é ainda
mais surpreendente. A política do
Fed é coerente com a regra, mas o
BCE vem adotando uma política
muito mais expansiva.
A explicação para esse resultado
inesperado é bastante clara. Os
EUA são capazes de sustentar um
ritmo anual de crescimento de
3,5% a 4%. A capacidade excedente norte-americana vem se
acumulando de maneira relativamente rápida desde a metade de
2000, e agora já atinge entre 3% e
6% do PIB. O potencial de crescimento da zona do euro é estimado entre 2% e 2,5% ao ano. O crescimento da capacidade excedente
equivaleu a 2% do PIB. Ao mesmo tempo, a inflação da zona do
euro excedia, até o mês passado, o
limite de 2% estipulado pelo BCE.
Em contraste, a inflação nos EUA
vem se mantendo próxima da faixa preferida pelo Fed desde 1997.
Com a economia da zona do euro no momento estagnada, e com
uma queda acentuada da inflação
em curso, o BCE reduzirá as taxas
ainda mais este ano, talvez em um
ponto percentual, seguindo a receita da Lei de Taylor. Mas um
afrouxamento dessa escala não
conseguirá reduzir rapidamente a
disparidade de crescimento entre
os EUA e a zona do euro. Isso reflete diferenças estruturais, como
fatores demográficos, regulamentação e tradições culturais.
Por outro lado, a expansão fiscal
sem precedentes que ocorre nos
EUA deu sustentação à renda domiciliar, enquanto a política fiscal
da UE segue restrita pelo histórico
de déficits.
Justificadas ou não, as percepções sobre a flexibilidade relativa
do Fed e do BCE estão exercendo
um importante impacto. Por
exemplo, a recente valorização
aguda do euro diante do dólar (e
de outras moedas) reflete a mudança progressiva anterior nos
diferenciais de taxas de juros de
curto prazo, em favor do euro, e a
crença comum de que as taxas de
juros da zona do euro continuam
"altas demais".
À medida que se torna claro que
a alta do euro está prejudicando o
crescimento da zona do euro, e
assim que os mercados financeiros europeus tiverem descontado
plenamente o declínio iminente
da inflação, o processo começará
a se reverter. Assim, é provável
que os mercados de câmbio se estabilizem nos próximos meses,
refletindo a nova ampliação da
disparidade de crescimento, com
a aceleração da economia norte-americana e a mudança favorável
ao dólar dos EUA nos juros de
curto prazo.
John Lipsky é economista-chefe da
corretora JP Morgan Securities
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