São Paulo, quinta-feira, 10 de julho de 2008

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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

O Conselheiro Acácio contra a inflação


É importante que a política antiinflacionária combine a taxa de juro com outros instrumentos


"O TEMPO não cura nada; apenas tira o incurável do centro das atenções" (Ludwig Marcuse). Pare um minuto, leitora, para refletir sobre essa frase... Pronto, podemos continuar. Há certa desproporção entre a frase do filósofo alemão e os propósitos basicamente pedestres e até acacianos do artigo de hoje. A ligação (um pouco forçada, reconheço) é a seguinte. O tempo -14 anos desde o lançamento do Plano Real- tirou a inflação do centro das atenções. Em 1999, ela ameaçou retornar ao proscênio, mas não teve grande impacto. Agora, ela volta a incomodar -sobretudo os pobres.
Tratei do assunto na quinta-feira passada. Um leitor escreveu reclamando que eu perguntara: "O que deve ser feito contra a inflação?" -e não me dera o trabalho de responder. Foi mal. De fato, passei o artigo dizendo o que não fazer (aumentar agressivamente os juros). Prometi ao leitor que iria tratar de cobrir a lacuna, e aqui estou tentando cumprir a promessa.
Começo com uma homenagem ao Conselheiro Acácio -aquele personagem do Eça que dizia o óbvio ululante com uma categoria impressionante (e que, aliás, também era economista): o tema é complexo e difícil de explicar em poucas palavras. Resolvi, então, desdobrar a explicação em duas partes; começo hoje e termino na quinta-feira que vem.
Primeiro ponto: parte da solução está no controle da demanda interna, que vem crescendo rapidamente e pressionando a inflação (mais especificamente, os preços dos produtos não-transacionáveis internacionalmente, pois os exportáveis e importados têm os seus preços determinados basicamente pelo câmbio e pelos preços internacionais).
O importante é reduzir o ritmo de expansão do consumo. O investimento, que também vem crescendo a taxas elevadas, é o componente da demanda que amplia a oferta agregada.
O investimento fixo líquido (deduzidas a variação de estoques e a depreciação do estoque de capital) corresponde à criação de capacidade produtiva. Quanto maior o investimento fixo líquido hoje, maior será, no futuro, a taxa de crescimento do PIB consistente com o controle da inflação (o jargão disfarça, mas a verdade é que ainda não consegui me livrar inteiramente do Conselheiro Acácio).
Um aumento da taxa básica de juro atinge os dois componentes da demanda interna. Era necessário aumentar os juros básicos? Provavelmente, sim. Se a taxa de juro nominal ficasse constante, haveria uma diminuição dos juros reais, o que não seria conveniente num período de alta persistente da inflação e das expectativas de inflação provocada por choques de oferta e aquecimento da demanda interna.
Mas, como expliquei na semana passada, há vários motivos, além do efeito sobre o investimento, para não carregar a mão no aumento dos juros.
É importante, portanto, que a política antiinflacionária combine a taxa de juro com outros instrumentos, como o governo já vem procurando fazer.
Os outros instrumentos seriam principalmente os seguintes: a) política fiscal restritiva -diminuição de gastos públicos correntes não-prioritários; b) controles seletivos sobre o crédito ao consumo; c) medidas pontuais para conter pressões localizadas de preços (desonerações de tributos internos, diminuição temporária de tarifas sobre importação, tributação seletiva de exportações com preços em alta no mercado internacional); e d) medidas de estímulo à oferta em setores de resposta rápida (agricultura, por exemplo).
Volto ao assunto na semana que vem.


PAULO NOGUEIRA BATISTA JR. , 53, escreve às quintas-feiras nesta coluna. Diretor-executivo no FMI, representa um grupo de nove países (Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago). pnbjr@attglobal.net



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