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DOIS MUNDOS
Setores pesquisados tiveram rentabilidade média anual menor que o de aplicação conservadora em nove anos
Fundos DI rendem 18,3%; empresas, 3,6%
ÉRICA FRAGA
MAELI PRADO
DA REPORTAGEM LOCAL
O investidor que fez uma aplicação conservadora no mercado financeiro nos últimos nove anos
ganhou, em média, quatro vezes
mais do que o empreendedor que
se dedicou à atividade produtiva
ou ao setor de serviços no Brasil.
O retorno médio anual de 18,3%
dos fundos DI, entre 1995 e 2003,
superou muito a rentabilidade
média de 3,6% das empresas de
capital aberto não-financeiras no
mesmo período.
Mesmo analisados separadamente, todos os 17 setores pesquisados pela consultoria Economática tiveram retorno médio anual
inferior ao dos fundos DI.
O segmento de melhor desempenho no período foi o de veículos e peças -cuja principal empresa é a Embraer-, com rentabilidade sobre o patrimônio líquido de 17,3%. Essa medida significa que, para cada R$ 100 investidos, a empresa teve, em média,
ganho anual de R$ 17,3.
Embora considerada elevada, a
rentabilidade desse setor ainda
perdeu para os ganhos médios (já
descontada a alíquota de 20% do
IR) de R$ 18,3 para cada R$ 100
aplicados por ano conseguidos
pelos investidores pessoas físicas
de um fundo DI, segundo dados
do site Fortuna.
Pior, no entanto, é a situação de
vários outros setores cujos retornos, entre 1995 e 2003, perderam
de longe para a aplicação, considerada conservadora por analistas. Em alguns segmentos, como
comércio e eletroeletrônicos, os
empresários tiveram rentabilidade negativa de, respectivamente,
2,4% e 0,1%.
"Não me surpreende. Em uma
economia que há mais de dez
anos vive sob um império de taxas
de juros altíssimas, essa é a conseqüência lógica", diz Rubens Ricupero, secretário-geral da Unctad
(Conferência das Nações Unidas
sobre Comércio e Desenvolvimento) e ex-ministro da Fazenda.
Analistas dizem que essa distorção de retornos maiores no mercado do que no setor produtivo é
conseqüência de aspectos da política macroeconômica praticada
nos últimos dez anos.
Com o controle da inflação, a
partir de 1994, o governo brasileiro, que, até então, financiava seus
altos gastos emitindo moeda, teve
de partir para a emissão de dívida
pública e para o aumento da carga
tributária. Isso tem resultado em
duas conseqüências principais:
1) Com sua alta necessidade de
financiamento, o governo federal
paga juros altos. Para analistas, isso faz com que o retorno de aplicações em títulos públicos supere
os ganhos dos investimentos em
produção ou serviços;
2) A crescente tributação tem
estrangulado o setor produtivo,
reduzindo margens de lucros.
Um estudo feito pelos economistas Fernando Veloso, coordenador do mestrado em economia
do Ibmec, no Rio de Janeiro, Samuel Pessôa (Fundação Getúlio
Vargas) e Victor Gomes (Universidade Católica de Brasília) mostrou que o retorno extra que uma
empresa tem ao incrementar um
investimento já existente no Brasil -comprando máquinas novas, por exemplo- tem sido de
cerca de 15% ao ano.
Esse retorno, chamado de produtividade marginal do capital, é
bruto. Segundo Veloso, se descontados a taxa de depreciação do
capital e os impostos, pode cair
para algo entre 5% e 6% ao ano.
"Sem dúvida essa taxa é muito
baixa em relação à rentabilidade
de ativos financeiros", diz ele.
Outras causas
O baixo crescimento -em parte, conseqüência dos juros altos-
e as crises financeiras dos últimos
anos também contribuíram para
o retorno relativamente baixo das
empresas. Caso se expanda 3,5%
neste ano, o Brasil terá uma média
acumulada de expansão de 2,2%
em dez anos. O número se traduziu em alto nível de desemprego,
demanda interna reprimida e pequena oferta de crédito.
Setores dependentes de financiamentos à demanda doméstica,
portanto, apresentaram desempenho ruim nos últimos anos. Entre 1995 e 2003, a indústria de
construção civil teve rentabilidade média anual de 2,3%.
Outro fator que teve impacto
negativo em alguns setores foram
as desvalorizações sofridas pelo
real em 1999, quando foi abandonado o regime de câmbio fixo, e,
principalmente, em 2002, antes
das eleições presidenciais.
"A desvalorização da moeda teve impacto negativo em setores
como energia elétrica e telecomunicações", afirma Einar Rivero,
analista da Economática.
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