São Paulo, domingo, 13 de julho de 2008

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País preenche critérios para clube de elite

Brasil é uma democracia e adota economia de mercado, os dois itens principais que dão passaporte para integrar o G8

Presidente francês defende inclusão da China e da Índia no grupo que se reúne para "solucionar os grandes assuntos do mundo"


CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

O presidente Lula queixa-se da maneira como são governadas as Olimpíadas e, por extensão, do colégio eleitoral que escolhe a cidade-sede.
"A Itália sozinha tem cinco votos; a América do Sul inteira, apenas quatro", disse Lula na quarta-feira, em Hokkaido, após participar das cúpulas do G5 (Brasil, China, Índia, África do Sul e México) e do encontro deste com o G8, o clubão que reúne as sete grandes economias do mundo mais a Rússia.
A crítica poderia ser estendida, até com mais razão, à governança global, dominada por apenas oito países, justamente o G8 (Estados Unidos, Japão, Alemanha, França, Reino Unido, Itália, Canadá e Rússia), embora haja 192 países representados nas Nações Unidas.
Lula não se queixou do G8 nas suas reuniões no Japão com os líderes desses países (quase todos eles mantiveram encontros bilaterais com o governante brasileiro). Talvez tenha perdido a penúltima chance de fazê-lo. A última será, eventualmente, em 2009, na próxima cúpula do G8 (na Sardenha, Itália), quando o G5 continuará na "segunda divisão", chamado apenas no último dia para discutir com o G8.
Acontece que essa forma de diretoria do planeta, como o G8 chegou a ser chamado em outros tempos, esgotou seu prazo de validade até na opinião de governantes que a integram.
"Não é razoável continuar reunindo apenas os oito para solucionar os grandes assuntos do mundo, esquecendo a China, com 1,3 bilhão de pessoas, e sem convidar a Índia, com 1,1 bilhão de habitantes, ou sem ter nenhum país árabe, africano ou da América Latina", disse, por exemplo, o presidente francês Nicolas Sarkozy.
Reforça editorial de quinta-feira do jornal britânico "Financial Times":
"A noção de que um clube de oito nações poderia conduzir o mundo -jamais plausível- está agora tão desacreditada que põe em questão o valor de todas as suas declarações".
Uma maneira longa de dizer que, no formato atual, o G8 tornou-se irrelevante. Se for ampliado, tese que certamente ressurgirá no percurso entre as cúpulas do Japão e da Itália, ficará claro que, ao contrário do que acontece na escolha da cidade olímpica, em que pesa o número de medalhas que cada país-candidato obteve, o Brasil atingiu pontos suficientes, no jogo global de poder, para ser promovido à primeira divisão.

Dois pontos
A rigor, são dois os critérios para fazer parte do G8: ser uma democracia e adotar a economia de mercado. O Brasil já tem 23 anos de uma democracia sólida. E, a partir do momento em que controlou a inflação, tornou-se suficientemente sério para ser respeitado. Mais ainda depois que um presidente com origem na esquerda, como Lula, adotou uma linha francamente pró-mercado, um critério não explicitado, mas muito considerado pelos países do G8.
O problema para o Brasil não é o país em si, mas um de seus companheiros de viagem, a China. Não está na agenda de ninguém transformar o G8 em G9, com a inclusão apenas do Brasil. Os muitos números que aparecem para acompanhar o G, na mídia e na academia, incluem sempre a China.
Há até quem sugira o extremo de um G2, composto por EUA e China. É o caso de Fred Bergsten, economista especializado em comércio internacional que, em artigo para a revista "Foreign Affairs", diz que essa parceria seria "muito mais eficiente", além de o novo papel de relevância ajudar "Pequim a atuar mais responsavelmente".
Não é um palpite isolado. Na sexta-feira, Howard French, o colunista de assuntos chineses do jornal "The International Herald Tribune", escreveu que "há uma crescente sensação de que os Estados Unidos encontraram o seu Nadal". É uma alusão ao fato de que o tenista espanhol Rafael Nadal bateu, na final do mitológico torneio de Wimbledon, o suíço Roger Federer, até então tido como praticamente invencível.
A idéia do G2, com uma China mais forte que os Estados Unidos, pode ser uma sensação acadêmica, mas não passa no teste da realidade.
Primeiro, porque o colossal crescimento da China nos últimos 20 anos não foi suficiente para chegar perto dos EUA em renda per capita, que, afinal, é o que de fato conta. Cada americana tem US$ 46.820 de renda, 16 vezes mais que os magros US$ 2.798 dos chineses. Aliás, os chineses perdem longe para todos os países do G8 e até para o Brasil (US$ 7.557), conforme as previsões para 2008 do Fundo Monetário Internacional.
Segundo, porque, no Japão, quando se falou em ampliar o G8, os japoneses lembraram que o cimento dele era dado por "valores". Maneira indireta de se referir à democracia, que a China não pratica. A Rússia tampouco é campeã de liberdades públicas, mas o G8 acha que o teor da democracia russa é suficiente, apesar de ser apenas a décima economia do planeta, atrás de seus pares no G8, da China e da Espanha.


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