São Paulo, quarta-feira, 15 de abril de 2009

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ALEXANDRE SCHWARTSMAN

Impactos da crise


A produção industrial é mais sensível às vendas no varejo do que às exportaçoes


NÃO É segredo que a indústria foi quem mais sentiu o impacto da crise externa e persistem dúvidas acerca da sua capacidade de recuperação neste ano. Isto dito, para sabermos o que esperar quanto ao desempenho futuro da produção industrial, é primeiro necessário entender o que causou a forte queda dos últimos meses. Acreditamos que esta tenha resultado do colapso das exportações industriais acoplado a um forte ciclo de estoques.
As exportações caíram pouco mais de 30% nos dois primeiros meses deste ano, depois de registrarem queda expressiva (11%) no quarto trimestre do ano passado.
Em contraste, apesar de terem se desacelerado, as vendas no varejo ainda registram níveis relativamente elevados, superando modestamente os volumes registrados em igual período do ano anterior. Os dados sugerem, assim, um efeito mais forte das exportações relativamente ao varejo, mas será que essa impressão sobrevive a uma abordagem mais rigorosa?
Com base em tais observações, estimamos (eu e Tatiana Pinheiro) um modelo que traduz em números os impactos desses movimentos sobre a indústria. Em que pesem alguns problemas (não temos uma boa medida mensal do investimento que não use dados da própria produção industrial, por exemplo), os resultados parecem fazer sentido.
O modelo aponta que a atividade industrial é mais sensível às vendas no varejo, incluindo automóveis e materiais de construção, do que às exportações: um aumento de 10% nas vendas gera um crescimento ao redor de 7,5% da produção, enquanto a mesma expansão das exportações teria um impacto da ordem de 3%.
Quando consideramos, porém, o comportamento efetivo de ambas as variáveis, é possível observar no gráfico que a queda recente das exportações explica a maior parte do desempenho recente industrial, enquanto as vendas no varejo têm "puxado" (sem sucesso) a produção para cima, mas numa magnitude consideravelmente menor do que a observada entre o terceiro trimestre de 2006 e o terceiro trimestre de 2008.
Obviamente, em se tratando de um modelo (portanto uma simplificação da realidade), há sempre parte da produção industrial não explicada pelas variáveis. No entanto, o desvio dos últimos meses vai além do habitual, parecendo capturar, a mais do tradicional erro, possivelmente a redução do produto não associada à queda da demanda, ou seja, a diminuição dos estoques no setor industrial. Se essa interpretação estiver correta, há implicações interessantes.
O ciclo de estoques deve se dissipar, ainda que lentamente, atenuando a queda da indústria nos próximos meses. Por outro lado, ante o colapso do comércio internacional, a perspectiva para as exportações industriais permanece ruim, fator que pesará sobre a atividade doméstica por um longo período. O fiel da balança, pois, é o desempenho das vendas varejistas, que tendem a reagir, com certa defasagem, à queda da taxa real de juros. A valer a experiência histórica, ainda que a recuperação industrial deva continuar lenta por ora, há chance de retomada mais vigorosa no final do ano.

ALEXANDRE SCHWARTSMAN, 46, é economista-chefe do Grupo Santander Brasil, doutor em Economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley) e ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central.

Internet: http://www.maovisivel.blogspot.com/

alexandre.schwartsman@hotmail.com


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