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SONHO DISTANTE
Aluguéis subiram menos que indicadores, enquanto tarifas públicas, sem concorrência, superaram IGPs
Com renda curta, inquilino negocia reajuste
PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO
Inquilinos e proprietários abandonaram, na prática, a indexação
dos aluguéis e passaram a negociar o percentual de reajuste dos
contratos. Desde 1998, os aumentos variaram sempre abaixo dos
índices de correção -o IGP-M
(Índice Geral de Preços - Mercado) ou o IGP-DI (Índice Geral de
Preços - Disponibilidade Interna). Já no caso das tarifas públicas, também ajustadas por esses
indicadores, os aumentos foram
muito maiores.
É o que mostra levantamento
do IBGE (Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística), feito a pedido da Folha. Em 2002, por
exemplo, os aluguéis subiram
0,29%, de acordo com o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor
-Amplo). As tarifas de energia tiveram uma alta muito maior:
19,88%. No mesmo ano, o IGP-M
ficou em 25,31%.
Segundo a gerente do Departamento de Índices de Preços dos
IBGE, Eulina Nunes dos Santos, o
fato de a renda dos trabalhadores
não acompanhar o ritmo do aumento dos aluguéis foi a principal
causa para a correção pelos IGPs
ter sido deixada de lado.
Outros motivos são, afirma ela,
o alto número de imóveis vagos, o
que eleva a competição e reduz o
preço dos aluguéis, e a preferência
do proprietário em receber menos a ficar com o imóvel desocupado.
No caso das tarifas, não há competição, diz Santos, o que permitiu que elas subissem num nível
próximo ao dos indexadores.
"A renda não cresceu [até caiu
nos últimos dois anos] como o
preço dos aluguéis e chegou num
nível em que não havia outra solução a não ser negociar", disse.
Segundo o Secovi-SP (sindicato
das administradoras de imóveis),
na cidade de São Paulo, 90% dos
contratos ainda prevêem formalmente a correção pelos IGPs.
Existem 650 mil residências locadas na cidade de São Paulo.
O vice-presidente da entidade,
Sérgio Lembi, afirma que as negociações são uma prática comum
porque "o IGP-M não mostra a
realidade do bolso do inquilino".
"Negociar caso a caso me parece
razoável. Não conheço categoria
que tenha recebido reajuste na
mesma proporção do IGP-M."
Lembi apresenta, porém, números diferentes dos do IBGE.
Diz que contratos foram reajustados em 13% (índice anualizado)
na cidade de São Paulo no primeiro trimestre.
Um aluguel que hipoteticamente vencesse em maio e tivesse o
IGP-DI como indexador sofreria
um reajuste de 30,05%, se o contrato fosse aplicado à risca. Esse
percentual é "impraticável", segundo Lembi.
Para o economista Luiz Roberto
Cunha, da PUC-Rio e da Fecomercio-RJ, "é fora de propósito"
reajustar tanto as tarifas públicas
como os contratos de locação pelos IGPs. Isso porque eles não "espelham a renda das famílias".
Início
Em 1999, o descompasso entre
os aumentos dos aluguéis e a variação dos IGPs se acentuou, o
que fez mais gente abandonar os
indexadores. Com a desvalorização do real, os índices -compostos em 60% por preços no atacado, mais sujeitos ao impacto cambial- explodiram.
O IGP-M teve alta de 20,1% naquele ano. Já os aluguéis caíram
2,41%, segundo o IPCA. No mesmo ano, as tarifas de energia dispararam 19,89%, absorvendo
quase integralmente a variação do
IGP-M.
A gerente do IBGE lembra que
nos primeiros anos do real (1994 a
1996) os aluguéis tiveram variações acima do IPCA -de até
94,73% em 1995- porque os
contratos estavam defasados.
Motivo: a correção era anual ou a
cada dois anos, apesar da hiperinflação. Até 1996, os contratos ainda "carregaram" a inflação antiga
desse período, o que fez os reajustes dispararem.
Por isso, no acumulado do Plano Real (julho de 1994 a maio de
2003), os aluguéis ainda têm uma
alta maior do que o IPCA
-393,26%, contra 154,11%. Em
igual período, as tarifas de energia
subiram 305,27%.
Neste ano, os aluguéis somam
alta de 1,59% até maio -menos
do que os 6,8% do IPCA e dos
13,87% da energia elétrica.
Para Luiz Roberto Cunha, o fato
de os aluguéis "perderem" para o
IPCA é "uma das âncoras da estabilidade" nos últimos anos devido
ao peso elevado que têm no orçamento das famílias e na composição do IPCA, o índice que baliza
as metas oficiais de inflação do
governo.
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