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Política industrial de Lula começa de fora para dentro
DO COLUNISTA DA FOLHA
O governo Lula, paradoxalmente, começa a sua política industrial (ou seja, o apoio oficial a
algum setor econômico) de fora
para dentro.
Tanto na negociação com os europeus como com os Estados
Unidos (na Alca), a oferta do Mercosul prevê a chamada "cláusula
de indústria nascente".
Tecnicamente, é a possibilidade
de que países em desenvolvimento imponham, em certas circunstâncias, medidas destinadas a
promover o desenvolvimento de
indústrias que estão se instalando.
Acontece que a equipe econômica, por absoluta falta de tempo,
ainda não definiu que setores devem ser protegidos, se é que haverá de fato algum a proteger.
Enquanto não há essa definição,
o Itamaraty fuçou as regras internacionais e descobriu um artigo
do antigo Gatt (Acordo Geral de
Tarifas e Comércio, substituído
em 1994 pela Organização Mundial do Comércio) que abre a brecha para esse tipo de política.
É o artigo 18, o mesmo que autoriza a adoção de medidas restritivas às importações por motivo
de desequilíbrio ou ameaça de desequilíbrio no balanço de pagamentos (o que contabiliza todas
as transações de um país com o
exterior).
O artigo 18 foi usado unicamente como proteção às contas externas. Nenhum país o invocou como anteparo para políticas industriais. A proteção pode ser dada
por meio de tarifas de importação
mais elevadas, subsídios ou no
marco do Trims (acordo internacional que trata de aspectos do comércio relativos a investimentos).
O acordo Trims proíbe que um
país como o Brasil exija de um investidor externo que tenha determinado desempenho exportador
ou seja obrigado a utilizar uma
dada porcentagem de produtos
locais, dois instrumentos clássicos de política industrial.
O governo brasileiro, com apoio
da Índia, vem lutando no âmbito
da OMC para modificar o acordo
Trims, exatamente para poder, se
o desejar, impor condicionamentos aos investimentos externos.
Mas, à falta de uma política interna definida, a cláusula de indústria nascente, proposta tanto a
europeus como a norte-americanos, funciona como uma espécie
de habeas corpus preventivo.
Como a Folha ouviu de um negociador brasileiro, "está lá para
lembrar que o artigo 18 [do Gatt"
existe, pode vir a ser invocado em
caso de necessidade e que, se isso
acontecer, podem ser alterados os
compromissos assumidos no calendário de redução das tarifas de
importação".
(CR)
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