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1973
O ano em que o Brasil cresceu 14%
Delfim Netto rechaça tese de que ditadura ajudou a elevar crescimento e diz que despertou "espírito animal" dos empresários
No auge do regime militar, país bateu recorde de crescimento após reformas
PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO
A moda era a calça boca-de-sino. A musa, Darlene Glória. O
ídolo esportivo, Emerson Fittipaldi. Na vitrola, rodavam os
Secos & Molhados. O ano era
1973, talvez o de maior repressão do regime militar, sob o governo Médici. E, enquanto isso,
o país crescia a uma taxa recorde de 14%, no último ano do
chamado "milagre econômico".
Mas o que levou o PIB do
Brasil a crescer a taxas maiores
que as da China? A resposta, dizem especialistas, vai desde
uma conjuntura mundial favorável, que permitiu o aumento
do investimento via endividamento externo, até reformas
estruturais introduzidas no governo Castello Branco.
Planejamento econômico,
promoção e estímulo (às vezes,
subsídios) às exportações, programas de desenvolvimento do
parque industrial a fim de substituir importações, ganhos de
produtividade do setor privado
e uma política fiscal mais austera eram outros fatores que impulsionaram o crescimento e
que estão na pauta do dia hoje.
"Não houve milagre. Os governos é que trabalhavam mais,
por isso o país crescia muito
mais. O mundo também estava
em expansão, e tínhamos feito
as reformas fundamentais. Tínhamos, na verdade, produzido
uma Constituição bastante
adequada do ponto de vista
econômico. E, na verdade, despertamos o espírito animal dos
empresários, que tinham um
tratamento benigno do governo", diz o economista Delfim
Netto, ministro da Fazenda no
período, parafraseando o atual
ministro, Guido Mantega, que
também quer estimular o espírito animal do empresariado.
De 1964 a 1965, reformou-se
o setor público (é desse período
a regra segundo a qual não se
pode criar gasto sem contrapartida na receita), criou-se um
regime tributário com a eliminação de impostos em cascata e
houve revisão da legislação trabalhista. O sistema financeiro
foi reorganizado, originando o
mercado de capitais. Resultado: a poupança financeira foi de
3,6% para 13,6% do PIB entre
1971 e 1972.
Para João Paulo dos Reis Velloso, ministro do Planejamento em 1973, as reformas foram
fundamentais para preparar o
país para o crescimento médio
de 11,1% no período do "milagre" -de 1968 a 1973. Delfim cita ainda a menor carga tributária: "Era menor que 20%. Hoje,
é de 38% do PIB".
Reis Velloso ressalta que havia maior capacidade de planejamento, o que levou ao crescimento econômico no período
de 1950 a 1980. Ele reconhece,
no entanto, que o controle do
Congresso e o regime ditatorial
facilitaram a aprovação de reformas e medidas.
"O país tinha, digamos, condições de laboratório na economia para fomentar o crescimento", avalia Fabio Giambiagi, economista do Ipea.
Para Jaques Kerstenetzky,
professor de história econômica da UFRJ, a ausência de democracia facilitou o trabalho:
"Era mais fácil escolher e decidir o que fazer, quais projetos
tocar". Delfim discorda: "O desenvolvimento não depende do
regime, se é democrático ou autoritário. Os democráticos até
tendem a crescer mais. Isso está na teoria econômica".
Na ânsia de crescer, os governos da época recorreram ao endividamento externo. "O país
se endividou num momento de
crédito abundante e juros baixos sem olhar para a possibilidade de a situação mudar. Daí,
surgiu a dificuldade dos anos
80", diz Kerstenetzky.
Aos críticos, Delfim reage: "O
país não se endividou coisa nenhuma. As pessoas não conseguem ler uma estatística. Em
1974, o país tinha uma dívida de
US$ 12 bilhões, a relação dívida/exportações era mais do
que virtuosa. As coisas pioraram depois, com a crise do petróleo". E foi justamente a crise
do petróleo, a primeira de 1973,
que enterrou o "milagre".
Na fase pós-milagre, o endividamento, antes usado para
investir, converteu-se em dívida para consumir -bancar as
importações de petróleo. Nem
bem a economia mundial se recuperou e, em 1979, um novo
choque do petróleo tornou a situação insustentável.
"Geisel, que assumiu em
1974, cometeu um erro ao promover um plano muito ousado
e desproporcional de investimento público", diz Delfim.
Acertou, porém, ao manter o
déficit alto e não cortar o consumo de petróleo, diz.
"Geisel tinha de decidir: ou
parava o Brasil ou endividava o
país. O mundo inteiro achava
que a crise [do petróleo] passaria depressa. A escolha foi correta. Se fizesse racionamento,
como queria a oposição, o Brasil seria hoje um Bangladesh."
Reis Velloso lembra que o então ministro Mário Henrique
Simonsen sugeriu ao general
João Baptista Figueiredo, ainda em 1979, conter o consumo e
o crescimento para impedir a
crise da dívida que se avizinhava. O presidente não aceitou, e
a economia entrou em colapso.
O Brasil decretou moratória
no governo Sarney, conviveu
com a hiperinflação -solucionada com o Plano Real, mas
que também não dinamizou o
crescimento. Nos "anos perdidos" de 80, 90 e na primeira
metade dos 2000, o crescimento médio ficou em 2,2%.
A julgar pelo primeiro trimestre do ano, o PIB se acelera:
cresceu 4,3% ante 2006. Muito
longe do "milagre", mas melhor
do que a média recente.
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