|
Texto Anterior | Índice
ANÁLISE
Freada chinesa ameaça multinacionais
MIKE MORGAN
DO "FINANCIAL TIMES"
Se você continua em marcha lenta em relação à China e
não decidiu se deve seguir a manada e investir em Pequim, talvez
já tenha perdido o barco, pelo menos por enquanto.
E se você se manteve distante
das indubitáveis delícias da Cosco
Pacific e da Guangdong Investment em favor de ações européias
"seguras", provavelmente seria
inteligente não demonstrar complacência exagerada. Porque um
número surpreendentemente
grande de empresas de nomes
muito conhecidos na Europa pode sentir o abalo causado pela desaceleração da superaquecida
economia chinesa.
As empresas Remy Cointreau,
Lonmin e Siemens geraram, cada
uma, 10% de seu faturamento em
2002 na China. O mesmo se aplica
à Volkswagen, cujas vendas de
automóveis no país subiram 40%
em 2003. A China deu às gigantes
de celular Nokia e Ericsson cerca
de 9% de seu faturamento no ano
passado. Para Alcatel, Danone,
STMicroelectronics e Infineon
Technologies, o número ficou
perto dos 8%.
Teun Draaisma, do banco Morgan Stanley, mantém completo
otimismo sobre as perspectivas
de longo prazo para a China.
Como exemplo do entusiasmo
dos investidores, ele cita uma
conferência do banco sobre commodities, em Nova York, em fevereiro. Mais de 400 delegados lotaram um salão, e número equivalente não conseguiu se registrar
para o evento.
Mas há um problema, porque
esse evento desperta lembranças
de uma conferência do Morgan
Stanley sobre internet, redes e
softwares, no Arizona, em 2000,
praticamente no pico da bolha da
tecnologia, com mil participantes
assistindo as palestras de pé.
Draaisma vê outros sinais negativos, em especial as 18 ofertas públicas iniciais de ações neste ano
na China, que resultaram, em média, em valorização de 100% para
as ações colocadas à venda.
Há o incontestável economista
do Morgan Stanley para o mercado chinês, Andy Xie, que conta
histórias sobre amigos que abriram empresas de internet em
2000 e agora montam negócios
com commodities ou mineração.
"Acreditamos que o entusiasmo
do mercado quanto ao potencial
de longo prazo da China seja justificado", diz Draaisma. "Mas isso
conduziu a níveis elevados de especulação em determinadas
áreas, e os riscos cíclicos de curto
prazo terminaram ignorados. É
inevitável que venha a haver ciclos no crescimento estrutural da
China, e 2004 pode apresentar
uma severa desaceleração."
Carl Weinberg, da High Frequency Economics, opta por uma
visão mais positiva. Números oficiais demonstram que a produção
industrial chinesa em março estava 19,4% acima do total registrado
no mesmo período em 2003, depois do aumento combinado de
17% em janeiro e fevereiro.
Conflito de números
"Nós analisamos os dados intensamente para reproduzir esses
cálculos -e não conseguimos fazê-lo", diz Weinberg. "Nossos números sugerem um aumento
muito mais forte na produção industrial, de 36,1% em março ante
o mesmo mês em 2003, depois de
33,1% de avanço no período janeiro-fevereiro, o que fica perto
da metade do cálculo oficial, um
fator que causa suspeita."
"De qualquer forma, a implicação desses números, quaisquer
que sejam os cálculos, é que a economia está crescendo num ritmo
insustentavelmente rápido."
Muitos administradores de fundos parecem ter se deixado convencer por esse argumento. Na
semana passada, a influente pesquisa do banco Merrill Lynch
com administradores de fundos
em todo o mundo constatou que
só 34% deles esperam que os preços das commodities estejam em
alta em um ano, ante 70% em janeiro.
O motivo? A crença de que, pela
primeira vez desde a crise da Sars,
a economia chinesa perderá força
nos próximos 12 meses.
A economia da China vem
mantendo um dos mais rápidos
ritmos mundiais de expansão.
Sua expansão nos 12 meses até
março foi de 9,7%, com o pesado
investimento internacional ajudando a prolongar o rápido crescimento. Isso causou temores de
superaquecimento e expectativa
de nova compressão no crédito.
Um terceiro trimestre consecutivo de crescimento anualizado
superior a 9% foi registrado, a
despeito de uma campanha do
governo para conter a expansão
perto da meta oficial de 7%, que é
vista como mais sustentável.
O crescimento da China tem
três motivos básicos: avanço nas
exportações, que expandiram
cerca de 35% em 2003, de acordo
com as expectativas; investimento
estrangeiro direto, que bateu um
recorde, ultrapassando US$ 50 bilhões no ano passado; e investimentos bancados pelo Estado em
infra-estrutura.
Ian Harwood, da Dresdner
Kleinwort, diz que todos os sinais
da China indicam que vão surgir
normas para desacelerar a demanda por investimento e os desequilíbrios que o país vem criando, ainda que, no momento, as
autoridades pareçam relutantes
em adotar uma política agressiva
de aperto monetário.
Tradução de Paulo Migliacci
Texto Anterior: Frase Índice
|