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ZONA FRANCA
Com a concessão da Infraero e da Receita, grupo Brasif domina rede de duty-frees no Brasil e fatura US$ 280 mi
Empresa monopoliza free shop sem controle
FÁTIMA FERNANDES
CLAUDIA ROLLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Há quase 30 anos, o grupo Brasif, dono de um faturamento
anual de US$ 280 milhões, domina praticamente sozinho e explora no Brasil os duty-frees -lojas
francas instaladas nos aeroportos
para vender produtos importados
isentos de impostos- com a concessão da Infraero (Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária), ligada ao Ministério
da Defesa, e da Receita Federal, ligada ao Ministério da Fazenda.
Esse monopólio -só em Salvador há outra empresa que explora
o serviço- é marcado por informações divergentes sobre concorrência, cifras que o negócio
movimenta, valores dos repasses
para o governo e por rumores de
favorecimento político. O senador Jorge Bornhausen (PFL-SC)
já foi apontado como um dos sócios da empresa. Ele nega. Em São
Paulo, Brasif e Infraero informam
que a empresa tem permissão para manter os free shops até 2014.
Já a Receita afirma que o prazo
acaba em maio de 2006.
O mineiro Jonas Barcellos Corrêa Filho, dono da Brasif S.A. Exportação e Importação, abriu sua
primeira loja em 1978, no Rio de
Janeiro, em parceria com a empresa inglesa Allders, que dominava os free shops na Inglaterra.
Na década de 80, a Brasif acabou
comprando os 40% do capital que
pertenciam à empresa inglesa.
Por meio de licitações e prorrogações de contratos, o empresário
conseguiu expandir o negócio para oito Estados brasileiros, onde
possui hoje 23 lojas francas.
Concorre praticamente sozinho
nas licitações abertas para os aeroportos, já que detém o know-how. E, nos locais onde já está,
consegue prorrogar contratos na
Justiça apoiado em portarias que
regulam o negócio no Brasil.
É o caso do seu contrato com a
Infraero e a Receita Federal para
manter seus free shops no aeroporto de Cumbica, em Guarulhos.
Em 1984, a empresa transferiu sua
loja franca do aeroporto de Congonhas, onde estava desde 1979,
para Cumbica, que passou a operar os vôos internacionais.
Com a transferência, ganhou
um prazo da Infraero, responsável pela cessão de área nos aeroportos, para permanecer por mais
15 anos -até 1999. Outra prorrogação do contrato lhe deu o direito de manter as lojas por mais 15
anos -até 2014, segundo informam a empresa e a Infraero.
Apesar de a Receita e a Infraero
comandarem juntas os processos
de licitação, a Receita em São Paulo informa que o prazo "alfandegado" termina em 2006. Nessa data, será feita nova licitação. A Receita informa que a portaria 204,
de 1996, dá condições para uma
empresa operar o negócio.
Brasif e Infraero afirmam que a
extensão dos prazos é uma forma
de compensar a empresa pelos investimentos feitos nas reformas
das lojas nos aeroportos, na abertura de novos pontos-de-venda,
além de amortizar prejuízos com
a queda do número de passageiros nos últimos anos, com base na
portaria 774, de 1997.
A Folha solicitou cópia dos contratos firmados com a Brasif, mas
foi informada pela Receita e pela
Infraero de que os documentos
eram antigos e difíceis de serem
localizados em poucos dias. A reportagem também pediu informações sobre o faturamento das
lojas e o valor arrecadado pela Receita e pela Infraero com o repasse
de taxas pagas pela Brasif.
"Não posso dizer. É estratégico.
Se contar, vou despertar a concorrência", diz Corrêa Filho. A Receita e a Infraero informam que os
contratos estão sob sigilo fiscal
pelo Código Tributário Nacional.
Sobre o faturamento dos free
shops, a Brasif é obrigada a pagar
à Receita 6% das vendas de mercadorias estrangeiras e 3% de produtos nacionais. Para a Infraero, o
percentual varia por contrato,
mas chega a ser determinante para uma empresa ganhar a concorrência, segundo a Folha apurou.
Em São Paulo, por exemplo, a
Brasif paga 12% de sua receita
mensal à Infraero. "Cerca de 30%
da venda das lojas vai para pagamento de contribuições e impostos", diz o empresário mineiro.
Amigos
O poder de fogo da Brasif vai
além de sua infra-estrutura comercial e logística, montada desde a década de 70 no Brasil e no
mundo. Com amigos influentes
em Brasília, Corrêa Filho conseguiu, por exemplo, derrubar medida criada no governo FHC para
limitar a US$ 300 por pessoa
(eram US$ 500) o gasto nos free
shops, segundo a Folha apurou.
De um pacote fiscal de 51 medidas lançado em 1997 para salvar o
Plano Real, a primeira a cair foi
essa -apesar da necessidade do
país de reduzir a saída de dólares.
Sua loja no aeroporto de Confins (MG) é mantida pela "política
da boa vizinhança", como ele diz.
"Sabe por que entramos em Belo Horizonte? Por pressão de amigos e políticos. Todo mundo pedia, o governador, a sociedade.
Abriram a concorrência, e o que
ocorreu? Entramos sozinhos.
Ninguém quis participar, porque
não se ganha dinheiro lá. Em Brasília, idem." Perder dinheiro em
algumas lojas compensa, na sua
análise. "Ganho dinheiro no todo
do negócio. Em Fortaleza, a gente
não ganha. Em Porto Alegre, dá
um pouquinho. Perdemos muito
dinheiro em Recife. Só agora começou a melhorar. O grosso está
em São Paulo e no Rio."
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