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Fábrica na Bahia produz de roupas
a panôs para afrodescendentes
LUIZ FRANCISCO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM SALVADOR
Em um galpão de quase 900 metros quadrados, localizado em
Cosme de Farias (15 km do centro
de Salvador), 22 operários usam
cores fortes e alegres para fabricar
vestidos, saias, biquínis, cangas,
camisetas, calças, sungas, toalhas
e panôs direcionados basicamente para o maior público consumidor da capital baiana -os afrodescendentes.
Segundo o MNU (Movimento
Negro Unificado), 79,9% da população de Salvador (2,56 milhões
de habitantes) é formada por negros, mestiços e mulatos. "Com o
passar dos anos, os negros perceberam que suas histórias podem
ser contadas pelas roupas, pelos
adereços, pela decoração", disse a
artista plástica Maria Auxiliadora
dos Santos Goya Lopes, 50.
Há 18 anos, Goya Lopes fundou
a Didara, fábrica que atualmente
produz cerca de 3.000 peças por
mês e que, desde o ano passado,
começou a exportar para a Itália.
Em média, a empresa fatura cerca
de R$ 60 mil por mês. "A exportação acontece principalmente durante o verão europeu. Mesmo estando apenas no começo do trabalho, conseguimos vender para
o exterior aproximadamente 50%
do nosso faturamento."
"No começo dos anos 80, quando morava na Itália, percebi que
os negros brasileiros não tinham à
disposição produtos que os identificavam dentro da cultura afro-brasileira. Aqui, como em quase
todo o mundo, a moda é uma imposição. E os negros, felizmente,
batalharam muito para conseguir
a sua identidade", disse a empresária, que também possui uma loja no Pelourinho (centro histórico
de Salvador).
Cinco cores
Todos os produtos que saem da
linha de montagem da Didara
possuem somente cinco cores
-vermelho, amarelo, laranja,
preto e branco. "Essas cores têm
uma luminosidade muito forte,
são muito usadas na África."
O trabalho de Goya Lopes ganhou mais dimensão depois que
dois artistas -o ministro Gilberto Gil (Cultura) e o jamaicano
Jimmy Cliff- começaram a usar
roupas confeccionadas pela artista plástica.
"Muitos afrodescendentes brasileiros, que se espelhavam no padrão europeu de moda, começaram a comprar os nossos produtos, principalmente depois que o
ministro Gil passou a se apresentar em público com as roupas fabricadas pela minha empresa."
Na loja do Pelourinho, os preços
dos produtos fabricados pela Didara variam de R$ 15 (camiseta
infantil) a R$ 2.000 (panô). "Gostei muito do estilo, principalmente porque as roupas não saem de
moda", disse a estudante peruana
Cristina Velasquez, 25, que visitou o estabelecimento no centro
histórico de Salvador.
Professora de história e pesquisadora da UCSal (Universidade
Católica do Salvador), Cecília
Soares, 39, disse que existe uma
grande "brecha" a ser explorada
pelas empresas que têm os afrodescendentes como público-alvo.
"O que o mercado impõe não representa a identidade dos negros", disse a pesquisadora.
De acordo com Soares, os negros são consumidores "que necessitam de um olhar específico".
"A sociedade brasileira nunca deu
a devida importância para o negro. Agora, depois de muita luta,
os negros começaram o ocupar o
seu espaço. Quem souber explorar o mercado afrodescendente,
que é muito grande, certamente
não vai se arrepender."
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