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OMC admite que subestimou principal "nó" na negociação
Diretor-geral diz que mecanismo de salvaguarda não estava na lista de temas prioritários
Lamy não faz previsões sobre o futuro das negociações comerciais, mas afirma acreditar que a Rodada
Doha não tenha morrido
DE GENEBRA
O tema que se transformou
em um obstáculo intransponível para o avanço da Rodada
Doha escapou do radar da OMC
(Organização Mundial do Comércio). Na noite de terça-feira, após nove dias de intensa
barganha e dezenas de propostas rejeitadas, o diretor-geral
da OMC, Pascal Lamy, deu por
encerrado o processo, frustrando a busca de sete anos por um
acordo global de comércio.
O próprio Lamy admite que o
ponto de atrito que levou ao fim
das discussões, o mecanismo
de salvaguarda agrícola para
países em desenvolvimento,
não estava em sua lista de temas mais explosivos.
"Talvez tenhamos errado em
não detectar o quanto esse assunto despertava paixões e disputas. Para a maioria de nós, o
SSM [Mecanismo Especial de
Salvaguarda, na sigla em inglês]
era apenas um dos muitos obstáculos", disse Lamy ontem em
conversa com a Folha e outros
cinco jornais no lendário
"Green Room" (salão verde) da
OMC. Foi ali que sete ministros, entre eles o brasileiro Celso Amorim, passaram dezenas
de horas em busca de uma solução para o impasse.
Vestindo camisa verde, num
ambiente totalmente desprovido da cor que dá nome à famosa sala, Lamy não quis fazer
previsões sobre o futuro das
negociações, mas acredita que
a Rodada Doha não tenha morrido. No encontro que teve ontem com representantes dos
153 membros da organização,
ele disse que ficou surpreso
com a quase unanimidade em
torno da idéia de preservar os
avanços feitos nos últimos dias.
Lamy não foi o único negociador presente ao "Green
Room" que se surpreendeu
com o fato de as negociações
terem afundado devido ao
SSM. O chanceler Celso Amorim chegou a chamar o mecanismo de "um assunto menor".
Na reta final, as discussões fracassaram devido à divergência
entre indianos e americanos
sobre como aplicar a salvaguarda contra importações agrícolas.
Uma fonte da OMC disse que
nem Índia nem os EUA haviam
sinalizado que fariam uma defesa "religiosa" de sua posição,
como ocorreu durante horas de
negociação infrutífera em Genebra. Acrescentou que outra
linha divisória surgida no
"Green Room" foi o endurecimento da China, que usou as
discussões para contestar os
termos de sua adesão à OMC,
em 2001, principalmente a redução de tarifas agrícolas, exigidas na época pelos EUA.
O impasse em torno da salvaguarda agrícola expôs as contradições dos interesses dos
países emergentes, pegando a
OMC de surpresa ao substituir
o antigo confronto norte-sul.
"A OMC não está habituada
com situações em que países
em desenvolvimento brigam
entre si", disse um negociador.
Aparentando serenidade,
sem nenhum sinal de fadiga
após conduzir mais de cem horas de negociações, o diplomata
e maratonista amador admitiu
que a complexidade da proposta em negociação e do processo
decisório da OMC dificultou a
obtenção de um entendimento.
Ele comparou o acordo que estava sendo negociado a uma
"catedral", que foi tornando-se
complexa demais à medida que
foi sendo construída.
O diplomata francês tem até
dezembro para anunciar se
quer ficar mais quatro anos à
frente da entidade máxima do
comércio mundial. Poucos arriscam um palpite sobre como
o fracasso da reunião ministerial em Genebra, cuja convocação foi considerada por muitos
uma aposta perigosa de Lamy,
afetará sua decisão.
Rumores de que Celso Amorim estaria entre os candidatos
à sucessão ressurgiram nesta
semana pelos corredores da
OMC. Mas o próprio chanceler
brasileiro negou estar na corrida. "Não tenho interesse", disse Amorim. Indagado se Lula
apoiaria sua candidatura ao
cargo, foi irônico. "Espero que
não. Se isso acontecer, é porque não estou fazendo bem o
meu trabalho."
(MN)
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