São Paulo, domingo, 18 de abril de 2004

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NA BERLINDA

No nível médio, estudantes suprem mão-de-obra permanente; no superior, falta conexão com área de formação

Estágio está desvirtuado, conclui governo

Fernando Moraes/Folha Imagem


PAULA LAGO
EDITORA-ASSISTENTE DE EMPREGOS E NEGÓCIOS

Jornada compatível com os estudos, correlação entre curso e estágio, férias e preocupação com a qualidade do programa. Segundo a óptica do grupo de trabalho que fez as sugestões, essas seriam as conseqüências das propostas de alteração da Lei do Estágio.
Na visão dos estudantes e de agentes de intermediação, no entanto, tais mudanças resultariam na redução da jornada -e, conseqüentemente, na diminuição da bolsa-auxílio- e na queda do número de vagas oferecidas.
As possíveis alterações, apresentadas por um grupo interministerial formado por membros dos ministérios do Trabalho e Emprego (MTE), da Previdência e da Educação e do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), foram avaliadas pelos respectivos ministros e aguardam análise da Casa Civil, para então seguir o trâmite no Congresso.

Desvirtuamento
O ponto de partida para a formação desse grupo, segundo Marcelo Campos, assessor da secretaria de inspeção do trabalho do MTE, foi a constatação de que muitos estágios estavam desvirtuados. "Houve uma flexibilização excessiva. Há uma ampla utilização do estudante do nível médio, que não tem nenhuma formação, como expediente para suprir mão-de-obra permanente."
"Nesses casos, eles fazem de tudo, menos estágio. E, no superior, muitos estágios não têm conexão com o estudo." Como exemplo, cita empresas que têm em seus quadros somente estagiários.
"Isso não é estágio. É emprego. Estágio não é alternativa de renda nem de mão-de-obra barata, não é para isso que ele se presta."
Em nota técnica, João Donadon, coordenador do grupo de discussão, afirmou que "se trata de questão recorrente, pontuada de denúncias de irregularidade ou questionamentos sobre a falta de consistência da legislação pertinente ao estágio".

Fonte de renda
Luiz Gonzaga Bertelli, presidente-executivo do CIEE (Centro de Integração Empresa Escola), é favorável ao aprimoramento do estágio, mas discorda que diminuição da jornada de trabalho e limite ao número de estagiários contratados sigam nessa direção.
"O estudante precisa do estágio para pagar o curso e, muitas vezes, ajudar os pais que estão desempregados. Se você limita a carga horária, com certeza a bolsa-auxílio será menor", analisa.
Do lado das empresas, diz, "devem diminuir as vagas, elas não vão querer isso. Pretendemos mostrar que o estágio, hoje, é o primeiro emprego que dá certo. A lei, como está, funciona. O governo, em vez de criar restrições, deveria incentivar o estágio".
E completa: "O número de estágios irregulares não é maioria. E estagiário não substitui profissional formado. Rigorosamente, ele não tem conhecimento para isso".

"Vai piorar"
O estudante de administração Yuri Rodrigues Ballarini, 18, teme que, com as mudanças, a situação piore. "Reduzindo a carga horária, vão querer que a gente trabalhe nos finais de semana. E nenhuma empresa vai querer alguém que trabalhe só quatro horas por dia. A procura por estágio vai piorar ainda mais."
"Empresa que abusa deve ser coibida, não adianta fazer lei, deve-se fiscalizar", aponta Carlos Henrique Mencaci, diretor do Nube (Núcleo Brasileiro de Estágios). "E o estágio é mais barato para o governo que o [programa] Primeiro Emprego: é funcional, não envolve burocracia e provoca um amplo efeito social."


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