São Paulo, terça-feira, 01 de novembro de 2011 |
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OUTRAS IDEIAS FRANCISCO DAUDT - fdaudt2@gmail.com
De onde vem essa histeria?
A AMIGA pergunta: o que leva uma mulher a gritar, a chorar e a se descabelar diante de um Justin Bieber da vida? Histeria? Anos de treino de pensamento complexo quando se trata do cérebro produzem a primeira resposta automática: "Nunca é uma coisa só, mas a questão é ótima, não havia pensado nisso". Levo uns dias até produzir respostas (hipóteses). Que aparecem aqui grifadas. A primeira é histórica: nunca antes de Frank Sinatra houve esse tipo de manifestação. Se dura até hoje, é mais que um modismo, é uma alteração dos costumes. Está certo que mulheres desmaiavam em frente ao Lord Byron (ele unia fama e beleza ímpar), num tempo em que era moda desmaiar (nada difícil para quem usava aqueles espartilhos). Eram tempos de "ai, meus sais", que se referia a sais de amônia em vidrinhos que elas carregavam. Eram tão irritantes ao olfato que as despertavam de fato. Curioso: quanto mais da alta classe, menos desmaiavam. O que nos leva ao componente do inatingível. Ora, Byron lhes era atingível (a elas e aos rapazes, que também o apreciavam). Também houve epidemia de suicídios quando Rodolfo Valentino morreu. Um ato solitário, o que leva a outra hipótese: a manifestação de turba. Há a necessidade exibicionista de espectadores para o transtorno. E há as groupies, moças que seguem turnês de ídolos contabilizando o número daqueles para quem se entregaram sexualmente. Agora, sim, podemos considerar o componente erótico do processo. A histeria foi descrita por Freud como manifestação sintomática da repressão do desejo sexual: desmaios, paralisias e cegueiras eram comuns no século 19 e começo do século 20, como reação ao horror de ver os desejos aflorarem, majoritariamente entre as mulheres, assim como os desvarios atuais se repetem quase exclusivamente entre mulheres e gays, o que nos dá que é uma característica do feminino. Vamos então ao que elas dizem: que são apaixonadas por seus ídolos. Ora, a paixão é um estado em que a pessoa se envolve não com alguém, mas com a idealização de alguém. Some-se o ídolo (idealizável, dada sua inacessibilidade) com a sacralização do desejo que a paixão produz (é uma presença forte para que uma mulher não se confunda com uma prostituta) e você terá as condições para demonstrações de adoração, que adoçam as manifestações de tesão. Mas ainda falta a alteração dos costumes. Por que só após Sinatra, só no final dos anos 40? Minha hipótese está no clima do pós-guerra. Enquanto os maridos lutavam, mulheres ficaram sós, trabalharam, sustentaram suas casas, tiveram casos extraconjugais, ganharam independência e prerrogativas masculinas. Estavam em condições de demonstrar seus desejos e os demonstraram. A primeira revolução sexual foi o pós-guerra, não a pílula. FRANCISCO DAUDT, psicanalista e médico, é autor de "Onde Foi Que Eu Acertei?", entre outros livros Próximo Texto: Tudo em dois tempos - Pryscila Vieira Índice | Comunicar Erros |
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