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"O medo era sentir em casa o odor de caminhão de lixo"
Quando aquela caixa enorme
aterrissou na cozinha de casa,
toda embalada em papel Kraft,
tarde da noite, gelei. Encontrar
na jardineira uma minhoca
aqui, outra acolá, era bom. Sinal
de terra fértil. Mas a idéia de várias juntas, ao mesmo tempo,
intimidava. Depois da longa
viagem que fizeram, deviam estar estressadas, doidas para escapar. Melhor deixá-las se acalmar por uma noite.
No dia seguinte, ao tirar a colônia de minhocas do saco, algo
parecia errado. Eram poucas e
lentas. Quem sabe uma dose de
comida para restabelecer o ânimo? No início, poderiam receber só 300 ml de resíduos orgânicos por dia. E toma picar a
casca da banana, desfazer o saquinho do chá e esmigalhar a
casca do ovo. Trabalho demais
para quem, um dia antes, jogava tudo inteiro direto na lixeira.
Hoje, quase um mês depois, a
tarefa é quase tão natural quanto a separação do lixo seco. Vibro ao ver que estão mais gordinhas, "correndo" para se enterrar (elas são fotossensíveis...) e
que a família está aumentando.
O maior medo era sentir em
casa aquele odor de caminhão
de lixo. Mas não. Cheira a terra
molhada. Outro temor era que
o acúmulo de resíduos orgânicos atraísse vetores. Sequer
uma formiguinha apareceu.
Curiosa tem sido a reação à
novidade. Uns torcem o nariz e
fazem expressão de nojo. Outros insinuam que um dia darei
de cara com uma minhoca passeando pela casa. Já me perguntaram até se eu estava cevando iscas para pesca. E há
quem ofereça os resíduos da
própria casa para alimentá-las.
Sem falar nos desconhecidos
olhando estranho quando saio
coletando folha seca na praça...
O fato é que o condomínio
vertical de minhocas é um claro
exemplo da capacidade de
transformação do universo. Sinônimo de mau cheiro e doença, o lixo, quem diria, pode virar
um nutriente riquíssimo e começar tudo de novo.
(JF)
NA INTERNET
www.folha.com.br/082466
Veja infográfico animado
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