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INSPIRE RESPIRE TRANSPIRE
Sem sair do lugar
Três corredores testam esteira que, por preço de carro popular, simula percurso de maratonas pelo mundo
AMARÍLIS LAGE
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma maratona soma
42 quilômetros e 195
metros -mas é possível correr uma sem
sair do lugar. Essa é, pelo menos, a proposta da esteira E-750, que promete simular o
percurso de competições como
as maratonas de Nova York e de
Paris, reproduzindo as subidas
e descidas reais de cada prova.
Desenvolvida por uma empresa nacional, traz também simulações de seis percursos em São
Paulo, incluindo o da São Silvestre e de circuitos como o do
parque Ibirapuera.
Segundo a fabricante, o recurso é "eficiente para corredores profissionais e perfeito para
quem gosta de desafios". Será?
Ao ouvir a descrição, Luiz Bernabeu, 53, treinador da VO2
Clube de Corrida, pareceu curioso e cético. "Para quem treina na rua, usar esteira é complicado", disse ele, que topou testar o produto para a Folha.
A avaliação contou, ainda,
com a treinadora Adriana Argila, 44, e com o atleta Rafael
Santos, 23. Na sexta-feira passada, eles acompanharam a reportagem à 9ª Ihrsa-Fitness
Brasil, feira de negócios em
exercícios e bem-estar na qual
a esteira estava exposta.
"Um dos principais problemas de correr em esteira é a
monotonia", conta Rodrigo
Moraes, engenheiro de produtos da empresa. O novo recurso
busca tornar a atividade mais
atraente. São 30 opções de circuito: seis em cada cidade contemplada (Paris, Nova York,
Sydney, São Paulo e Tóquio).
Na tela, sensível ao toque, cada percurso aparece visto de cima, e o atleta é representado
por uma bolinha, que se desloca
à medida que a corrida avança.
Outro recurso que busca aproximar a experiência de uma
corrida de rua real é o sistema
de amortecimento do piso.
Uma vantagem das esteiras
sobre a corrida na rua é que o
impacto sobre a articulação do
joelho é menor nesse equipamento. Mas, segundo Moraes,
muitos corredores se queixam
de que as esteiras são "moles"
demais. Para atendê-los, o
equipamento tem três opções,
do piso mais macio ao duro.
Durante o exercício, é possível assistir TV na tela da própria esteira ou monitorar gráficos que registram a velocidade,
o pulso do atleta etc.
Além das simulações, o usuário também pode escolher alguns programas preestabelecidos -como o de montanhas, no
qual a esteira fica mais inclinada e menos rápida- ou personalizar a corrida.
A aceleração e a inclinação
podem ser reguladas na tela ou
no apoio lateral para as mãos: a
esteira atinge um aclive de 15%
e um declive de 5% e chega a 25
km/h -velocidade alcançada
por um maratonista de alto nível, segundo Moraes.
Altos e baixos
Com 17 São Silvestres seguidas no currículo, Bernabeu avaliou a simulação da prova. A
surpresa começou na "av. Paulista". De plana, a esteira passou para uma inclinação de 2%.
"É uma informação nova, porque a impressão é a de que é um
trajeto reto", diz.
Ao chegar à "rua da Consolação", a esteira simulou a descida. Para Bernabeu, o declive, de
2%, é "muito diferente da realidade da rua". Mas o principal
problema, diz, é a duração: a esteira logo voltou a ficar plana,
embora a tela ainda indicasse
um trecho que é inclinado.
"Não dá para identificar o
percurso claramente", afirma
Adriana Argila. "A descida é
muito suave. O que mais machuca o joelho é a descida -tem
de ser mais conservador mesmo. Mas, na rua, ela existe."
O corredor Rafael Santos,
que até então só havia corrido
na rua e em pistas de corrida,
também disse que não conseguiu perceber muito bem as inclinações da esteira.
Segundo Rodrigo Moraes, o
programa é baseado em dados
obtidos via satélite, que são
adaptados para as limitações da
máquina. "A gente normaliza
para que a pessoa tenha a sensação de descida, mas sem prejuízos à saúde", afirma.
A variação no sistema de
amortecimento também não
foi significativamente perceptível para os três. A avaliação,
porém, foi prejudicada pelo fato de o aparelho estar sobre
uma plataforma no estande, o
que amenizava o impacto.
Para Adriana Argila, que
também é personal trainer, a
vantagem do equipamento é a
motivação. "Ela parece ser
muito boa para um personal
trainer devido à grande variedade de percursos. Muitos alunos não gostam de se exercitar
na esteira porque se cansam de
fazer a mesma coisa todos os
dias", conta.
Luiz Bernabeu acha que o
aparelho é uma opção para animar o treino quando não é possível correr na rua, seja pela
chuva, seja pela falta de tempo.
Mas a motivação, afirma, depende do percurso escolhido.
Ele, que subiu na esteira achando que a parte mais divertida
seria a das maratonas, mudou
de opinião. "Fazer uma corrida
longa assim na esteira é monótono. Por mais que ela ofereça
opções que nos distraiam, quatro horas é muito tempo. Já o
circuito da USP é muito interessante. Dá para fazer em uma
hora e não cansa."
Preço
A E-750 é mais cara do que
alguns carros populares: o preço sugerido é R$ 29.400.
Para Adriana, Luiz e Rafael,
um equipamento com esse preço poderia trazer alguns detalhes que se traduzem em conforto, como um ventilador direcionado para o rosto, mais suportes para garrafas d'água e
um local onde colocar as chaves
e o celular, por exemplo. "É
uma esteira que tem tantas coisas e essas, que são simples, não
tem", comentou Adriana.
Rodrigo Moraes, representante da empresa, explica que o
porta-trecos foi retirado devido
ao tamanho do painel, mas que
a previsão é que ele seja incluído em novos projetos. Quanto
ao ventilador, afirma que ele
não foi instalado porque o modelo, profissional, é voltado para ambientes que já costumam
ser climatizados, como academias e clubes.
Mas o que mais faz falta,
brinca Bernabeu, é a paisagem.
"O mais legal, para a maioria
dos corredores, é que a gente
acaba conhecendo muitos países por conta das corridas. Na
esteira, você perde tudo isso.
Nunca conseguirão simular a
sensação de correr embaixo do
Arco do Triunfo, em Paris."
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