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FUTEBOL
Despedida ou licença
TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA
A pós prolongada licença, retorno com saudades ao meu
trabalho. Parafraseando os jogadores, estou fora de ritmo, sem o
tempo da palavra (bola).
Dois meses depois, as imagens
da brilhante conquista do pentacampeonato continuam vivas na
minha memória. Agora mais nítidas e compreensíveis.
Felipão realizou excelente trabalho e deveria continuar. Compreendo seus motivos pessoais,
emocionais e racionais. A vida
tem outros prazeres. Não é fácil
também conviver com as críticas,
mesmo construtivas.
O ser humano adora ser elogiado e bajulado. Além disso, após a
festa e a vitória, vem o fastio e a
sensação de que já se fez tudo. Aí,
surgem e renascem os problemas.
Como Felipão é mais emocional
do que racional, pressinto que logo estará de volta. Parece mais licença do que despedida.
Não se pode também supervalorizar a atuação do treinador,
principalmente a da "família Scolari". No Mundial, havia outras
famílias unidas, determinadas,
bem comportadas, com muita
garra, comandada por outros Felipões. Porém nenhuma tinha três
atacantes excepcionais como os
da seleção brasileira.
Para substituir o treinador,
além do Parreira, há outros bons
no futebol brasileiro. Nos últimos
anos, alguns evoluíram bastante,
dentro e fora de campo. Assimilaram as críticas. Mudaram o comportamento. Ficaram mais humildes e competentes.
A principal qualidade de um
treinador de futebol é escalar os
melhores jogadores e dar a eles
condições para fazerem tudo que
sabem. Foi o que Felipão fez.
O Brasil só ganharia a Copa do
Mundo se os principais jogadores
(Ronaldo, Rivaldo, Roberto Carlos e Cafu) jogassem como nos
clubes ou como antes, caso de Ronaldo. Não foi fácil escalá-los.
Havia muitos problemas.
Mais do que isso. Em vez de colocar um armador e dois atacantes como faria a maioria dos técnicos, Felipão colocou Ronaldinho Gaúcho de um lado, Rivaldo
de outro e Ronaldo fixo na frente.
Isso confundiu a marcação. Se a
seleção tivesse apenas um jogador
para articular as jogadas ofensivas, seria facilmente marcado.
Felipão gostou tanto de atacar
que escalou o meia-atacante Juninho ao lado de Gilberto Silva.
Aí foi seu grande erro. Existia um
grande vazio no meio-campo. Os
adversários tocavam a bola nesse
setor e chegavam com facilidade
próximo à área brasileira. Com a
entrada do Kleberson -poderia
ser Ricardinho-, houve uma
grande evolução da equipe.
Após a conquista, Felipão declarou que se inspirou na seleção
argentina. Juninho seria o Verón.
Nada a ver. Verón é um típico armador. Juninho é um meia atacante, como Ronaldinho Gaúcho
e Rivaldo. Aliás, um dos erros do
Bielsa, técnico argentino, foi escalar o meia ofensivo Aimar no lugar do Verón (fora de forma). Aimar deveria ter entrado no lugar
de um dos três atacantes.
A seleção brasileira derrubou
vários mitos: o de que o futebol
brasileiro não sabe jogar com três
zagueiros, pois Edmílson jogou de
zagueiro e de volante; que um
bom time precisa congestionar o
meio-campo e valorizar a posse
de bola -havia poucos jogadores
nesse setor; e que numa Copa deve se jogar com cautela para não
levar o primeiro gol. O Brasil
atuou sempre no ataque, levou o
primeiro gol da Turquia e da Inglaterra, mas venceu.
Os fatos não significam que Felipão esteve sempre certo; mostram apenas que existem várias
maneiras de se ganhar. A filosofia
do time de 2002 era oposta à de
1994. Mais importante do que a
idéia e a estratégia é a execução
do que se propõe.
Salve, Ronaldinho
Logo após o gol de falta do Ronaldinho Gaúcho contra a Inglaterra, tinha certeza de que ele quis
cruzar e errou o chute. Como não
vi a repetição do gol no estádio
-para o comentarista essa é a
única vantagem de se ver o jogo
na TV-, apostava no fato de que
o jogador correu olhando para a
bola e não para o goleiro.
Depois de ver no Brasil o lance
várias vezes, reconheço meu erro.
Ele correu com a cabeça baixa para despistar. Já sabia que iria chutar direto. Por isso tocou na bola
de chapa, utilizando toda a parte
interna do pé.
Dessa forma é mais fácil atingir
um determinado alvo. Se Ronaldinho quisesse chutar em curva,
ele tocaria na bola com a parte interna superior do pé, a saliência
onde se forma o joanete.
O grande craque é aquele que
surpreende e engana o adversário, o torcedor e o comentarista.
Salve, Ronaldinho.
E-mail
tostao.folha@uol.com.br
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