|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
céu cinza
A 33 dias, Pequim só não controla o ar
Em entrevista, porta-voz dos Jogos mostra convicção de que Olimpíada será tranqüila, mas admite receio com poluição
"Todos devem pagar o preço quando se faz algo que infringe a lei de um país", diz chinesa, sobre eventuais protestos de visitantes
Teh Eng Koon - 9.jun.2008/France Presse
|
|
Árvore plantada no Parque Olímpico, parte do pacote do governo chinês para tentar reduzir o nível de poluição da capital chinesa
RAUL JUSTE LORES
DE PEQUIM
A poluição do ar é o maior desafio que o comitê organizador
enfrenta na preparação para os
Jogos Olímpicos de Pequim.
Na sua primeira entrevista
exclusiva para a imprensa brasileira, a diretora de comunicações e porta-voz do comitê organizador, Wang Hui, afirmou
à Folha que a qualidade do ar
estará muito melhor durante
os Jogos, mas não escondeu o
receio. A abertura da Olimpíada acontece em 8 de agosto.
Ela diz que turistas e atletas
terão que obedecer às leis da
China, mas não é clara sobre as
punições aos visitantes que fizerem qualquer manifestação a
favor dos direitos humanos ou
da independência do Tibete.
Quanto ao nacionalismo do
país, com longo histórico de
protestos violentos contra rivais, diz que "está sob controle"
e que o governo vai garantir
que todos sejam bem-vindos.
Ex-apresentadora do telejornal da emissora Beijing TV e diretora do Escritório de Informação da capital, Wang não pratica nenhum esporte, mas
gosta de assistir a ginástica, patinação e tênis de mesa.
FOLHA - A apenas um mês da Olimpíada, Pequim continua tão poluída
como sempre, apesar de todos os investimentos. Onde Pequim falhou?
WANG HUI - Quando levanto de
manhã, algumas vezes me pergunto por que o tempo continua o mesmo [passa a mão no
rosto, como se estivesse limpando uma lágrima e faz gesto
de choro]. Mas o clima de Pequim é o mesmo do Sul da China, então esse céu escuro não é
completamente causado pela
poluição, a qualidade do ar pode melhorar. Não há outra cidade no mundo que tenha gasto
tanto, que tenha feito tanto para lidar com a poluição como
Pequim. Tiramos fábricas do
meio da cidade, fechamos outras... Gastamos muito dinheiro e pelo menos dez anos nisso.
FOLHA - E se não melhorar?
WANG - Nos próximos dias, Pequim tomará medidas extremas para melhorar o ar. Teremos o rodízio de placas com final par e final ímpar, que vai tirar mais da metade da frota das
ruas. Fecharemos todas as
obras, e prédios em construção
serão paralisados. E várias Províncias vizinhas, como Shanxi,
Tianjin, Hebei, Shandong e a
Mongólia Interior, vão cooperar e fazer o mesmo. Estamos
fazendo o que é possível, agora
só resta esperar que melhore de
uma vez [aponta para o céu].
FOLHA - Qual é a maior preocupação do comitê organizador agora?
WANG - Agora é hora de se certificar de que todos os detalhes
estejam verificados e perfeitos.
E o clima com certeza é uma
grande preocupação.
FOLHA - Há alguma campanha para evitar que atletas de países com
rivalidade histórica com a China, como o Japão, sejam hostilizados ou
vaiados pelos chineses nos estádios?
WANG - Nós investimos nesse
tipo de educação nos últimos
dois anos para tentar evitar
sentimentos nacionalistas. Suponho que atletas de qualquer
país serão bem-vindos por nossos cidadãos. É responsabilidade do governo chinês ensinar
os cidadãos a se comportarem e
a mudarem seus maus hábitos.
FOLHA - Mas o nacionalismo é forte na China, até com campanhas
contra outros países...
WANG - O nacionalismo está
sob controle.
FOLHA - O que pode acontecer a
um turista que decida fazer uma
manifestação, andar com um cartaz
ou uma camiseta pró direitos humanos na China ou pela independência
do Tibete? Mesmo que não seja
num estádio, pode ser preso?
WANG - A Olimpíada é uma
festa que todo mundo celebra.
As pessoas não deveriam vê-la
como um palco para protestos
políticos. Eu vi, por exemplo,
que extremistas foram presos
pela polícia na Eurocopa, que
terminou agora. A China tem
suas leis, e nós devemos recorrer a elas quando as coisas
acontecem. Não sou advogada
nem entendo de leis, então não
sei o que pode resultar quando
algum protesto ocorrer.
Mas acho que todos devem
pagar o preço quando se faz algo que infringe a lei de um país.
FOLHA - A senhora não acha que os
vídeos e os cartazes ensinando os
chineses a torcer e que gestos seguir
tiram a espontaneidade do público?
WANG - Não vamos impedir a
reação espontânea do público.
A idéia de produzir o vídeo foi
mais para servir de guia em como criar uma atmosfera melhor e mais alegre durante os
Jogos. Não queríamos que o
público ficasse muito quietinho
ou silencioso. Mas não é uma
ordem seguir as palmas e os
braços estendidos [gesticula e
mostra os gestos do vídeo].
Quando Yao Ming fizer uma
cesta ou os brasileiros marcarem um gol no futebol, cada um
vai celebrar do seu jeito.
FOLHA - Os chineses ainda praticam pouco esporte. O que fazer para
que o cidadão chinês comum aprecie vários esportes dos quais não
têm a menor idéia do que são?
WANG - O governo chinês fez
grandes esforços para incentivar o público nos esportes.
Esportes não são como uma
pirâmide onde o futebol está no
topo. Há vários esportes importantes de que os chineses gostam. Nós organizamos 46 competições como teste e os estádios estavam cheios de espectadores. Os chineses vão aos estádios como uma oportunidade
para contribuir com o fortalecimento da Olimpíada.
FOLHA - No ano passado, atletas
cubanos desertaram de sua delegação no meio do Pan-Americano do
Rio. O que a China fará caso atletas,
por exemplo, da Coréia do Norte,
decidirem desertar em Pequim?
WANG - Alguns atletas podem
tratar a Olimpíada como uma
oportunidade para realizar
seus pedidos. Mas a Carta
Olímpica estipula como lidar
com essas coisas. O comitê organizador irá discutir primeiro
com o Comitê Olímpico Internacional e tomar as decisões de
acordo com o que a legislação
olímpica estipular.
Queria aproveitar a ocasião
para dizer aos atletas que a
Olimpíada é um palco para eles
demonstrarem seus talentos.
Por favor, tratem com carinho a
oportunidade de participar.
FOLHA - Barcelona usou a Olimpíada para se renovar, melhorar sua infra-estrutura e mudar sua imagem
no mundo. Qual será o legado dos
Jogos de Pequim para os chineses?
WANG - Eu acho que os Jogos
de Pequim farão ainda mais para seus cidadãos que as Olimpíadas anteriores. A maior parte dos ginásios e estádios foi
construída em bairros e em
universidades e será usada
após os Jogos pelos cidadãos.
O metrô de Pequim chegará a
200 quilômetros quando a
Olimpíada começar. Tinha apenas cem quilômetros antes, então dobrou. E as pessoas continuam pagando apenas 2 yuans
para andar de metrô (R$ 0,50).
FOLHA - Pequim é a primeira cidade do mundo em desenvolvimento
a abrigar a Olimpíada desde Cidade
do México-1968. O que sugere para
o Rio vencer a disputa por 2016?
WANG - Desejo boa sorte. Não
foi fácil para Pequim conseguir
abrigar a Olimpíada. Nós nos
candidatamos duas vezes e começamos a pensar em medalhas de ouro e em ser a cidade-sede dos Jogos há muito tempo.
China e Brasil compartilham
muitas similaridades e um
grande amor pelos esportes. Os
brasileiros são muito bons no
futebol, estão no topo do mundo, o que deixa os chineses com
muita inveja. Além do espírito
olímpico, é bom ter apoio popular: 97% dos chineses, 1,3 bilhão de pessoas, apóiam a realização da Olimpíada de Pequim.
Texto Anterior: Painel FC Próximo Texto: Frase Índice
|