|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
FUTEBOL
Setenta por cento da seleção do país de Saddam Hussein iria para a guerra
Atletas iraquianos trocam bola e chuteira pela farda
JOÃO CARLOS ASSUMPÇÃO
DA REPORTAGEM LOCAL
O futebol iraquiano continua vivo, mas talvez esteja com os dias
contados. Se a guerra contra EUA
e Reino Unido começar, a seleção
do país pode ser esfacelada.
Dos 20 jogadores convocados
para defender a equipe, 14 começam a se preparar para participar
do iminente conflito no Iraque.
Onze deles fazem parte do Exército iraquiano, quatro dos quais
são integrantes das Forças Aéreas
de Saddam Hussein. Outros três
atuarão como escudos humanos e
ficarão em um dos 60 locais estratégicos determinados por Abdelrazak Hashimi, militar que supervisiona a operação.
""É uma pena, porque o futebol é
uma das maiores paixões do povo
iraquiano. Se começar a guerra,
que não está sendo provocada pela nossa gente, todo o país e todos
os setores vão sofrer, inclusive o
esporte", disse à Folha, por e-mail, Nashat Naser, supervisor da
Associação Iraquiana de Futebol.
A entidade, que tem como presidente Udai Hussein, filho de
Saddam, funciona num prédio
em Bagdá, na rua do Estado Palestino, onde também fica a sede do
Comitê Olímpico Iraquiano. E é lá
que Naser comandará uma reunião nesta semana para ver que
rumo o futebol do país tomará
nas semanas seguintes.
""Tudo depende do que vai
acontecer. Seria um erro invadirem o Iraque, mas, se formos atacados, vamos seguir nosso líder e
defender o país", afirmou Naser.
""E aí o futebol deve parar, pelo
menos enquanto durar a guerra."
Mesmo se ela não tiver início
agora, no entanto, o dirigente diz
que afetado o esporte já foi.
""Tínhamos dois amistosos programados para março e abril, mas
tivemos que cancelar. A Fifa determinou que não podemos receber jogos internacionais porque o
clima não está favorável. Só que se
não está favorável não é por culpa
nossa. O triste é que quem arca
com as consequências, mais uma
vez, é o povo iraquiano."
E penando ele já está. O embargo da ONU, iniciado depois da invasão do Kuait, em 1990, serviu
também para enfraquecer o futebol do país. ""Todos os setores foram afetados, e com o futebol não
seria diferente. Material esportivo, por exemplo, muitos times
não tinham. A maioria jogava como podia", comentou.
O intercâmbio com o exterior
também era mínimo. ""Que seleção iria jogar contra a nossa?"
Segundo o supervisor da federação iraquiana, foi a paixão do povo pelo esporte que manteve o futebol vivo. ""Em muitos jogos havia 50 mil torcedores no estádio.
O futebol é uma das poucas opções de lazer, mas uma das preferidas de nosso país."
A duras penas, o campeonato
local, que chegou a reunir 20 equipes, continuou a ser disputado. E
o último, pelo menos de acordo
com a federação, teve média de
público próxima dos 30 mil torcedores por jogo -como comparação, a média do último Brasileiro
não atingiu 15 mil por partida.
Mas em 2003 a incerteza predomina. ""Não tenho os números em
mãos, mas com certeza de 70% a
80% dos jogadores devem pegar
em armas, defender o país se formos atacados. Não dá para continuar com uma vida normal."
E, segundo o dirigente, quem
não pegar em armas pode ser usado como escudo humano. ""Se um
ídolo for atingido a revolta será
ainda maior. Mostraremos para o
mundo, e não só o islâmico, o que
querem fazer com a gente."
Texto Anterior: Segunda divisão vira desculpa para derrota Próximo Texto: Filho de Saddam é acusado de agredir atletas Índice
|