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FUTEBOL
Sonho dominical
AQUILES RIQUE REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA
O futebol brasileiro um dia
caiu da cama e acordou falido. Enquanto persistiu a farra
com o dinheiro vindo de empresas que pareciam desconhecer a
realidade do nosso esporte mais
popular, os dirigentes fartaram-se
com o dinheiro dos clubes e fizeram barbaridades com a grana
alheia.
O dinheiro, que deveria servir
para tornar melhor não só o time
de futebol -como também o esporte amador dos clubes escolhidos para ostentarem a logomarca
dos donos do dinheiro-, sumiu.
Escafedeu-se em contas bancárias
abertas aqui ou em algum paraíso fiscal, em nome de "laranjas"
que acobertavam a identidade
dos cartolas de colarinho branco e
sujo. A grana encolheu, garfada
que foi pelas comissões malandramente ilegais, subtraída da
compra e da venda estapafúrdias
de atletas. Só que a mina dos patrocínios milionários secou.
Desde a gestão do Zico, no governo Collor, passando pela do
Pelé, no governo FHC, temos visto
movimentos feitos na direção da
moralização do futebol. Leis e
CPIs foram criadas, mas deformadas pela famigerada "bancada da bola" no Congresso. Boas
intenções desabaram diante dos
interesses daqueles que não conseguem se imaginar vivendo longe das fartas tetas das federações
e da confederação, que espalham
negociatas e mamatas aos quatro
ventos. Aos poucos os cartolas
transformaram a nossa paixão
em um negócio sórdido, onde o
que menos interessa é o futebol.
Isso obrigou alguns dirigentes a
se refugiarem em um mandato
parlamentar, às custas do voto
inocente de torcedores fanáticos,
visando única e exclusivamente
uma imunidade que os proteja de
possíveis investidas da Justiça.
Até hoje os corruptos tiveram êxito nos seus esforços para driblarem a moralização e os nossos
olhares incrédulos. Até quando?
Recentemente foi enviado à Câmara o projeto de lei elaborado
pelo ministro do Esporte, Caio
Carvalho, que tem como objetivo
recolocar o futebol dentro do
campo da decência e da legalidade. Na última terça, tomaram
posse em Brasília os 18 membros
que formam o Conselho Nacional
dos Esportes. Recentemente surgiu também o Código de Defesa
do Torcedor, que reza direitos óbvios, mas nem por isso assegurados a nós, cidadãos, como garantir a quem levar a família ao estádio, o direito à segurança e conforto, para que todos possamos
usufruir em paz o direito sagrado
ao lazer. O esporte precisa ser protegido, por uma legislação moderna e abrangente, da ganância
das velhas raposas escondidas em
seus castelos de cartas. Sem leis,
ganha o corrupto impune. Com
leis, ganhamos nós, torcedores.
Enquanto isso, forçados pela situação de penúria que eles mesmos causaram, os dirigentes fazem cara de que não é com eles e
reduzem as folhas de pagamento
dos times. Caso típico do chamado mal que vem para o bem. Sem
os salários astronômicos pagos às
grandes estrelas, os times retomam uma prática tão antiga
quanto salutar, voltando-se para
a prata da casa: aqueles meninos
que dão a vida para demonstrar
seu amor pela camisa que vestem.
Que vão na bola como quem vai
num sanduíche de mortadela.
Que dão o sangue pela vitória.
É por essa moçada jovem e
inexperiente, mas com muita disposição e preparo físico, que nós
cantaremos nossos hinos. Esses
atletas quase sem barba, e que
ainda chamam o treinador de
"professor" -aliás, esta forma de
tratamento é de um ridículo sem
fim-, poderão fazer com que alcancemos o céu, conquistando o
título ou que desçamos ao fundo
do poço da tristeza, reservado aos
que lutam para não ficar entre os
últimos, aqueles que "teoricamente" (digo "teoricamente"
pois, infelizmente, a mesa sempre
pode ser virada) descerão para a
segunda divisão. É neles que depositamos nossa esperança.
Neste segundo domingo de Brasileiro, os torcedores dos garotos
do Flamengo, do Corinthians, do
Vasco, do Santos, do Paysandu e
de outras equipes armadas a partir de jovens valores, continuarão
a sentir essa mudança. Eles perceberão que têm diante dos olhos
um futebol diferente, pentacampeão mundial, sim, só que com a
cara do verdadeiro futebol brasileiro, aquele que acostumamos a
deixar que nos encante.
Torço para que a lei entre logo
em vigor, para que alguns cartolas sejam presos e para que logo
mais os meninos do meu time ganhem jogando tão bonito como
um dia de sol.
Aquiles Rique Reis, 54, músico, integrante do MPB4 e flamenguista de coração, lançará neste ano o livro de contos
"Contando e cantando Histórias e canções para todas as idades", que trará encartado o CD "Toda canção é de ninar".
Tostão, em férias, volta a escrever neste
espaço em 4 de setembro.
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