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ATLETISMO
Após périplo, atleta da faixa de Gaza deseja ver a filha
Último nos 5.000 m, Al Masri só foi a Pequim após apelo em jornal
Beneficiado pela política chinesa, ele ganhou material e até alimentação, mas
agora quer voltar à sua terra
para conhecer recém-nascida
DO ENVIADO A PEQUIM
A lista de tarefas de Nader Al
Masri, na chegada a Pequim,
era composta por três itens. Na
ordem, achar sapatilhas baratas para disputar os 5.000 m,
largar na prova pela qual tanto
batalhou e pegar o avião para
conhecer a filha, Raghed, que
está em casa. Na faixa de Gaza.
O primeiro foi mais fácil do
que previa. Incorporado pela
força-tarefa chinesa de apoio a
países e territórios que lhe são
politicamente simpáticos, Al
Masri ficou 30 dias num campo
de treino com direito a orientação de técnicos locais, alimentação balanceada e kit de materiais. Incluindo sapatilhas.
Que calçou ontem. Al Masri,
único atleta da faixa de Gaza
nos Jogos de Pequim, participou da primeira bateria eliminatória para os 5.000 m, no Ninho de Pássaro. E foi notado. Se
não pelas sapatilhas, por sua
atuação. Último colocado na
sua bateria, cruzou a linha de
chegada 30s atrás do vencedor.
Aplaudido por todo o estádio.
"Isso se deve à falta de ritmo.
Fica difícil competir com esses
campeões. Consegui manter o
ritmo até 2.000 m, mas a falta
de competições me derrubou."
Agora, para se reunir à família e segurar Raghed pela primeira vez, iniciará o retorno da
mais conturbada viagem da sua
vida. "Ainda não acredito que
saí de Gaza. Hoje, você contorna meio mundo em 14 horas.
Mas, para sair de Gaza, precisa
de semanas", disse Al Masri, 28.
Desde Atlanta-96, a Palestina participa dos Jogos com delegação própria, e Israel nunca
impôs barreiras para a saída
dos olímpicos da faixa de Gaza.
Mas a história mudou após a
tomada de poder no território
pelo grupo radical islâmico Hamas, em junho de 2007. A última prova de Al Masri havia sido
nos Jogos Asiáticos-06, no Qatar. Terminou em oitavo.
Desde então, treinava em estradas de cascalho, muitas vezes ao som explosões -um foguete, por engano, acertou sua
casa. Al Masri ainda lutou para
ir a Pequim, a ponto de, em
abril, enviar apelo ao "Yedioth
Ahronoth", maior jornal israelense. O bilhete foi publicado:
"Imploro para que não arruinem meu sonho olímpico. Tenho 28 anos e há dez estou correndo por isso. Por favor, não
tenho nada a ver com política".
Funcionou. Dias depois, teve
a autorização. "Agora vou ver
minha filha que nasceu quando
estava aqui... Vou treinar mais.
O que fiz não foi o suficiente para a Palestina."
(FÁBIO SEIXAS)
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