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FUTEBOL
Equilíbrio e imaginação
TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA
Após o Mundial de 2002, o
Brasil não fez uma única
brilhante partida sob o comando
do Parreira. Nos 13 jogos amistosos e pelas eliminatórias, a seleção
teve cinco vitórias, duas derrotas
e seis empates, sendo três por 0 a
0. Isso é preocupante.
Não concordo que o Brasil jogou mal neste e em outros amistosos porque os atletas não se empenharam. Time que atua mal nos
amistosos geralmente não vai
bem nas partidas oficiais, como
nos quatro jogos pelas eliminatórias. O Brasil não venceu a Copa-2002 porque os jogadores atuaram com mais vontade do que o
habitual, e sim, principalmente,
porque os craques se recuperaram
na hora certa. A eliminação precoce e surpreendente dos principais rivais facilitou a conquista.
Após o jogo contra a Irlanda,
Parreira disse pela milésima vez
que o rival tinha oito jogadores
atrás da linha da bola. A maioria
das equipes atua dessa forma. Se
o Brasil marcasse por pressão, pelo menos durante parte do jogo,
recuperaria mais a bola e encontraria mais espaços na defesa.
No primeiro tempo, a Irlanda
marcou mais na frente, teve mais
a posse de bola e criou mais chances de gol. No segundo, eles cansaram, recuaram e formaram duas
linhas de quatro. Isso facilitou para o Brasil, que trocou mais passes
e criou mais oportunidades de
gol. Tenho muito mais receio das
equipes que não recuam tanto e
que marcam por pressão, já que
os armadores brasileiros têm dificuldades de sair dessa marcação.
O fato de o Brasil não ter sofrido
gol é uma ilusão. Roque Júnior estava muito lento, chegou atrasado várias vezes e foi driblado com
facilidade pelos irlandeses, que
não têm nenhuma habilidade.
Lúcio atuou bem.
Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho e
Kaká insistiram demais nas tabelas pelo meio. O mesmo acontecia
com Rivaldo. A equipe com dois
meias ofensivos e um único atacante fixo, que deu tanto certo na
Copa de 2002, ainda não funcionou bem. O Cruzeiro vive o mesmo problema com Alex, Rivaldo e
um centroavante (Guilherme).
Se os laterais brasileiros forem
bem marcados, não há jogadas
pelas pontas. Além disso, Cafu e
Roberto Carlos não são alas. São
laterais e não podem deixar os
dois zagueiros desprotegidos.
Os dois armadores pelos lados
(Zé Roberto e Kleberson ou Júlio
Baptista) são mais volantes do
que meias, ao contrário do que
diz o Parreira. Os dois têm de proteger os zagueiros e chegam pouco à frente. O time está com dois
setores isolados. Os três do meio-campo não se misturam nem trocam de posição com os três mais
adiantados. Isso foi evidente nas
eliminatórias, principalmente
contra o Peru.
Falta um jogador que acabe
com essa divisão burocrática, que
não tenha uma única função, que
seja mais imprevisível e que tenha
mobilidade, velocidade e criatividade para defender e atacar. Esse
jogador poderia ser o Robinho, no
lugar do Zé Roberto.
Zé Roberto é um armador habilidoso, tem mobilidade e velocidade para avançar e recuar, mas
se tornou muito burocrático. O
futebol pragmático e o rigor tático
dos europeus ajudam em algumas coisas e atrapalham em outras. Do lado direito, Juninho Pernambucano ou Renato -é mais
criativo do que Kleberson ou Júlio
Baptista.
Parreira não afirmou, mas fiquei com a impressão, pelas suas
entrevistas, que Kaká será o titular contra o Paraguai, no lugar do
Rivaldo. Se Kaká tivesse brilhado
nesse jogo, seria mais certo. No
Cruzeiro, Rivaldo poderá voltar a
jogar bem.
Parreira tem razão ao dizer que
precisa formar um e não dois times. Técnico que troca demais de
jogadores e de tática fica perdido.
Porém, se o técnico tivesse experimentado alguns jogadores, um ou
dois de cada vez, desde o primeiro
jogo após o Mundial, o time manteria o conjunto da Copa e o técnico definiria melhor o elenco e
alguns titulares.
Como as eliminatórias vão terminar perto da Copa e o Parreira
não vai fazer mais experiências, a
equipe e o elenco já estão praticamente escolhidos para o Mundial
de 2006. Serão quase os mesmo de
2002. Isso é perigoso.
O equilíbrio e a racionalidade
são as principais virtudes e deficiências do Parreira. Técnico inventor, confuso e facilmente influenciável pelas críticas é um desastre. Parreira não se ilude e
nem se arrisca. Tudo é planejado.
Porém, as vezes, é preciso imaginar e pular etapas. "O olho vê, a
lembrança revê, e a imaginação
transvê. É preciso transver o mundo." (Manoel de Barros)
E-mail
tostao.folha@uol.com.br
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