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FUTEBOL
Até quando
GUSTAVO VIEIRA DE OLIVEIRA
ESPECIAL PARA A FOLHA
"O futebol não é praticado apenas entre as quatro linhas." Por mais que não
queiramos aceitar, essa realidade
teima em se fazer presente. O que
provoca incômodos.
No Brasil, consideramo-nos
"ex-pertos" quando o assunto é o
futebol dentro das quatro linhas.
Mas também temos o legítimo direito de nos considerarmos com a
mesma qualidade quando estão
em pauta assuntos extracampo.
Dificilmente em outro lugar
qualquer do "Planeta Bola" se
discute, se comente, se viva com
tamanha intensidade os fatos de
bastidores desse esporte como em
terras pentacampeãs. Isso já faz
parte da vida do torcedor brasileiro. Somos letrados no assunto. E o
tema está, atualmente, tão intimamente ligado a nós que a emoção de uma final de campeonato
equivale à expectativa de saber se
ela vai realmente acontecer.
Esse é nosso futebol: surpresas e
emoções antes mesmo de o torneio começar ou depois de ele estar terminado. Está enganado
quem imagina que o torcedor
desconhece essa realidade.
Já foi a época em que o frequentador de arquibancada ignorava
o assunto, por entender que em
nada lhe devia conta ou por se satisfazer com a partida ganha.
Tempos passados.
Hoje, não só conhece do assunto
como evolui no pensamento.
Avança no raciocínio. Passa a
não entender quando se dá conta
de que, apesar de viver num país
democrático, não encontra remédio, dentro das instituições oficiais, para o problema que aflige o
esporte que tanto ama. Não entra
na sua cabeça como a moral pode
ser afrontada sem que ele possa,
democraticamente, exigir ao menos moralidade.
E tem razão, nosso personagem,
em se sentir como ofendido-impotente-desamparado. A estrutura
político-administrativa do futebol é um dos últimos ranchos autoritários que sobreviveram à redemocratização do país. Sua rigidez é diretamente proporcional à
popularidade que possui, porém
com repercussões diversas.
Na semana que passou, tivemos
a oportunidade de acompanhar
mais alguns atos da tragédia. A
sequência de liminares judiciais,
cada qual incluindo uma equipe
na primeira divisão do Brasileiro,
mais a manifestação de vontade
de outros clubes em seguir o mesmo caminho, culminou com a
concessão de medida cautelar no
Superior Tribunal de Justiça, impetrada pela CBF, cassando todas
as liminares e, provisoriamente,
estabelecendo a paz.
Não pretendo discutir o mérito
da questão, o leitor não merece
assunto tão chato. Mas observe
mais à superfície, ao princípio.
O recurso à Justiça comum é desinteressante para todas as partes: o clube se arrisca a ser punido
pela Fifa, a CBF tem sua autoridade contestada e vê ameaçada a
organização de seus torneios. Para atletas, torcedores e patrocinadores, o prejuízo é ainda maior,
pois em nada contribuíram para
a existência do imbróglio. Para
todos, a angústia de ver a lambança feita. E qual a razão do recurso ao Judiciário, se a Constituição firma que, para assuntos
de disciplina e competição esportiva, o foro correto é a Justiça desportiva? Falta de credibilidade.
Nenhum poder é exercido legitimamente se não contiver alguns
elementos, entre eles credibilidade, principalmente quando exerce função judicante. Mesmo que
estejam legitimamente instituídos e constituídos, sem confiança
na idoneidade e na transparência
das decisões, não se terá Justiça.
Então que se busque a Justiça onde ela exista, no Judiciário.
Este é o cerne da questão. Por
sua história, suspeitas de falcatruas e falta de critérios, enfim,
ausência total de credibilidade,
formou-se o senso comum de que
tudo que venha da rua da Alfândega, seja Justiça desportiva ou
CBF, é feito com sacanagem, em
benefícios de interesses pessoais,
de forma a pôr no torcedor um
belo nariz arredondado e vermelho. E o que é pior: é provável que
esse senso esteja correto. E não é
de hoje. Essa é nossa realidade.
Eu me questiono até quando o
brasileiro terá orgulho, por fora,
de ter melhor futebol do mundo,
mas se remoer de vergonha por
dentro, por torcer para esse verdadeiro "futebol-do-pau-oco".
A esperança tem novo nome:
Código de Defesa do Torcedor,
cujo texto do projeto de lei é fruto
da reunião de representantes dos
mais variados órgãos ligados ao
esporte. Ele está disponível no site
do Ministério do Esporte para críticas e sugestões. É dever do torcedor participar!
Gustavo Vieira de Oliveira, 25, é advogado e vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo (IBDD).
Tostão, em férias, volta a escrever neste
espaço em 4 de setembro.
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