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FUTEBOL
O básico e o extra
TOSTÃO
COLUNISTA DA FOLHA
A ntes do jogo final contra os
Estados Unidos, Renê Simões disse que as americanas são
melhores no básico, e as brasileiras, no extra.
O Brasil atuou muito bem, melhor do que se esperava e perdeu.
A história da partida foi parecida
com a da primeira fase e com outras derrotas para as americanas.
Faltou fazer melhor o básico.
O básico são os fundamentos
técnicos (o Brasil finalizou mal),
as jogadas ensaiadas, a confiança, a capacidade física, a concentração, a ausência de erros nos
momentos decisivos e outras coisas. A técnica coletiva é tudo isso.
Algumas jogadoras brasileiras
têm muito mais técnica individual do que as americanas, mas a
técnica coletiva dos Estados Unidos é superior à do Brasil. Mas essa diferença é agora pequena. O
básico pode ser aprendido e aprimorado com treinos regulares durante um médio tempo.
O extra é a técnica fina, a intimidade com a bola, a fantasia, o
passe de curva, o drible desconcertante, a improvisação. O extra
pode ser aprimorado, mas não se
ensina. As americanas já atingiram o máximo porque nunca vão
aprender bem o extra. A Mia
Hamm, considerada a melhor jogadora do mundo, tem mais técnica e faz melhor o básico do que
a Marta, mas a brasileira possui
mais habilidade e executa melhor
o extra.
O futebol masculino do Brasil é
o primeiro do mundo porque faz
bem o básico, como as outras seleções, e melhor ainda o extra.
Se o futebol feminino tiver uma
boa estrutura profissional, se
houver um campeonato nacional
e uma seleção permanente e se diminuir o preconceito, as mulheres
brasileiras vão aprender bem o
básico e serão tão vitoriosas
quanto os homens.
Renê Simões, com sensibilidade,
filosofias, jeito professoral e conhecimentos que vão além da técnica e da tática, é não somente o
técnico ideal para dirigir a seleção, mas para também organizar
o futebol feminino.
Psicologismo
Não há dúvidas de que a pressão para vencer, a ansiedade, o
excesso e a falta de confiança, a
concentração e a desconcentração e outros fatores emocionais
são importantes no esporte e em
qualquer atividade. Porém há um
exagero na análise desses problemas para explicar as vitórias e as
derrotas. É o psicologismo no esporte.
Quando terminou a sua apresentação, Daiane dos Santos disse: ""Errei". Nada mais claro, conciso e profundo. O restante é imaginação.
Chamar o jogo
Alguns narradores levam para
os outros esportes as expressões e
os bordões que utilizam no futebol. O jogo de basquete feminino
entre Brasil e Espanha estava
equilibrado, e Janeth jogava demais, como sempre. Melhor era
quase impossível. Aí o narrador
do Sportv disse várias vezes que a
Janeth, por ser a melhor do time,
precisava assumir a responsabilidade e ""chamar o jogo para si",
como falam no futebol.
Mudei para a ESPN Brasil, que
passava a partida decisiva do vôlei de praia masculino. Ainda
bem que não existe monopólio de
nenhuma televisão em Olimpíadas. Assisto a todas e posso escolher.
A partida continuou equilibrada, a Janeth manteve o brilho, e o
Brasil venceu. Se perdesse, o narrador diria no final que a Janeth
""não chamou o jogo para si".
Com raras exceções, não é o craque que faz o time atuar bem e
vencer. É o contrário. O craque se
destaca e decide quando é amparado por um ótimo conjunto.
Análise final
Quando terminei essa coluna, o
Brasil havia conseguido três medalhas de ouro e tinha chance de
ganhar, pelo menos, mais uma.
Em Atlanta, o país conquistou
três de ouro e nenhuma em
Sydney. O Brasil vai ficar mais
bem colocado, mas deve ganhar
menos medalhas. Foram 15 em
Atlanta e 12 em Sydney. As medalhas de ouro que o Brasil ganhou
nessa Olimpíada foram nos mesmos esportes que conquistou em
Atlanta e que eram também esperadas em Sydney.
Um país pobre como o Brasil
deveria investir tanto dinheiro
por meio das estatais, da Lei Piva
e do COB nos esportes de alto rendimento para ganhar mais medalhas a médio e longo prazo ou seria melhor priorizar o esporte como inserção social, como prometera o ministro de Esportes antes
da posse? Isso precisa ser mais discutido.
E-mail
tostao.folha@uol.com.br
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