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Cinema
Com o diabo no corpo
"Encarnação do Demônio" estréia sexta e marca a volta do temido coveiro Zé do Caixão ao cartaz
LETICIA DE CASTRO
DA REPORTAGEM LOCAL
Depois de 41 anos
longe das telas, o
mais famoso personagem de terror
brasileiro, o coveiro sádico Zé do Caixão, está de
volta mais sanguinolento do
que nunca. "Encarnação do Demônio" -filme que conclui a
trilogia do personagem criado e
vivido pelo cineasta José Mojica Marins em 1964- entra em
cartaz nesta sexta com muita
violência e cenas de tortura de
embrulhar o estômago.
O filme começa quando Zé é
solto da prisão onde passou os
últimos 40 anos, cumprindo
pena pelos crimes cometidos
nos dois filmes anteriores.
Agora, Josefel Zanatas -o Zé
do Caixão-, está na faixa dos
70 anos, é um respeitável senhor de barbas brancas, mas
ainda conserva as unhas compridas, a capa e a cartola pretas
e a obsessão por encontrar a
mulher superior, sem medos e
sem superstições, capaz de gerar com ele o filho perfeito. Na
busca pela tal mulher, ele mata
e tortura candidatas, discípulos
e inimigos, deixando um rastro
de violência por onde passa.
Para além do enredo sinistro,
a história da produção do filme
também tem sua carga de horror e seus fantasmas particulares. Escrito originalmente em
1966, "Encarnação do Demônio" passou pelas mãos de três
produtores ao longo dos últimos 40 anos. Nenhum sobreviveu para concluir a história.
Na década de 70, um americano começou a trabalhar na
produção. Morreu alguns meses depois, de câncer. Nos anos
80, foi a vez de Augusto de Cervantes, companheiro de Mojica
desde os primeiros trabalhos
no cinema. Acabou morrendo
antes do início das filmagens.
Em 1998, nova tentativa. O produtor Ivan Novais decide concluir a saga de Zé do Caixão,
mas morre "de emoção" no dia
em que o projeto seria anunciado para a imprensa.
"Essa fita passou a ser considerada maldita. Eu já não tinha
mais esperança de fazer esse
filme", conta o cineasta José
Mojica Marins, 72.
Até que, em 2000, o produtor
Paulo Sacramento, 37, e o diretor Dennison Ramalho, 34, resolveram quebrar o encanto.
Procuraram Mojica com a intenção de promover sua volta
aos sets de filmagem.
"Eles vieram me perguntar o
que eu gostaria de filmar, e eu
falei meio na brincadeira: pode
ser "Encarnação". Mas logo perguntei para o Paulo: "Se acontecer alguma coisa com você, se
você morrer no meio da produção, tem quem prossiga a fita?'", brinca o cineasta.
Sacramento, por sua vez, não
se assustou com o histórico macabro. "Eu sou um pouco como
o Zé do Caixão, não acredito em
nada, não tenho superstição.
Eu só queria ver esse filme
pronto", diz o produtor, que
também é responsável pela montagem da fita, vencedora
de sete prêmios no 1º Festival
Paulínia de Cinema e já escalada para uma mostra paralela do
Festival de Veneza.
Se de 1966 até 2000 foram
seis alterações no roteiro, de
2000 até 2006, ano que foi filmada, a obra sofreu mais nove
modificações. "Originalmente,
o Zé vinha de uma cidadezinha
fazer experiências com LSD.
Ele queria saber se as alucinações eram tudo aquilo de que se
falava", conta o diretor.
A história dos 40 anos do personagem na prisão está registrada no livro em quadrinhos
"Prontuário 666", que a editora
Conrad lança nesta semana.
Sem computador
Quem está acostumado com
os filmes de terror atuais, que
abusam dos efeitos especiais,
pode ficar surpreso com "Encarnação do Demônio". Tudo o
que aparece na tela é real.
Isso significa que os atores tiveram que contracenar com ratos, aranhas, baratas e até com
um porco morto. "A primeira coisa que
eu pedi foi para não usar computação gráfica ou efeitos especiais, porque isso mata a autenticidade do trabalho. Eu sou pelo artesanal, acho que dá mais
impacto. Hoje o público está
muito evoluído, logo nota o que
é computação gráfica ", defende o sórdido diretor.
Apesar de renegar o computador no cinema, Mojica já o incorporou ao seu dia-a-dia. Com
auxílio da filha e do genro, ele
criou no início do ano um perfil
no Orkut (José Mojica Marins
Oficial) para divulgar seu filme
e trocar idéias com fãs.
Também é usuário do YouTube, que usa para pesquisar
filmes novos e relíquias que
não consegue achar em videolocadoras. "Descobri no site
pessoas que tinham fitas minhas que nem eu tenho mais.
Mandei e-mail, e eles vão me
enviar cópias", conta Mojica,
que conseguiu recuperar obras
como "D'Gajão Mata Para Vingar" e "Sexo e Sangue na Trilha
do Tesouro" (ambos lançados
em 1972).
AS TORTURAS EM "ENCARNAÇÃO DO DEMÔNIO"
DO PORCO
A cena mais impactante é a que mostra
uma das candidatas a mãe do filho do
coveiro sendo retirada de dentro de um
porco. A atriz teve de "entrar" na carcaça
do animal "que chegou do açougue
já limpo, sem carnes e sem tripas" e
ser costurada lá dentro (apenas um
buraquinho para ela respirar ficou aberto).
A cena mostra Zé do Caixão rasgando
a barriga do porco com uma faca e
resgatando a garota de dentro do bicho
DAS BARATAS
Lenny Dark, companheira de Mojica na
vida real, teve uma cena escrita em sua
homenagem: é obrigada a mergulhar o
rosto em um tonel com 3.000 baratas.
Metade da equipe, com fobia ao inseto,
saiu do estúdio e não conseguiu
acompanhar a filmagem
DOS GANCHOS
Um dos seguidores do coveiro é suspenso
no ar pela pele. As costas do ator "que faz
profissionalmente performances desse
tipo em São Paulo" foram perfuradas por
ganchos, que o sustentaram no ar
DOS LÁBIOS
Outra seguidora tem os lábios costurados.
A cena foi feita sem anestesia, por uma
performer de "body modification"
DAS ARANHAS
Para provar que qualquer um sobrevive
ao sadismo do Zé do Caixão, o cineasta
se submeteu à maldade de seu próprio
personagem. Num delírio, o coveiro tem de
suportar aranhas passeando por seu corpo
censura: 18 anos
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