|
Texto Anterior | Índice
Promessas de mudanças e de nova vida garantem a proliferação e o sucesso dos "reality shows"
TransTV
BRUNO YUTAKA SAITO
DA REDAÇÃO
Você anda se sentindo infeliz?
Gostaria de mudar sua vida? Em
outros tempos, livros de auto-ajuda, dietas e remédios prometeriam soluções rápidas. Hoje, os
"reality shows" são os produtos
populares que mais alimentam as
promessas de mudança radical,
obsessão de quase todo mundo.
Basta dar uma zapeada para
conferir. Uma contagem rápida
revela que "apenas" 26 desse tipo
de programa hoje na TV brasileira se baseiam na mesma idéia.
Em vez do criticado voyeurismo, que seria a base do sucesso
dos "reality", é a metamorfose o
eixo que sustenta o interesse. Afinal, neles se realiza a nova utopia:
qualquer um pode se transformar
no que quiser -seja com um novo corpo, uma nova personalidade ou até uma nova casa.
Nesses "reality", há desde a história da mulher que se acha feia e
"ganha" um novo corpo ("Extreme Makeover") até o dançarino
que se torna um lutador ("Tudo É
Possível"), sem esquecer os zés-ninguém que se trancam numa
casa e depois de 12 semanas tornam-se "celebridades" ("Big Brother"). A influência alcança até as
novelas, como a capenga "Metamorphoses" (Record), que louva
as maravilhas da plástica.
"Os "reality" têm de ser dramáticos, senão ninguém irá se interessar. Para isso, é dado aos participantes o desafio de tentar se
transformar de alguma maneira,
mas criando obstáculos", diz Stephen Lambert, criador de "Tudo
É Possível" ("Faking It", do britânico Channel 4) -em que um
participante torna-se especialista
em uma área na qual seja leigo.
Dois novos "reality" tornam as
transformações mais explícitas.
Inéditos no Brasil, os americanos
"I Want a Famous Face" e "The
Swan" trazem pessoas que fazem
cirurgias para ficarem "belas".
"Os "reality" têm muito a ver
com mudanças, e não só com voyeurismo; eles oferecem não apenas dinheiro, mas sim uma "experiência" -retratada como benéfica", diz Mark Andrejevic, professor de comunicação da Universidade de Iowa (EUA) e autor do livro "Reality TV". A maioria desses "reality" aponta para mudanças comportamentais, chegando a
reforçar estereótipos. É o caso de
"Queer Eye for the Straight Guy",
em que gays ensinam supostas
boas maneiras a um heterossexual; ou "Esquadrão da Moda".
Neles, sugere-se que uma pessoa
pode ser bem-sucedida apenas
com uma mudança no visual.
"Esses programas atraem participantes porque não há na sociedade, e nunca haverá, condições
para que todos "existam" e se
"transformem" tal e tanto quanto
a sociedade insiste em dizer (...)
que se deve fazer e que é bom fazer", diz Teixeira Coelho, escritor
e professor titular da Escola de
Comunicação e Artes da USP.
"Sem sonho de transformação o
ser humano é inconcebível."
Já os representantes locais do
maior fenômeno
do gênero, "Big
Brother", acreditam que não há tal
tendência. Para o
diretor do "BBB",
J.B. de Oliveira, o
Boninho, "nem todo o formato segue
essa linha". "Eles são mais baseados em "experimentações" e aí
transformados em shows. (...) O
problema é que o gênero proporciona muitos formatos e os de
transformação estão proliferando, chegando a exageros." A diretora-geral da Endemol [empresa
criadora do "BB"] Globo, Carla
Affonso, diz que nesses shows
"pode-se realizar fantasias, como
"eu poderia estar nessa situação'".
A julgar pelo resultado de "Famous Face", a transformação
nem sempre é bem-sucedida
-os adolescentes espinhudos de
um dos episódios, que sonhavam
em se tornar parecidos com Brad
Pitt, conseguiram, no máximo, o
corte de cabelo do ídolo.
Texto Anterior: Documentário: Cinegrafista dos tubarões encara "fúria" de Amyr Klink Índice
|