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TELEVISÃO
Drama de 12 episódios, gravado na capital italiana para criar verossimilhança, tem investimento de cerca de US$ 75 mi
Em 2005, o Império Romano contra-ataca
FRANK BRUNI
DO "NEW YORK TIMES"
Como todo mundo sabe ou pelo
menos é capaz de supor, Roma
não foi construída em um dia.
Mas a cidade foi erguida em uns
poucos meses, resplandecente em
seu isopor, fibra de vidro e chapa
metálica. Um dos poucos projetos
cívicos inacabados, em uma tarde
recente, era um trecho da piazza
perto do Templo de Vênus, onde
o cimento ainda não tinha secado.
"Pise com cuidado", alertou
Anne Thomopoulos, executiva de
primeiro escalão da HBO, mas o
aviso veio tarde demais. Lá estava,
maculando a paisagem clássica da
cidade e expondo seu artifício:
uma pegada de sapato que pertencia definitivamente a um período posterior da História.
Thomopoulos riu e prometeu
que o defeito seria consertado.
Um passo equivocado de um visitante não bastaria para impedir
que a HBO concretizasse a mais
recente de suas visões excêntricas.
A rede de TV a cabo que fez dos
agentes funerários personagens
sexy (em "Six Feet Under") e que
recentemente começou a desconstruir o western (em "Deadwood") está agora reconstruindo
e revivendo a Roma antiga.
Para fazê-lo, a HBO atraiu a
BBC a uma parceria, e juntas as
duas organizações investiram
cerca de US$ 75 milhões para os
12 episódios de uma hora de duração da minissérie "Roma", drama
que deve estrear em 2005. Se obtiver sucesso, uma segunda e talvez
uma terceira temporada poderão
ser produzidas.
A série, além disso, iniciou sua
produção na Roma moderna, em
parte com base na teoria de que a
proximidade estimula a fidelidade histórica, ou pelo menos um simulacro convincente.
"Eles filmavam "Sex and the
City" em Nova York", diz Thomopoulos. ""A Família Soprano" é filmado em Nova Jersey. Há uma
textura, uma verossimilhança,
que só é possível obter quando filmamos no local real da história."
A enorme equipe envolvida na
filmagem de "Roma" está instalada a cerca de 10 km do centro histórico da cidade, nos famosos estúdios da Cinecittà, onde Federico Fellini dirigia seus filmes e onde, mais recentemente, Mel Gibson filmou boa parte de "A Paixão
de Cristo" e Martin Scorsese moldou "Gangues de Nova York". Pedaços do filme de Scorsese ainda
existem no estúdio. Se você andar
até os limites mais distantes da
Roma do ano 51 a.C., subitamente
tropeça na Nova York de 1851.
Roma é maior e muito, muito
mais brilhante do que se poderia
esperar. Está repleta de colunas
jônicas e coríntias vermelhas,
amarelas, laranjas e pretas.
Joseph Bennett, diretor de arte
da produção, diz que esses tons
são tão historicamente acurados
quanto o branco desbotado pelo
tempo dos pilares remanescentes
no Fórum, no centro da cidade.
"Tudo era colorido", diz Bennett, enquanto guia um repórter
em sua visita à versão de Roma
que a minissérie apresentará.
Bruno Heller, redator-chefe do
programa, explica, no almoço,
que a Roma antiga era na verdade
uma espécie de mercado a céu
aberto, maltrapilho, e não a passarela monocromática de túnicas
bem passadas e poses ostentosas
que gerações de roteiristas e diretores enfatizaram.
"A Roma daquele período era
mais parecida com Bombaim ou
com a Cidade do México", diz Heller. "Era suja e selvagem."
E isso atraiu a HBO.
Thomopoulos desenvolveu a
idéia básica para a série em 1997,
depois de assistir a um DVD de "I,
Claudius" [Eu, Cláudio], uma minissérie britânica dos anos 70 sobre a Roma antiga. Ela disse que o
trabalho despertou seu apetite
por mais filmes sobre Roma, com
uma abordagem diferente.
Alguns anos mais tarde, conta,
Heller foi ao seu escritório em Los
Angeles "para tentar vender uma
idéia relacionada a norte-americanos pobres". Ela perguntou se
ele estaria disposto a desviar suas
energias para os pobres da Roma
clássica. "Eu amo a Roma antiga",
é a resposta que ela relembra.
O conceito era observar a Roma
imperial da perspectiva do homem comum, e não do palácio de
César. O que emergiu dessa idéia
foi uma trama que gira em torno
de dois soldados de volta à cidade
depois de passarem anos desmembrando gauleses nas guerras.
Um dos soldados "está muito
preocupado com a possibilidade
de que sua mulher lhe tenha sido
infiel", conta Heller.
"E surgem complicações", diz
Stan Wlodkowski, um dos produtores-executivos da série.
Essas reviravoltas e surpresas
não são expressas em latim ou
aramaico, mas em inglês relativamente coloquial: uma forma, segundo os criadores da série, de estimular um elenco composto basicamente por atores britânicos
desconhecidos.
"Assim que os atores vestem
seus trajes históricos, adotam personalidades bizarras", diz o diretor Michael Apted.
Apted, cujos créditos como diretor de cinema vão de "O Destino Mudou sua Vida" a "007 - O
Mundo Não é o Bastante", foi
contratado para dirigir os três primeiros episódios de "Roma".
"Esse é um dos desafios que temos de enfrentar: o de não produzir um espetáculo bizarro", diz
ele, sentado à mesa do almoço
diante de Heller e Wlodowski.
Os criadores da série tomaram o
máximo de cuidado para manter
a fidelidade ao passado. Montaram uma biblioteca de títulos obscuros sobre o tema, entre os quais
diversos que tratam dos gestos físicos dos antigos romanos.
No começo de março, Apted
alugou um ônibus e, acompanhado de um grande grupo de atores,
viajou até as ruínas de Pompéia,
perto de Nápoles, duas horas ao
sul da capital italiana.
"O lugar serve para oferecer
uma impressão de como era a vida: a largura de uma rua, o tamanho de uma sala", diz. "Isso permite construir uma imagem inconsciente que se torna parte essencial de tudo que fazemos."
Bennett disse que durante a
criação de esculturas em fibra de
vidro para os templos romanos
montados no estúdio, a equipe visitou os muitos museus de Roma
e usou relíquias reais como referência para as suas reproduções.
April Ferry, a figurinista, estudou a moda do período e fez surpreendentes descobertas.
"Quem diria que os gauleses
usavam roupa xadrez?", diz ela,
caminhando entre as couraças e
os trajes que ocupam o seu departamento de guarda-roupa.
Ela disse ter descoberto em livro
sobre o erotismo em Pompéia,
que diz que as prostitutas romanas usavam blusas de frente-única e bustiês, não muito diferentes
dos trajes adotados pelas descendentes modernas. "Eles eram pessoas parecidas conosco", diz.
Bem, nem tanto.
As pesquisas de Ferry também
demonstraram que os soldados
romanos às vezes afixavam pequenas partes dos corpos de rivais
derrotados, entre as quais os órgãos genitais, aos seus elmos de
batalha.
Mas havia certa confusão na
Roma antiga e em suas cercanias,
naquela tarde. O início das filmagens estava marcado para dali a
alguns dias, e os preparativos finais estavam em ritmo frenético.
Bennett disse que começara a
contemplar a construção dos cenários em setembro, mas que a
pedra fundamental, por assim dizer, só fora deitada em novembro.
Apenas quatro meses mais tarde, sua Roma tem um imenso fórum republicano com templos
majestosos, sustentados por
imensas colunas. O bairro rico da
cidade está enfeitado por amplas
mansões, revestidas de material
que se assemelha a uma pedra
macia, e o bairro pobre tem edifícios residenciais de tijolos.
As estruturas parecem firmes ao
toque. Não há fachadas falsas ou
cenários de cartolina, aqui.
"Os cenários têm de ostentar
uma certa longevidade, como a da
antiga Roma", disse Bennett. Na
era da televisão, isso não quer dizer décadas ou séculos, mas a duração de uma série respeitável.
Cinco anos bastarão.
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