São Paulo, terça-feira, 12 de agosto de 2008

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Comentário

Raridades surgem em seleção artificial

Objetos da mostra "Tesouros da Terra Santa" foram escolhidos por ajudarem a ilustrar relatos históricos conhecidos

RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL

A chados arqueológicos são fragmentos volúveis do passado, pois sua preservação depende muito do acaso. Materiais orgânicos, como ossos e madeira, são bem mais raros do que objetos resistentes à passagem do tempo e das estações climáticas, como cerâmica, mármore ou vidro. Mesmo esses materiais podem estar disponíveis apenas em pedaços que exigirão paciência e habilidade para serem remontados.
Isso ajuda a explicar o recorte feito na exposição "Tesouros da Terra Santa". A idéia original era mostrar apenas objetos da era de Jesus Cristo. No entanto, mesmo o mais importante museu israelense não teria objetos suficientes para uma mostra que não fosse limitada e repetitiva. Resta pouco da "cultura material" dos primórdios da era cristã.
Felizmente, o âmbito da exposição foi alargado para incluir um período mais extenso, o que permite ao visitante acompanhar tanto a evolução do judaísmo como sua convivência com a nova religião.
Objetos variados de culto religioso, da vida cotidiana e da administração do poder real e imperial mostram esse relacionamento complexo, mediado tanto por guerras como pelo cotidiano de comunidades dividindo o mesmo espaço.
Os objetos foram escolhidos por ajudarem a ilustrar relatos históricos conhecidos, estejam eles na bíblia judaico-cristã ou em textos como o do historiador judeu Flávio Josefo, que descreveu a destruição de Jerusalém pelos romanos no ano 70 d.C. Não chega a ser um problema grave da exposição, mas é preciso percorrê-la tendo isso em mente: trata-se de um conjunto de objetos agrupados de modo artificial. Em parte isso se deve por serem poucos e raros, mas principalmente porque se quer ilustrar uma história já conhecida.

Atrações
Há atrativos óbvios para o visitante interessado na vida de Jesus, como objetos de mesa que poderiam ter feito parte de uma "santa ceia". Mas são colocados fora do contexto arqueológico original e unidos agora de modo um tanto forçado para enfatizar a reverência religiosa.
Outro exemplo é um "meio shekel" de prata que cada homem adulto judeu deveria doar por ano ao templo. A moeda de prata foi colocada ao lado de exatas 128 outras de bronze, de modo a retratar o episódio bíblico em que Jesus se insurge contra os cambistas do templo.
Apesar dessa seleção artificial, alguns artefatos são ilustrativos por eles mesmos. É o caso de um menorá (candelabro de sete braços), objeto sagrado judaico, que inclui figuras de leões. Isso não seria permitido em tempos de religião mais estrita, mas serve para informar que naquele momento havia uma visão mais flexível do judaísmo e da convivência com os gentios (os não-judeus).
Outra boa justaposição de peças achadas em contextos distintos é particularmente representativa da convivência religiosa. São duas peças de mármore com decorações praticamente idênticas, com uma diferença básica -a que foi fabricada pelo artesão para a sinagoga tem um menorá no centro, enquanto a que foi entregue aos cristãos traz cruzes.


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