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MÔNICA BERGAMO
"A mulher amada sempre é perfeita"
Ana Ottoni/Folha Imagem
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Foi o próprio Favre quem desenhou o sofá de três lugares da sala do casal, no Jardim Europa |
"Se você não ouvir a "Sinfonia nš 5", de Mahler,do começo ao fim, nunca vai descobrir a minha alma. Ouça. Depois escreva a reportagem. Quando tiver concluído sua matéria, ouça novamente a música." Essa
foi a recomendação de Luis Favre, 53, o marido da prefeita
Marta Suplicy, à coluna, que tentou acompanhar um dia
de sua rotina na semana passada. A "Sinfonia nš 5", de
acordo com o maestro Jamil Maluf, é "vibrante, vigorosa,
a mais humana do compositor".
Favre recebeu a Folha para fotografias em sua casa, no
Jardim Europa. Posou no sofá vermelho, desenhado por
ele mesmo, mostrou a piscina, livros de
Baudelaire e a biblioteca. À reportagem, preferiu conceder uma entrevista no comitê eleitoral de Marta.
Na presença de um assessor. Logo
no início, ligou seu próprio gravador. "É para o caso de o seu
aparelho falhar."
Folha - O sr. e a prefeita estão
juntos há dois anos, é isso?
Luis Favre - Eu tenho menos de
um ano de casado. Uma data importante. Menos de um ano.
Folha - Por que o sr. faz questão
de frisar isso?
Favre - Porque só vou fazer um
ano de casado em outubro. [Olha
para o assessor e percebe que confundiu a data]. Aliás, em setembro. Em 20 de setembro.
Folha - Que balanço o sr. faz de
sua experiência no Brasil?
Favre - Escolhi viver aqui em
função de uma relação afetiva que
me levou a casar com a Marta.
Mas para mim tem implicações
porque eu morei na França por
mais de 30 anos, tenho quatro filhos em Paris. Estou ligado ao
Brasil desde 1976, mas eu não morava aqui. Sinto falta de meus filhos. Sinto falta do anonimato e
de caminhar. Mas, como tenho
uma relação antiga com SP, a rudeza da separação com relação a
Paris foi amortecida pela acolhida
dos que me rodeiam aqui.
Folha - O sr. se sente bem acolhido? Creio que já ouviu menções
não muito simpáticas ao sr.
Favre - Como em todos os países, há pessoas que atacam os estrangeiros. O povo de São Paulo
não aceita, mas há os que gostam
de alimentar esse preconceito
com um intuito político. O que
mais me incomoda é a baixeza, os
rumores, os boatos, as ofensas. O
primeiro ato de campanha da
candidatura José Serra foi atacar a
mim e à minha esposa no plano
pessoal, de ofensa e de baixaria.
Folha - Há um ano, uma onda de
boatos dizia que o sr. seria uma
pessoa, digamos, sedutora. A prefeita se incomodou muito. À coluna, ela creditou tudo à inveja pois
teria um marido que é "um gato".
Favre - Que fique claro que eu
não vou responder a boatos. Inveja eu entendo. Mas penso que foi
uma tentativa sem escrúpulos, caluniosa, antiética, orquestrada
para atingir a prefeita.
Folha - O sr. se acha "um gato"?
Favre - Eu me acho uma pessoa
com certas qualidades, que não
incluem qualidades físicas, salvo
estar em bom estado físico, o que
me faz sentir muito bem. A gente
emite sinais que nunca são inteiramente físicos nem intelectuais.
É uma mistura complexa.
Folha - O que mais o atraiu na
Marta?
Favre - De pronto, a paixão. É
uma grande paixão.
Folha - O fato de o senador Eduardo Suplicy ter ficado na posição de
uma pessoa traída vulnerabilizou o
sr. e a prefeita?
Favre - Marta teve a coragem, rara num cargo em que ela está, de
considerar que, se não amava
mais uma pessoa, devia se separar. E, se amava outra, devia se casar com ela. Então, não tem traição. Ao contrário. Tem coragem.
Folha - O presidente Lula pediu
que ele assumisse um namoro [com
a jornalista Mônica Dallari] para
ajudar a Marta na campanha?
Favre - Isso você tem que perguntar para o Lula.
Folha - Mas a negociação incluiria
a Marta.
Favre - Veja bem: o senador Suplicy diz que está apaixonado há
um ano e meio. Eu acho maravilhoso. Eu me dou muito bem com
ele. É o pai dos filhos da minha
mulher. Está na coordenação da
campanha da Marta.
Folha - Vocês têm reuniões?
Favre - Já participamos de uma
reunião. Inclusive a gente estava
falando sobre tabaco, e ele falou:
"Viu, Luis? Você tem que parar de
fumar". É uma relação absolutamente normal.
Folha - E as pesquisas que indicam que a separação da prefeita
aparece como um ponto negativo?
Favre - Não me consta. Uma vez
nós fizemos uma pesquisa depois
da separação. E 85% consideravam que a vida privada da prefeita, na medida em que não interferia em sua vida pública, era de domínio exclusivo dela. Esse patamar eu só vi em países europeus.
Folha - Por que vocês resolveram
oficializar o casamento?
Favre - Eu aprecio a instituição
do casamento [Favre se casou
quatro vezes, três delas no papel].
Aliás, será que dá muito voto, atacar o amor? Questionam a pessoa
no que? Na sua mediocridade? Na
sua incapacidade afetiva? Estou
fazendo uma reflexão mais filosófica. Acho estranho nos atacarem
pelo nosso amor.
Folha - Quem pediu quem em casamento?
Favre - Eu pedi, e ela aceitou. Somos tradicionalistas nessas coisas.
Folha - Quem paga a conta no restaurante?
Favre - Eu pago. É um rescaldo
das velhas tradições machistas.
Em casa, nos organizamos da melhor maneira possível para nós.
Folha - Qual é o seu grau de influência sobre a Marta? Até onde o
sr. acha que, não tendo sido eleito,
dá para ir na "conversa de travesseiro", como diria o senador Suplicy [que afirmou ter tido sempre
"uma conversa de travesseiro"
com Marta quando eram casados]?
Favre - Evitamos falar de prefeitura. Em geral não me meto nas
questões da administração. Nada
pior para a minha mulher do que
chegar em casa e discutir trabalho. Ela prefere falar do que eu li,
ouvir uma música comigo, falar
do meu filho ou do Supla. Temos
diversos centros de interesse.
Folha - Mas, na "conversa de travesseiro", o sr. já deu alguma opinião, por exemplo, sobre o problema dos ônibus?
Favre - Não utilizei essa expressão [conversa de travesseiro] porque não quero que você crie um
atrito. Estou lendo "La Mariée Libérée" ["A Noiva Libertada"], de
Avraham B. Yehoshua, uma novela que fala de Israel, dos árabes.
E a Marta, um segredo aqui entre
nós, está lendo "Os Cem Dias", de
[Dominique de] Villepin, sobre
Napoleão. Como vê, dedicamos
os finais de dias a coisas mais interessantes do que falar de ônibus.
Folha - O sr. cozinha para ela?
Favre - Às vezes. Desde que começamos a viver juntos, ela introduziu a salada como prato permanente. Preparo umas saladas
boas, de rúcula, tomate com alho.
Folha - E ela está mais magra.
Favre - Você sabe que, aos olhos
de um enamorado, a mulher
amada sempre é perfeita.
Folha - Ainda sobre sua influência sobre a prefeita, o sr. vai coordenar a campanha dela...
Favre - Corrigindo: eu não vou
coordenar. Eu sou um dos coordenadores. Vou cuidar da relação
do PT com a agência de publicidade [de Duda Mendonça, responsável pelo marketing da campanha, e onde Favre trabalha por
um salário de R$ 20 mil].
Folha - Que nota o sr. dá para a
administração?
Favre - Não sou professor. Mas
acho surpreendente o que foi feito. Marta tem convidado delegações estrangeiras para ir aos CEUs
[Centro Educacional Unificado].
O cara fala: "Que coisa linda". Aí
falamos: "É. Nós fizemos 21." Falam: "O quê? 21? Há quanto tempo Marta foi eleita?". Três anos e
meio. E tudo foi feito sem endividar a cidade.
Folha - A dívida de São Paulo aumentou muito.
Favre - Marta não fez dívida. Ela
pegou empréstimo [do BNDES e
do BID] de R$ 450 milhões, mas
conseguiu amortizar da dívida
anterior R$ 500 milhões. São Paulo gasta 13% da receita com a dívida. Ninguém paga tanto, nem o
governo federal, nem os estaduais, nenhuma cidade.
Folha - O sr. acha que o problema
da prefeita é a sua imagem de arrogância?
Favre - Ela não é hipócrita nem
falsamente diplomática. Você
chama isso de arrogante, e eu de
autêntica. Para o cálculo político,
pode não ser muitas vezes positivo, mas acho uma qualidade.
Gosto de minha mulher porque
ela tem uma forte personalidade.
É uma autêntica mulher.
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