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WIM WENDERS
Autor de clássicos do cinema como "Asas do Desejo" e "Paris, Texas", diretor alemão está no Brasil para palestras e participa de Sabatina Folha na próxima sexta em SP; em entrevista exclusiva, analisa o presente e o futuro dos filmes
Rafael Hupset/Folha Imagem
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O diretor alemão, em SP; seu novo longa, 'Palermo Shooting' (filmagem em Palermo), ainda não tem data de estréia no país
MARCOS STRECKER
DA REPORTAGEM LOCAL
Nome cult do circuito cinematográfico, Wim Wenders diz
que a era digital está deixando o
cineasta e o fotógrafo numa situação delicada. O que difere o
real do manipulado no mundo
das imagens atualmente?
Aos 63 anos, este americanófilo obcecado pelas novas tecnologias foi um dos últimos rebentos dos novos cinemas que
explodiram nos anos 60 (nouvelle vague à frente, cinema novo na periferia). Renovou a linguagem cinematográfica, fazendo uma releitura dos clássicos americanos. Hoje, depois
de uma relação malsucedida
com Hollywood, reconhece que
seu sonho americano acabou e
se diz um "alemão romântico".
Precursor do cinema independente americano (com o
qual tem uma relação tensa),
um símbolo para os modernos
desde os 80, passou recentemente por uma recepção fria
no Festival de Cannes (com
"Palermo Shooting") e se prepara para testar o cinema de
terror no Japão, onde filmará
em breve uma adaptação de
"Miso Soup" (Cia. das Letras),
de Ryu Murakami, escritor e cineasta japonês.
Wenders, que presidirá o júri
do próximo Festival de Veneza,
está no Brasil para participar
do seminário Fronteiras Braskem do Pensamento, com conferências hoje, em Porto Alegre, e quarta, em Salvador. Na
próxima sexta, às 16h, a Folha
promove uma sabatina com o
cineasta, com participação de
Walter Salles.
A seguir, os principais trechos da entrevista exclusiva
concedida pelo diretor.
IMAGENS, FOTOGRAFIA E VERDADE
O cinema ainda é capaz de
nos mostrar a verdade (eu me
sinto mais confortável dizendo
"uma" verdade). Por isso o cinema é tão urgente hoje, e é por
isso que cineastas têm uma responsabilidade inteiramente
nova. É como se todas as outras
mídias, especialmente a TV, tivessem desistido de mostrar o
mundo sem preconceitos.
Filmes podem transportar
melhor as pessoas para outros
lugares. Podem nos fazer mergulhar em outros países, em
outras culturas, em diferentes
linguagens. Mais do que nunca,
na era global, filmes podem nos
ajudar a descobrir locais e culturas específicas, não só "generalizações". O fotógrafo hoje está mais acostumado do que
qualquer outro com a manipulação e a mentira. Às vezes acho
que não existem mais imagens
que não tenham sido alteradas
digitalmente. Os fotógrafos vivem na linha de frente da era
digital. São mais expostos a essas infinitas tentações do que
qualquer outro.
PIRATARIA E O DESTINO DO CINEMA
Toda a tecnologia que os jovens têm à sua disposição está
mudando a forma como enxergam o mundo audiovisual e o
processo de filmar. O YouTube
tem um impacto gigantesco.
Estou dando aula de cinema digital na Escola de Artes de
Hamburgo (Alemanha) e meus
alunos fazem filmes com pequenas câmeras e celulares.
Também atuei muito no projeto filmaka.com, espécie de
academia de cinema baseada
na internet. Todo o conteúdo
foi criado digitalmente.
FIM DO "SONHO AMERICANO"
Ainda pretendo filmar nos
EUA. Tenho afinidade muito
grande com atores americanos,
com a paisagem americana,
com romances do país. Mas
meu "sonho americano" pessoal acabou há muito tempo.
Foi quando percebi que nunca
me tornaria um "cineasta americano". E que, no meu coração,
era um alemão romântico e que
minha profissão sempre seria a
de um "cineasta europeu".
"PALERMO SHOOTING"
Mesmo que tenha trabalhado com prazer nos EUA, onde
fiz meus últimos seis filmes, me
senti isolado, achei que estava
enxergando o mundo a partir
da periferia. Hollywood acha
que é o centro do mundo. Pode
ser verdade para alguns, mas
não para um viajante como eu.
Sinto, cada vez mais, a necessidade de me reconectar ao resto do mundo. Filmei "Palermo
Shooting" em minha cidade natal (Düsseldorf, Alemanha) e na
Sicília. Estou ansioso com o
meu próximo filme, que será
rodado em Tóquio. "Palermo"
pode ter a forma de um thriller
romântico, mas na sua essência
é um filme sem modelo. Tanto
quanto adoro filmes de "gênero", acho difícil obedecer às regras deles. Na verdade, provavelmente gosto de filmes de gênero porque ele tem fronteiras
que podem ser cruzadas.
ESTÉTICA DA VIOLÊNCIA EM FILMES
Violência nos filmes não é só
uma tendência, mas um ingrediente importante do cinema
contemporâneo. Infelizmente,
diversos filmes são feitos apenas porque têm elementos de
violência. E, mais triste ainda,
vários deixam de ser produzidos porque se recusam a entrar
nesse território. Mas não me
oponho ao uso da violência de
uma forma geral. Sempre há filmes em que a violência é um
elemento importante e necessário. Afinal, existe a violência
no mundo. Apenas odeio quando vejo um filme e me dou conta que ela está lá de forma aleatória, sem me fazer entender
suas origens, suas raízes.
BARACK OBAMA E OS EUA
Os EUA podem voltar a ser
um país de esperança. Deveriam. Espero que consigam.
Mas Obama terá de consertar
um estrago terrível provocado
por oito anos tristes, perdidos.
A AMIZADE COM WALTER SALLES
Walter e eu nos encontramos
em diversas ocasiões nos últimos anos. Gostaria de vê-lo
mais. Há poucas pessoas de
quem sempre sinto falta, e Walter é uma delas.
A RELAÇÃO COM O BRASIL
Adoro o Brasil, desde que pude vislumbrar pela primeira
vez o país, o que aconteceu com
"Terra em Transe" (de Glauber
Rocha). Gostaria de vir mais.
Estava planejando viajar um
pouco por aqui, após as palestras. Mas fui convidado para
presidir o júri do Festival de
Veneza. E é difícil dizer não a
um convite desse... Eu voltarei!
PRÓXIMO FILME, O TERROR
O que me atrai mais do que
qualquer coisa é: o que ainda
não sei? E me parece que o filme de terror, ou aquele tipo de
thriller com elementos de medo, não tem sido usado para incorporar outros temas. Acho isso extremamente interessante.
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