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ENTREVISTA
WASHINGTON OLIVETTO
"Fazer campanhas iguais é eticamente constrangedor"
Publicitário, que nunca trabalhou para político, diz que a propaganda
na televisão ainda tem forte impacto
LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
O publicitário Washington Olivetto
nunca aceitou fazer campanha política e,
por isso, foi chamado para criar a campanha do Tribunal Superior Eleitoral deste
ano. À Folha ele critica o horário eleitoral, que estréia amanhã, fala da entrada da internet na política
e do escândalo com o colega Duda Mendonça.
FOLHA - Por que o sr. nunca trabalhou em campanhas políticas?
WASHINGTON OLIVETTO - Primeiro
por questão geracional. Quando comecei a trabalhar, o Brasil
vivia uma ditadura, obviamente não me identificava com isso
e resolvi não fazer campanhas.
Aí, me voltei para a iniciativa
privada. Dependo tanto da decisão profissional, que, possivelmente, se fosse fazer campanhas políticas, faria mal. São
comitês que resolvem tudo,
tem um cara que dá palpite
aqui, o outro quer agradar
aquele... Não convivo bem com
as áreas políticas. Horário político obrigatório... Essa palavra,
obrigatório, me incomoda loucamente. Se fosse bom, não seria obrigatório. No público
mais jovem, coisas impositivas
são pouco eficientes.
FOLHA - Apesar disso, o sr. acredita
que o horário político na televisão
ainda tem impacto forte?
OLIVETTO - Claro que, num país
de dimensões continentais como o Brasil, seja numa campanha política, seja na de um produto de consumo altamente
popular, a força da TV aberta
ainda é enorme, fundamental.
O horário eleitoral, particularmente no jovem e no formador
de opinião, tem um ranço grande e em alguns momentos é até
desprezado ou ironizado. Mas
em algumas camadas da população ainda funciona. Minha
curiosidade é ver como os candidatos vão tentar renovar a
linguagem. Quatro anos é muito tempo e muita coisa mudou
desde a última eleição em termos de mídia, hábitos de consumo, ambições, senso crítico.
Mas uma coisa não vai mudar
nunca: seja qual for a mídia, da
mais digitalizada até um simples panfleto, se não houver a
grande idéia não acontece nada. A comunicação sempre será
um negócio de forte conteúdo.
A forma é a maneira de expressar esse conteúdo. Quando é
utilizada para esconder a falta
de conteúdo, normalmente é
ineficiente. Em eleições passadas, quando começou um acesso maior à tecnologia, havia
coisas que se fazia com comunicação, mostrar na TV trens
que não iam existir, que deslumbravam um pouco. Nos últimos anos, o acesso à forma se
generalizou, acho que haverá a
revalorização do conteúdo.
FOLHA - Que outras expectativas
há em relação ao horário eleitoral?
OLIVETTO - Depois dos problemas todos, [escândalos sobre]
sobras de campanha, possivelmente essas campanhas tenham menos investimento na
forma, porque terão menos dinheiro para produzir [programas eleitorais]. Mais controle e
menos dinheiro para superproduções. Voltamos à valorização
do conteúdo, o que seria bom.
FOLHA - Ainda que as campanhas
possam ter menos dinheiro, não haja superprodução nos programas
eleitorais e que o senso crítico da população possa estar mais apurado, o
marketing continua capaz de alavancar candidatos sem carisma?
OLIVETTO - Isso tem se tornado
mais inviável. E, por outro lado,
conceitos de carisma estão mudando. Isso tem a ver com a experiência que o Brasil adquiriu
de votar. Cada vez mais, felizmente, o que é mais parecido
com a verdade é mais efetivo.
Pode se dar bem o que se comunicar e se comportar como na
vida real. Por um bom tempo, o
marketing determinava: "agora
você é sério, é isso, é aquilo".
FOLHA - Essa onda de escândalos,
operações da PF, tende a afastar
mais o eleitor do horário eleitoral?
OLIVETTO - Sim, isso afasta. As
pessoas estão um pouco entediadas com o excesso de más
notícias, de discussões. O denuncismo, que em outra época
era característica de momentos
de campanhas eleitorais, hoje
está presente no cotidiano, o
que torna o horário eleitoral
mais cansativo. E hoje a propaganda precisa ter entretenimento. O horário eleitoral poderia passar honestidade, afetividade, senso de humor.
FOLHA - Que outros fatores tornam o horário eleitoral entediante?
OLIVETTO - Não tem capacidade
de surpreender, não tem diversidade. Muitas vezes interrompe um momento de prazer do
público. Sou contra a obrigatoriedade. O eleitor deveria escolher o candidato pela cobertura
da imprensa. E veículos de comunicação deveriam declarar
de que partido são. Acho bacana, como na imprensa internacional, um jornal dizer "sou democrata" ou "sou republicano".
É aberto e traz uma isenção.
FOLHA - Como o sr. avalia a uniformização das campanhas, com marqueteiros fazendo slogans iguais
para diferentes candidatos e pasteurizando até as propostas?
OLIVETTO - Parece um prêt-à-porter. Isso é eticamente constrangedor. Você tem que desconfiar da proposta de gestão
que surja de plano de marketing. Vai depender do senso crítico do eleitor. E isso não é determinado por poder aquisitivo
ou formação intelectual -o intuitivo julga muito bem.
FOLHA - Nestas eleições no Brasil, a
internet terá algum eco ou estamos
muito distantes do que está havendo na disputa norte-americana?
OLIVETTO - No caso do Obama, o
público jovem está sendo atingido por novas mídias. Isso, na
realidade americana é maior,
mas aqui está acontecendo. As
pessoas se encantam com falibilidade, alguém mais coloquial, menos perfeito. Possivelmente, há a percepção de "isso
parece mais verdade". Essa é a
grande mudança na comunicação. A relação, que antes era
monólogo, agora é diálogo.
Quem antes era receptor agora
é discutidor e até produtor de
mensagem. No Brasil, isso terá
algum eco, apesar de que sempre achei nossos políticos muito antigos, defasados. Especialmente em uma eleição municipal, não sei se os candidatos são
tão aparelhados a ponto de se
modernizar no discurso. Mas
algumas manifestações deverão acontecer, apesar de que a
internet, nesta eleição, ainda
terá mais impacto na formação
de opinião do que no voto.
FOLHA - Apesar disso, os candidatos principais estão tentando investir nessa área. Por quê?
OLIVETTO - Se você não investir
nisso, demonstra uma anticontemporaneidade, que contamina todo o resto da sua proposta.
Como você será um dirigente
no mundo moderno se não está
atrelado ao mundo moderno?
É uma questão de atitude, mais
do que o resultado palpável que
possa ter com isso em votos.
FOLHA - O que o sr. achou da decisão do TSE de buscar um controle do
conteúdo eleitoral na internet?
OLIVETTO - Eles podem até se
propor a fazer isso, mas conseguir é praticamente inviável.
FOLHA - Que prejuízos os escândalos do mensalão ligando agências
publicitárias a lavagem de dinheiro
e caixa dois trouxeram ao setor?
OLIVETTO - A propaganda, como
qualquer atividade, é feita por
pessoas e tem as que não se
comportam de maneira correta. Acho que a maioria é direita,
e obviamente há as exceções.
Esses mecanismos ficaram tão
mal pilotados, de como as agências são remuneradas em campanhas, que os que optam por
trabalhar nelas podem ser desde cúmplices até vítimas. E não
vou julgar ninguém. Sempre
optei por nunca me meter com
isso exatamente por essas coisas. Mas a atividade foi contaminada em termos de imagem,
mas felizmente a publicidade
brasileira tem prestígio e acho
que isso já foi superado.
FOLHA - Duda Mendonça, que admitiu caixa dois e remessas ao exterior, é vítima ou cúmplice?
OLIVETTO - Sinceramente não
dá para analisar como foi, se para receber ele teve que... Aí, eu
não sei. Acho muito estranho.
Ele tinha trabalhos de reconhecimento e ficar com a pecha
disso... Ele fez aquela campanha "não basta ser pai, tem que
participar". Acho mais bacana
para a vida dele ser lembrado
por isso. É uma pena...
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