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CRÍTICA
Esporte na TV faz aflorar nacionalismo
BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA
É só começar algum megaevento esportivo, como a Copa do Mundo ou as Olimpíadas,
que o nacionalismo esportivo
aflora com uma facilidade incrível -e instantânea.
De uma hora para outra, nos
pegamos diante da TV torcendo
irracionalmente a favor dos "brasileirinhos", a maioria dos quais
completos desconhecidos até anteontem, nada, até um segundo
antes de começar a transmissão
da prova de judô, de hipismo, de
remo etc. Cada rosto, cada gesto
dos "nossos" carrega-se de significação, torna-se o embate de nós
contra eles, quaisquer que sejam
esses eles.
É, entretanto, um nacionalismo meio de araque, esse que se
ancora nas esperanças do esporte. É eterno, forte e belo enquanto
dura uma partida ou uma prova.
Oscila tanto quanto o placar de
um jogo de vôlei ou de basquete.
Funda-se nas imagens e numa
enviesada identificação que temos com as caras, os nomes, os
sotaques de "nossos" representantes nas quadras, piscinas, tatames, campos e pistas.
Não tem a ver com orgulho do
presente e a glória do passado no
sentido, por exemplo, mais militar que o nacionalismo norte-americano assume -e que, na
abertura destes Jogos Olímpicos,
foi diplomaticamente contido.
Ou com uma afirmação celebratória dos valores de um povo em
contraste com o patriotismo oficial e pesado do Estado que não o
representa, como já foi à época
da ditadura.
Não, aqui e agora, o nacionalismo é mote publicitário, um
"frissson" provocado pela exposição maciça do verde-amarelo
que toma conta do espaço televisual nesse período.
Trata-se de uma impostura,
claro, que tem no telejornalismo
esportivo um de seus principais
pilares. Parece que a missão do
telejornalismo é botar o telespectador para torcer irracional e histericamente.
Os narradores de jogos falam
aos berros, forçam o olhar do espectador aos acertos ou à suposta
superioridade dos brasileiros e
inventam expressões pouco generosas para desqualificar o adversário sem a menor preocupação de manter algum tipo de imparcialidade -e isso tanto em
jogos mais populares de fato
quanto em provas mais obscuras, como tênis de mesa.
Certo, esporte na TV é entretenimento e entretenimento supõe
uma dose de emoção previsível e
calculada, mas esse esforço em
extrair toda a vibração nacionalista do espectador a qualquer
custo parece estar um passo além
disso.
É como se o jornalismo esportivo se sentisse na obrigação de
encenar, toda vez, uma farsa bem
barulhenta e colorida para encobrir o vazio em que se transformou a idéia de país e de comunidade nacional.
Temos que desejar com intensidade febril que aqueles brasileiros que são, parafraseando o slogan oficial, o melhor do Brasil
vençam, triunfem para que o
Brasil não desapareça.
biabramo.tv@uol.com.br
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