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Crítica/show
Tom leva Caetano e Roberto a limite da voz
Apesar dos poucos ensaios e de alguns deslizes, cantores encararam com força repertório do maestro da bossa nova
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
N
ão faltaram errinhos,
uns versos esquecidos,
pequenos ruídos saídos de uma caixa de som. Mas,
como se diz no Rio, quem estava lá para regular mixaria? O
Teatro Municipal carioca lotado -mais de 2.000 pessoas-
aplaudiu várias vezes, na noite
de sexta, o encontro histórico
entre Roberto Carlos e Caetano
Veloso em torno da obra de
Tom Jobim. Na saída, "privilegiado" era uma das palavras
usadas por espectadores para
traduzir como tinham se sentido. Em São Paulo, a dupla se
apresenta amanhã e terça, no
auditório Ibirapuera, com ingressos esgotados.
Além do mais óbvio, que foram os poucos ensaios (quatro), um bom álibi para os deslizes pode ser o homenageado.
Maior autor brasileiro de canções, Tom Jobim leva qualquer
cantor a seu limite -a não ser
que se fique nos sambas simples, o que ambos não fizeram.
Ou melhor, até fizeram na
abertura, às 21h36, com "Garota de Ipanema", que a execução
maciça ao longo do tempo tornou fácil. Mesmo assim, nervosos, titubearam no início, e Roberto se esqueceu de um previsto "ba-da-ba-da" no meio.
No dueto seguinte, "Wave",
já de pé, eles se soltaram e tiveram as eventuais dificuldades
reduzidas pela opção de alternarem os versos. A cada intervalo, Roberto olhava no monitor para conferir a letra -o que
repetiu em boa parte do show,
mas que também faz quando o
repertório é seu mesmo.
No seu set de seis músicas,
Caetano só se deu uma relativa
folga na segunda, "Ela É Carioca". Em "Por Toda a Minha Vida", "Inútil Paisagem", "Meditação", "Caminho de Pedra" e
"O que Tinha de Ser", precisou
usar toda a extensão de sua voz,
não se deixar cobrir pela orquestra -tocando belos arranjos de Jaques Morelenbaum- e
ainda buscar a expressão das letras. A sofrida "O Que Tinha de
Ser" foi o momento de maior
peso de toda a noite.
Plebeu
Depois do interlúdio com a
instrumental "Surfboard", Roberto reapareceu de uma forma
um tanto plebéia: andando na
penumbra até o microfone, enquanto numa tela de filó eram
exibidas imagens de Tom. A direção de Monique Gardenberg
e Felipe Hirsch, que deu uma
moldura discreta e bonita para
o show, poderia ter garantido o
recato do Rei nesse momento.
Ele cantou a sua versão para
o espanhol de "Insensatez" e
mostrou a voz irretocável em
"Por Causa de Você". Embora
cativando nesta e na seguinte,
"Lígia", ainda soaram como
músicas trazidas pelo maestro
Eduardo Lages para o universo
conhecido de Roberto.
Com "Corcovado" e "Samba
do Avião", o cantor surpreendeu ao não evitar o DNA de
samba das músicas. "Ele começou a carreira cantando samba,
entende do assunto", comentou o parceiro Erasmo Carlos.
Para Roberto, com sua voz
límpida e ampla, cantar com
mais economia é que é o desafio. Em "Eu Sei que Vou te
Amar", até soltou a interpretação no bolero que a canção virou, mas soube ser contido e
comovido ao declamar o "Soneto da Fidelidade", de Vinicius.
Os duetos finais resumiram o
show: pequenos erros de
"quem-canta-o-quê" suplantados pela alegria dos cantores e
pela emoção do público. Depois
de "Teresa da Praia", "A Felicidade" e "Chega de Saudade",
Caetano e Roberto voltaram
para dividir "Se Todos Fossem
Iguais a Você" e, novamente,
"Chega de Saudade". Mostraram-se grandes, mas sem brigar com o homem que aparecia
enorme num painel no palco. A
noite foi da melhor música brasileira, ou seja, de Tom.
Avaliação: ótimo
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