São Paulo, quinta-feira, 26 de junho de 2008

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Minha vida de robô

Em "Wall-E", animação da Disney-Pixar que estréia amanhã, robô solitário recolhe o lixo na Terra enquanto os humanos preguiçosos vivem em uma colônia espacial

Divulgação
O robô-gari Wall-E, que, segundo o diretor Andrew Stanton, foi inspirado em um binóculo utilizado na arquibancada de um jogo de beisebol


PEDRO BUTCHER
ENVIADO ESPECIAL A LOS ANGELES

Um certo frisson ronda o lançamento de "Wall-E". Mesmo que as primeiras reações à nova animação da Pixar tenham sido positivas, não se sabe ao certo como o público vai reagir a um filme com poucos diálogos, sem qualquer rosto ou voz facilmente reconhecível, e que tem como temas duas canções do musical "Hello, Dolly!" ("Put on your Sunday Clothes" e "It Only Takes a Moment").
"Wall-E", que estréia amanhã no Brasil, com 320 cópias (dez legendadas), é a mais ousada produção da Pixar -que se impôs frente à Disney ao realizar a primeira animação 100% computadorizada em Hollywood ("Toy Story", 1995) e acabou sendo incorporada por ela. Durante uns bons 20 minutos, há apenas um personagem em cena: Wall-E, o último robô do planeta, cumpre obsessivamente a tarefa para a qual foi programado -recolher lixo.
Nos intervalos, coleciona objetos deixados pela humanidade, refugiada em uma colônia espacial. "Sei que é o cenário mais solitário que poderíamos ter imaginado, mas acreditamos profundamente nele", diz o diretor Andrew Stanton, em entrevista a um grupo de jornalistas da qual a Folha participou.
A idéia surgiu em um almoço que tomou proporções mitológicas. "Foi em 1994. "Toy Story" estava perto de ficar pronto e pensamos que talvez tivéssemos a chance de fazer outro.
Começamos a dizer as idéias que passavam pela cabeça." Daí nasceram "Vida de Inseto", "Monstros S/A", "Procurando Nemo" e "Wall-E". "Não tínhamos a história, só a vontade de fazer uma ficção científica sobre o último robô na Terra."
Tudo, diz Stanton, se desenvolveu a partir dessa vontade inicial -inclusive a mensagem ecológica e o tom político ("Wall-E" é, de longe, a história mais crítica da Pixar). "Sinto desapontá-lo, mas não tenho uma agenda política nem mensagens ecológicas.
Reciclo o lixo, mas, mesmo assim, às vezes me confundo", ri. "Não me importo que o filme apóie certas idéias, mas tudo nasceu em função da narrativa. Queria falar do último robô na Terra e precisava imaginar uma razão para os homens terem abandonado o planeta. O lixo me pareceu razoável."
Mais tarde, quando seres humanos entram em cena, são criaturas preguiçosas e gordas. "Quando estávamos escrevendo o roteiro, tivemos um consultor da Nasa. Ele nos contou que, no espaço, o homem perde densidade óssea e, com o tempo, pode se tornar uma grande bolha. Pensei: "Perfeito'! Não quero ser ofensivo, mas estamos nos aproximando disso com nossas salas de estar repletas de controles remotos.
Nas primeiras versões, levei a idéia às últimas conseqüências e desenhei os humanos como grandes bolhas gelatinosas. Mas ficou grotesco demais."

Binóculo no beisebol
O maior desafio diante do árido cenário era criar um protagonista carismático. "Sendo fanático por ficção científica, vi que, em geral, há dois tipos de robô: o ser humano com pele de metal e o tipo R2D2, uma máquina cujo design é baseado em sua função, mas que ganha personalidade. Estava interessado nessa segunda idéia."
A inspiração inicial veio de um curta de John Lasseter -fundador da Pixar- em que o protagonista é uma luminária.
"Não era para ser um personagem, mas seu próprio design já lhe imprimia um caráter. Assim como Lasseter nunca desenhou a luminária, eu não poderia desenhar Wall-E. Teria que encontrar seu design. A base já sabíamos: um quadrado para compactar o lixo. Mas e o rosto? Descobri em um jogo de beisebol. Alguém me emprestou um binóculo. Perdi o jogo, ganhei o personagem."
O segundo passo para dar vida ao robô foi um cuidadoso trabalho de som, a cargo do gênio Ben Burtt (criador das vozes de R2D2 e C3P0 em "Star Wars"). Para Stanton, grande parte do carisma de Wall-E vem do silêncio: "Por que gostamos de animais de estimação e bebês? Há um charme em criaturas que não conseguem se comunicar plenamente".


O jornalista PEDRO BUTCHER viajou a convite da Disney

NA INTERNET
www.folha.com.br/ilustradanocinema
leia a íntegra da entrevista


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