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Grupo encena tecnologia como desafio humano
Arte Ciência no Palco completa dez anos com estréia de "A Culpa É da Ciência?'
"Seria o cúmulo usar tecnologia num espetáculo que discute seus efeitos", diz o autor Oswaldo Mendes sobre a peça "artesanal"
LUCAS NEVES
DA REPORTAGEM LOCAL
À brusca queda de um recém-nascido, uma mulher reage
com placidez: "Não tem problema, a gente faz outro!". E, via
celular, passa adiante o código
genético da criança para que
outra seja fabricada.
A cena ilustra a reflexão que
o Núcleo Arte Ciência no Palco
deseja estimular com "A Culpa
É da Ciência?", espetáculo com
que o grupo comemora dez
anos de atividade.
"Queremos tratar da relação
do ser humano com a tecnologia e do quanto ela altera nossas
relações interpessoais. Como
dizemos no fim, a ciência é capaz de salvar vidas ou matar,
mas a decisão cabe ao homem",
afirma Oswaldo Mendes, que
assina, ao lado de Alessandro
Greco, a dramaturgia final do
12º trabalho da companhia.
"Culpa" marca uma mudança de rota para o Arte Ciência:
até então, as trajetórias, teorias
e descobertas de nomes como
Albert Einstein (1879-1955),
Antoine Lavoisier (1743-94) e
Niels Bohr (1885-1962) haviam
servido de matéria-prima à trupe. Mendes viu na efeméride
uma boa desculpa para "lançar
o nosso olhar sobre a ciência,
dar um salto sem rede".
Mas tudo "artesanal, analógico", diz ele. "Seria o cúmulo
usar tecnologia num espetáculo que discute seus efeitos."
Comédia dramática
Em cena, o registro oscila entre o grave e o cômico. Na primeira categoria, entram os segmentos sobre o uso de células-tronco embrionárias em pesquisas e a falta de vacinas durante mutirões de imunização.
Mais leves são os blocos sobre
os atritos de clientes bancários
com a alta tecnologia das agências (a máquina que engole o
cartão, a porta giratória) e o sexo virtual.
Durante a preparação, iniciada em agosto do ano passado, o
grupo teve palestras com físicos, matemáticos e biólogos,
além de conhecer o Instituto do
Sono e o reator nuclear da USP.
Com o material recolhido
nesse primeiro momento, os
integrantes do grupo começaram a improvisar: de cada tema, sugiram entre quatro e seis
variações. Após a triagem das
melhores cenas, Greco e Mendes se encarregaram da amarração final.
A imersão dos atores no universo das exatas foi em prol do
que o alemão Bertolt Brecht
(1898-1956) chamou de teatro
da era científica, segundo explica Mendes: "O ator não pode
pensar o mundo por suas intuições, precisa ter alguma bagagem, algum conhecimento do
que está falando".
Ele em seguida amplia o conceito brechtiano: "O teatro que
não levar em conta que este
mundo está mudando vai seguir discutindo briga de casais.
E, com todo respeito, hoje televisão e cinema tratam isso melhor do que o teatro tratou ou
poderia tratar. O teatro tem de
ir mais fundo, verticalizar."
Ainda assim, não corre o risco de, mais adiante, ser também ele "engolido" pela tecnologia? Mendes acha que não. "O teatro vai sobreviver a tudo. É
da essência humana essa necessidade do afeto, do olho no
olho, da palavra que se troca
com amigos. O teatro é a possibilidade do encontro."
A CULPA É DA CIÊNCIA?
Quando: estréia hoje; sex. e sáb., às
21h; dom., às 19h; até 27/7
Onde: auditório PUC Consolação (r.
Marquês de Paranaguá, 111, São Paulo, tel. 0/xx/11 3081-8865); classificação 14 anos
Quanto: de R$ 5 a R$ 10
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