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Outra opinião
Apesar do temperamento difícil, desafetos só ganharam força com a posse de Serra
IRINEU FRANCO PERPETUO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
A idéia por trás da transformação da Osesp em
fundação, em 2005, era
que a orquestra pudesse ser gerida profissionalmente, sem ingerências políticas.
Soa, assim, como ironia das
mais amargas que John Neschling esteja saindo do comando
da orquestra justamente por
conta das interferências da política na vida musical.
Não custa lembrar que Neschling chegou à Osesp, em 1996,
no meio do mandato de um governador (o tucano Mario Covas, morto em 2001) que, até
então, não se havia notabilizado por grandes ações na área da
música. Pelo contrário: a orquestra que o maestro herdava
de Eleazar de Carvalho estava
relegada à acústica deficiente
do Memorial da América Latina, enquanto o Coral Sinfônico
(atual Coro da Osesp) temia
por sua extinção.
Nem o mais ferrenho dos adversários (e não faltam candidatos a esse cargo) do maestro
há de negar que existe um antes
e um depois de Neschling na
história da música erudita brasileira. A Osesp se tornou o
principal paradigma de qualidade nesta área no país, sendo
desde então imitada por todas
as orquestras desejosas de elevar seu nível artístico.
Polêmicas
E foi o vigoroso respaldo político de sucessivos governos
que garantiu ao regente a volumosa soma de recursos que viabilizou o aumento das remunerações dos músicos (e do próprio Neschling), a série de concertos com artistas internacionais, as encomendas de obras a autores contemporâneos, as
turnês internacionais, os discos
e os projetos educacionais que
fizeram o sucesso da Osesp.
Era esse respaldo, ainda, que
fazia Neschling parecer imune
a todo tipo de polêmica, desde
os questionamentos sobre o salário de R$ 100 mil mensais até
as queixas de tratamento rude
aos músicos nos ensaios.
Veio o lamentável episódio
da demissão, em 2001, de alguns dos melhores integrantes
da orquestra, e o maestro continuou forte. Ocorreu o imbróglio do Concurso Internacional de Piano Villa-Lobos, em
2006, e sua posição seguiu inabalável.
Isso para não falar da maneira escolhida para defenestrar
Roberto Minczuk da orquestra.
O atual diretor musical da OSB
(Orquestra Sinfônica Brasileira) era originalmente trompista e consolidou sua carreira como regente ao auxiliar Neschling no processo de renovação
da orquestra.
Mas não foi necessário mais
do que um artigo de jornal dizendo que os músicos da orquestra preferiam Minczuk a
Neschling, em 2005, para que o
diretor artístico da Osesp se livrasse daquele que parecia ser
seu sucessor natural.
De qualquer forma, os problemas do maestro só começaram com a posse de José Serra
no Palácio dos Bandeirantes,
no início de 2007. Daí, ganharam força política os desafetos
que o regente foi criando ao
longo dos anos de Osesp, graças
a seu temperamento reconhecidamente difícil.
Veio a fritura, e Neschling
sentiu o golpe. Em artigo publicado em "Tendências/Debates" desta Folha, em 6 de abril,
o maestro ergueu uma bandeira branca, propondo o "desarmamento de espíritos". Foi em
vão. Resta ver se a Osesp dependia do voluntarismo de
Neschling para seguir adiante,
ou se o projeto está suficientemente consolidado para caminhar sem seu criador.
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