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TELEVISÃO
Apresentador diz querer atingir todos os públicos e atribui ao pagode o aumento da presença do negro na mídia
Para Netinho, Ibope teme as classes C e D
FREE-LANCE PARA A FOLHA
O cantor e apresentador Netinho, 33, recebe a reportagem no
escritório da rede de cabeleireiros
especializados em cabelos crespos
que mantém -são cinco hoje, serão quase 50 no ano que vem, segundo ele planeja. Ao vivo, é mais
magro e mais baixo do que na TV.
Parece desconfiado, mas aos poucos vai revelando sua estratégia.
Quer atingir todos os públicos
com seus programas de televisão,
não apenas os negros, porque os
telespectadores estariam clamando por mais miscigenação na tela.
""Turma do Gueto", por exemplo,
era um grande anseio da comunidade branca, por isso fez sucesso.
Os brancos estão cheios de ver só
brancos na televisão."
Netinho não dá muitas pistas
sobre o seriado que prepara com
roteiristas americanos no Rio
(leia texto abaixo). Fala apenas
que é inspirado em sua própria vida e que admira como modelo "A
Grande Família", a melhor série,
em sua opinião, atualmente no ar
-uma idéia de 30 anos atrás.
Aplaude o fato de a Globo escalar
uma protagonista negra, a bela
Thaís Araújo, para a próxima novela das sete, "Da Cor do Pecado".
Mas afirma que "Cidade dos
Homens" não teria tido espaço na
emissora carioca se "Turma do
Gueto" não tivesse surgido antes e
mostrado que há público para um
programa com negros da periferia. Uma audiência que especula
ser maior do que se imagina: os
índices do Ibope, embora venham se mostrando generosos,
são vistos com desconfiança.
"Uma vez um diretor do Ibope
me disse que não existe medição
de audiência na periferia porque
eles têm medo de colocar os aparelhos lá. Por isso acho que é no
mínimo classe B a audiência do
meu programa. As classes C e D
não são pesquisadas", acusa. Procurado pela Folha, o Ibope não se
manifestou a respeito.
Falar em armas em excesso na
"Turma do Gueto", razão de sua
saída, parece contraditório para
um fã, mesmo pagodeiro, do rap
agressivo feito em São Paulo, personificado nos Racionais MCs e
em seu líder Mano Brown, amigo
de Netinho. O apresentador de
quadros doces na televisão diz,
porém, carregar a mesma revolta
que move os rappers, com tática
distinta. "Quero encontrar adeptos pela minha ideologia. A violência não ajuda a comunidade."
Também acha que os próprios
rappers estão encontrando outro
caminho, evitando os "exageros"
que atingiram as letras das canções. "Ninguém pretende glamurizar a violência. O próprio Brown
fala que não quer "viver no país
das calças bege" [a prisão]. Foi
uma radicalização que o samba
também cometeu, ao falar só de
amor, mas isso está mudando."
Atribui às circunstâncias sua
opção pelo pagode romântico
com o grupo Negritude Júnior, no
início da carreira, como o que era
"permitido" no nível cultural que
tinham. Mas não desdenha. Diz
que foi o pagode, tão criticado,
que tornou possível a expansão
que vê da presença do negro na
mídia atualmente. "Foi o pagode
que tornou possível o Netinho na
TV, o Alexandre Pires (ex-Só Pra
Contrariar) na Casa Branca."
O que ele achou disso? Foi bajulação do império americano? "O
presidente dos EUA manda no
mundo e, se um neguinho cantando pagode chegou até ele, deve
ser respeitado. Chegar ali não é fácil, criticar é que é."
A pregação de Netinho vai por
caminhos que fazem lembrar os
da política. E ele fala que pensa em
se candidatar algum dia, depois
que der sua "contribuição" para a
causa da periferia na TV. O partido seria o seu mesmo, o fictício
Partido das Pessoas da Periferia.
O apresentador, incorporando
a frase clássica de Martin Luther
King Jr. (1929-68), diz: "Eu tenho
um sonho...". É "melhorar a auto-estima das crianças negras."
(CYNARA MENEZES)
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