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Crítica artes visuais
Mostra de Cao Guimarães atesta sua originalidade
FABIO CYPRIANO CRÍTICO DA FOLHAOrganizar a retrospectiva de um artista que se dedica ao vídeo e ao filme --portanto, obras que pedem um ambiente escurecido--, não é uma tarefa das mais fáceis.
Especialmente quando se trata de um espaço como o do Itaú Cultural, que mais se assemelha a uma agência bancária do que a um centro cultural de fato.
"Ver É Uma Fábula", com 21 trabalhos de Cao Guimarães, enfrenta esse desafio de forma original. Com curadoria de Moacir dos Anjos e projeto expográfico de Marta Bogéa, a mostra ocupa até locais de passagem, como as escadas da instituição, além de duas salas tradicionalmente usadas para abrigar exposições.
Em se tratando de Guimarães, faz todo sentido o uso de espaços inusitados; afinal, sua obra consiste justamente em olhar para situações banais e delas conseguir extrair conteúdos poéticos. Assim, o próprio dispositivo expositivo incorpora as principais estratégias do artista.
Um bom exemplo é projetar a série "Gambiarras" (2001-2012) no final de uma escada que desemboca no terceiro andar.
O trabalho retrata improvisações típicas na cultura brasileira, como usar um arame no lugar das hastes quebradas de um par de óculos. Pois ver um filme na escada é exatamente improvisar no espaço, dando a ele nova função, e tornando a própria exposição uma gambiarra.
Claro, o trabalho enciclopédico do artista, que reúne dezenas de situações espertas frente a pequenos problemas, ajuda a imantar a escada, fazendo com que os visitantes do centro cultural fiquem como que cômodos nessa nova ordem.
Mesmo as salas tradicionais usam estratégias inovadoras. Em ambas, encontram-se três grandes telas penduradas, dispostas em formato triangular.
Nelas, os filmes do artista mineiro são exibidos de maneira alternada, gerando uma movimentação delicada do olhar, uma espécie de coreografia, como a da bolha de sabão que se desloca no filme "O Inquilino" (2010), um de seus trabalhos exibidos nessa seção.
Assim, conteúdo é também forma em "Ver É Uma Fábula". Cao Guimarães, afinal, é um dos artistas brasileiros que melhor conseguem explorar as potencialidades da construção da imagem.
A afirmação de que a arte pode dar novos conteúdos a objetos cotidianos já se tornou um clichê desgastado, que nem sempre serve a tudo que se pretende aplicar na cena contemporânea.
Não é o caso do artista mineiro. Os filmes selecionados para a mostra atestam sua originalidade. E, melhor, os organizadores compreendem tanto a obra de Cao Guimarães que criaram uma forma adequada de expô-la ao público.