Após best-seller, David Nicholls esmiúça a crise de uma família em 'Nós'
Lá pelas tantas, o britânico David Nicholls escreve em "Nós" que aquela é uma história de amor. Mas logo faz um adendo: "Certamente o amor faz parte dela".
Como em seu best-seller "Um Dia" (2009), Nicholls debruça-se no volume lançado no Brasil em maio sobre relacionamentos complicados.
No livro anterior, tratava dos desencontros amorosos de um casal. Neste, esmiúça o fim de um casamento.
"'Romeu e Julieta' é uma boa peça, mas não sei se acredito nela", diz o autor por e-mail. "Devoção sem conversa? Sem uma troca? E se Romeu for um idiota e Julieta só falar sobre si mesma?"
Não é que um grande beijo na chuva não o emocione. O que o fascina como tema, porém, são as ansiedade e as frustrações que acompanham o processo de se apaixonar.
De certa forma, "Nós" –que esteve na lista para o prêmio Man Booker– pode ser considerado uma continuação de "Um Dia". "Se a outra história tinha um 'será que eles vão ficar juntos?', esta tem um 'será que eles vão continuar juntos'?"
Embora seus textos sejam fundamentalmente sobre o amor, Nicholls diz esperar que eles não sejam reduzidos a isso. "Nós", por exemplo, fala de arte, ciência, e, sobretudo, da relação entre pais e filhos.
Na trama, o narrador Douglas e sua mulher, Connie, planejam uma viagem pela Europa com o filho, que logo se mudará para cursar uma faculdade. Antes da partida, Connie diz que o casamento já deu o que tinha que dar.
Se a relação de Douglas e Connie não é das melhores, a dele com o filho não fica atrás. Todas as tentativas de se aproximar do adolescente são recebidas com desprezo.
"Se essa história tem algum elemento autobiográfico, vem do meu pai", conta Nicholls. "Tivemos um relacionamento terrível e tenho arrependimentos em relação a isso." O pai morreu enquanto Nicholls escrevia o romance, dedicado a ele. "Acho que minha tristeza está nas páginas."
ADAPTAÇÃO
"Um Dia" não demorou para virar um filme protagonizado por Anne Hathaway e detonado pela crítica. A experiência não se repetirá, afirma. "Espremer um livro longo em cem minutos é frustrante para o roteirista e o espectador", diz.
"Se 'Nós' tiver uma versão para as telas, e espero que tenha, será na televisão. Queremos fazer uma versão de três ou quatro horas para a BBC em 2016."
O autor vem ao Brasil para a Bienal do Rio, realizada entre 3 e 13 de setembro. Afirma estar "animado" e se preparando para conhecer um pouco da literatura brasileira.
"Na faculdade éramos obcecados pelo trabalho do Augusto Boal", conta. "Em ficção brasileira sou ignorante. Estou determinado a resolver isso começando, acho, com Clarice Lispector."